terça-feira, 08 de junho de 2003

Jornal do Brasil

Reformas entram em fase decisiva
Governo começa negociações para cortes nas propostas de emenda e espera que a pressão diminua
Doca de Oliveira e Paulo de Tarso Lyra

      BRASÍLIA - As reformas do governo Lula entram na fase decisiva de sua tramitação esta semana. Líder do governo na Câmara, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB) abre hoje as negociações com os partidos alinhados ao Palácio do Planalto, não apenas para reduzir o volume de emendas às propostas, mas, principalmente, para construir a unidade da bancada governista. A idéia é aprovar as reformas nas comissões especiais sem susto e garantir uma ratificação emblemática das propostas no primeiro turno de votações pelo plenário da Casa.

      Operadores políticos do presidente Lula esperam por um recrudescimento da pressão contrária, sobretudo no caso da reforma da Previdência, ponto mais polêmico da agenda no Congresso. Para contorná-la, a tática é investir nas negociações não apenas com as bancadas dos partidos, mas também com os setores mais resistentes às propostas, para construir o consenso possível.

      - Nós vamos negociar até o último minuto tudo o que for possível - afirma o vice-líder do governo, deputado Professor Luisinho (PT-SP).

      Líderes governistas minimizam os agora constantes sinais de descontentamento nas bancadas. Após seis meses apoiando o governo, muitos deputados reclamam do tratamento oferecido pelo Planalto. Seja a demora nas nomeações para a administração federal, seja as dificuldades de acesso aos ministros do presidente Lula. Articuladores políticos na Câmara se declaram convencidos de que esse sentimento não comprometerá o calendário de votações.

      Presidente da comissão especial da reforma da Previdência, Roberto Brant (PFL-MG) aposta que o parecer final do relator, deputado José Pimentel (PT-CE), seja apresentado na semana que vem e possa ser votado até o final deste mês.

      - Eu não ajudarei em nada, mas também não pretendo atrapalhar ninguém - avisa.

      Junto de seus colegas, Aldo Rebelo fará uma triagem das centenas de emendas às duas reformas. Vai organizar os assuntos que exigem negociação para reduzir ao máximo o volume de sugestões conjuntas que serão levadas ao ministro da Previdência, Ricardo Berzoini (PT), e ao da Fazenda, Antônio Palocci (PT).

      O governo Lula está convencido da necessidade de promover alguns ajustes. No caso da Previdência, é fato consumado a adoção de um modelo de transição para as novas regras e algumas alterações ganham força: os professores do ensino fundamental poderão se aposentar aos 50 anos (mulher) e 55 anos (homem), cinco a menos que os demais servidores ; o redutor de até 30% das pensões só se daria acima de um piso de R$ 2,4 mil.

      Relator da reforma da previdência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Maurício Rands (PT-PE) não se assusta com o elevado número de emendas ao texto do governo. Ele lembrou que a bancada do PT resumiu 160 em apenas nove. E não acredita que isso seja um sinal de descontentamento dos aliados.

      - Apresentar emendas não significa estar contra o governo. Expressa o desejo de melhorar o texto apresentado - disse o relator.

Paralisação dos servidores tem baixa adesão
Paulo de Tarso Lyra

      BRASÍLIA - Menos da metade dos servidores públicos federais entra em greve hoje contra a reforma da Previdência. O governo ainda tentou evitar a paralisação, mas não houve acordo no encontro dos sindicalistas com o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, no final da tarde de ontem.
Apesar do comando de greve ser composto por onze entidades, a expectativa da própria coordenação é de que apenas 40% da categoria, que tem um milhão de servidores, cruze os braços na primeira greve do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

      - Não é o ideal, mas foi o número que conseguimos neste momento - reconhece o diretor da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal, Pedro Armengol.

      A falta de mobilização tem três razões: a primeira é a própria perplexidade de uma paralisação em um governo do PT. De acordo com Armengol, muitos servidores se sentem incomodados por fazer greve contra um presidente no qual votaram. Outro problema é que muitos sindicalistas estão receosos de fazer uma paralisação por serem filiados ao PT.

       - Eu sempre acreditei que sindicato deve defender a categoria, e não um partido político. Mas muitos não entendem assim - reconhece um delegado sindical ligado ao Judiciário.

      Outro grande problema é que a Central Única dos Trabalhadores (CUT), apesar de se declarar solidária ao movimento, não convocou sua base para a paralisação. O presidente da CUT, Luiz Marinho, bateu de frente com os grevistas no dia em que a greve foi insinuada, após a audiência dos servidores no Palácio do Planalto. Para dirigentes da entidade, o movimento está sendo orquestrado por uma minoria.

      - A CUT não está chamando para a greve. Nós entendemos que os sindicatos filiados a ela têm autonomia, mas nós estamos buscando um processo de negociação para alterar pontos da reforma - declarou Marinho.

      Esse é o principal racha do funcionalismo público. Os servidores que vão entrar em greve defendem a retirada da emenda que tramita no Congresso.

      Eles admitem que o ministro Ricardo Berzoini propôs a negociação em torno da paridade, integralidade, taxação dos inativos, fundos de pensão e teto para aposentadoria.

      - Mas não disse os limites dessa negociação. Nós queremos discutir a proposta como um todo. Por isso, a greve está mantida - garantiu João Torquato, da Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores na Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social.

      Outro ponto que conta a favor do governo é o recesso de julho, tanto do Judiciário quanto das universidades federais, que, mesmo assim, prometem paralisar 32 das 52 instituições em todo país.

Lula e Corrêa discutem Previdência
Luiz Orlando Carneiro

      BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu ontem à noite, por 35 minutos, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Maurício Corrêa. Foi o primeiro encontro entre os dois, desde a posse de Corrêa em junho, quando o ministro criticou a proposta de reforma da Previdência do governo.
Ontem, o presidente do STF se limitou a considerar ''proveitosa e útil a conversa, no que diz respeito às reformas, na parte relacionada ao Judiciário''.

      Aberta apenas para o registro das imagens do encontro, a conversa foi acompanhada somente pelo ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o deputado federal e advogado Sigmaringa Seixas (PT-DF).

      A Assessoria de Comunicação do STF expediu nota informando que o contato entre Corrêa e Lula foi provocado por um ''convite da Presidência da República''.

      Ao tomar posse na presidência do Supremo Tribunal Federal, em 5 de junho, na presença de Lula, Maurício Corrêa surpreendeu a todos, ao afirmar que seria ''omisso'' se não expressasse sua ''preocupação a propósito das profundas modificações que se pretende introduzir no regime remuneratório e previdenciário da magistratura''. E convocou uma reunião da cúpula do Judiciário para o dia 17, no encerramento do qual disse haver espaço para um ''diálogo leal e sincero'' com o Executivo, a fim de ''compatibilizar os interesses da magistratura - carreira de Estado - com as possibilidades reais da economia e as necessidades do país''.

      Lula parecia evitar um diálogo direto com o presidente do STF. Pelo menos foi a interpretação dos integrantes do Supremo diante de sua ausência na posse, dia 25, dos primeiros três ministros que nomeou para o tribunal.

      Os magistrados pretendem um tratamento diferenciado para o Judiciário, pelo menos, no que se refere à aposentadoria integral e à paridade dos vencimentos e dos proventos dos inativos.