Sexta-feira, 14 de novembro de 2003

Jornal do Brasil

Governo e oposição fecham acordo para apressar reformas

Líderes garantem votação de mudanças na Previdência até meados de dezembro


Doca de Oliveira

BRASÍLIA - Acuados por um calendário curtíssimo, operadores políticos do Planalto fizeram ontem um novo aceno aos partidos de oposição para garantir a aprovação das reformas constitucionais ainda este ano. Reunião promovida no gabinete do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) selou a distensão política no Senado e tornou possível um acordo de procedimento para a aprovação da reforma da Previdência até meados de dezembro.
O entendimento celebrado ontem, entretanto, não esvaziou as divergências quanto ao teor da emenda. Liderado pelo PFL, o bloco de oposição continua cobrando do governo a mudança de diversos aspectos. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), prometeu um último esforço de negociação, mas ficou clara a curta margem de avanço na discussão. O político petista vai se pronunciar até terça-feira, véspera da votação da emenda na Comissão de Constituição e Justiça, preliminar da votação em primeiro turno pelo plenário do Senado.

- Temos divergências de mérito que estão mantidas - admitiu Mercadante.

O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), reconhece as dificuldades e antevê uma disputa voto a voto em plenário. Líder do PFL, José Agripino Maia (RN) está convencido de que o governo atenderá alguns dos pleitos da oposição, pois não tem segurança nos votos de sua própria base de sustentação:

- Quanto mais o tempo passar, mais eles cederão.

Mapeamento de votos conduzido pela senadora Roseana Sarney (PFL-MA) indica que o governo dispõe dos 49 votos exigidos para aprovar a emenda. Ontem, o PSDB liberou sua bancada para votar a favor. Pressionados pelos governadores, três senadores devem fechar com o Planalto. Mesmo quadro se observa entre os pefelistas, que devem colaborar com, pelo menos, três votos.

O desafio do Planalto, agora, é construir uma saída para a reforma tributária. Os líderes partidários voltam a se reunir na próxima semana para avançar nas negociações. Ontem, governistas pediram ao bloco de oposição apoio para a redução dos prazos de tramitação da reforma tributária, cuja discussão sequer foi aberta.

O atraso na votação está se transformando em um pesadelo para o governo, que depende de algumas medidas para garantir o equilíbrio das contas públicas em 2004. Cresce a possibilidade do fatiamento da reforma, com a aprovação das medidas fiscais até dezembro - a prorrogação da CPMF e da desvinculação das receitas da União, a criação dos fundos de compensação às exportações e do desenvolvimento regional - e o adiamento da discussão dos pontos mais polêmicos para o ano que vem. O segundo passo tratará da unificação do ICMS e do fim da guerra fiscal.

 

Contra a 'fúria arrecadatória'

No Supremo, PFL quer anular aumento da Cofins


Paulo de Tarso Lyra

BRASÍLIA - O presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), afirmou que o partido vai protocolar na próxima semana uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal contra a MP da Cofins. Segue, assim, o caminho adotado pelo PSDB, que agiu desta maneira nesta semana. Bornhausen garantiu que seu partido vai conter a “fúria arrecadatória” e o confisco praticado pelo governo. E que vai manter audiências com representantes empresariais, mesmo que a Comissão para discutir as alterações na legislação da Cofins não seja instalada.
O presidente da Associação Médica Brasileira, Eleusis Vieira de Paiva, traçou ontem aos parlamentares do PFL um futuro sombrio para o setor hospitalar após o aumento da alíquota da Cofins. De acordo com ele, o fim da cumulatividade e o aumento da alíquota de 3% para 7,6% vão aumentar a inadimplência e inviabilizar o sistema de saúde brasileiro.

– A nova alíquota provoca um aumento de carga tributária de 34%. Se repassarmos os preços, vai estimular a inadimplência. Se ela for de 2%, estamos no limite operacional. Como a previsão é de 25%, está inviabilizado o parque hospitalar brasileiro sentenciou.

Eleusis disse que os hospitais não podem repassar os custos para os serviços públicos, pois o governo estabeleceu um teto de gastos para Sistema Único de Saúde (SUS). Prevê, contudo, que as operadoras de planos de saúde poderão transferir o aumento da carga tributária para os consumidores.

– O governo tem que tomar uma atitude para impedir que, mais uma vez, o consumidor pague a conta – cobrou ele.

Não foram só os médicos que, com planilhas embaixo do braço, foram reclamar com o PFL. O presidente da Associação Comercial de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, também está preocupado com o setor de serviços, principal penalizado com o aumento na alíquota da Cofins. Previu um repasse de 15% a 20% nas mensalidades escolares. Pelos cálculos da ACSP, 48 milhões trabalhadores do setor de serviços - 83% do total da mão de obra nacional – sofrerão com as mudanças na Cofins.

– Essa MP vai trazer um forte prejuízo para o emprego. É uma ação incoerente com o discurso social e de geração de empregos feitos pelo governo Lula – acusou Afif.

Líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP) admitiu que o setor hospitalar possa ser prejudicado. Mas lembrou que, durante as negociações para o fim da cumulatividade do PIS, setores como telecomunicações e energia, tiveram tratamento diferenciado. Segundo ele, nada impede que isso aconteça com o setor de saúde para se buscar um equilíbrio.

– Mas na essência a alteração é positiva, pois beneficia o setor de exportações e a geração de empregos – defendeu.

Mais atritos entre Câmara e Senado

BRASÍLIA - A polêmica sobre a instalação de uma comissão mista para discutir as mudanças na legislação da Cofins provocou ontem novos atritos entre o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP) e o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). A Comissão não foi criada por falta de articulação entre a Câmara e o Senado. Na quarta-feira, Mercadante acusou a Câmara de obstruir a instalação de comissões mistas com o objetivo de ganhar total liberdade para administrar e negociar as medidas provisória.
Ontem, após a ameaça de parlamentares do PFL de realizar audiência informais para discutir o assunto, mesmo que o governo não instale a Comissão, o discurso de Mercadante foi mais ameno.

- Não tem problema fazermos audiências. Mas acho que o Senado não deve se precipitar. A matéria ainda está na Câmara e só vamos saber como ela vai ficar após as mudanças feitas pelos deputados - frisou.

Em tom irônico, o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP) desdenhou a polêmica. Lembrou que a instalação de comissões mistas para discutir medidas provisórias é uma prática que nunca foi adotada no Congresso. Mas garantiu que, se o líder do governo (sem citar o nome de Mercadante) quiser instalar uma comissão mista, não vê nenhum problema.

João Paulo aproveitou para, de forma indireta, fazer uma menção às dificuldades enfrentadas no Senado para aprovação das matérias de interesse do governo, em especial as reformas tributária e previdenciária.

- A Câmara está em paz. Aqui não tem problema, está tudo tranqüilo. Votamos as duas reformas, o Estatuto do Desarmamento e o Estatuto do Idoso. Cumprimos nosso papel - disse o petista. (P.T.L.)