Terça-feira, 18 de novembro de 2003

TRIBUNA DA IMPRENSA

Atraso da reforma da Previdência se refletirá nas contas da União

BRASÍLIA - O atraso na votação da reforma da Previdência no Senado terá reflexos diretos sobre as contas da União de 2004. Das medidas previstas (MPs) na proposta, duas - a cobrança de contribuição previdenciária dos servidores aposentados e o aumento de R$ 1.800 para R$ 2.400 do teto dos contribuintes do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) - só entrarão, provavelmente, em vigor entre março e abril. Por mês de atraso, o governo deixa de arrecadar R$ 270 milhões.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) inicia hoje a segunda etapa de votação da reforma previdenciária, com a análise de 336 emendas apresentadas pelos senadores. A previsão é que a reforma seja votada, em primeiro turno, no dia 25.

Contra
Em reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, hoje, a cúpula do PMDB informará que quatro dos 22 senadores do partido deverão votar contra a reforma.

A proposta de Orçamento Geral da União para 2004 prevê uma receita de R$ 1,4 bilhão com a criação de contribuição previdenciária dos servidores inativos. Mas a taxação só poderá começar a ser feita três meses depois de aprovada a reforma - é a chamada "noventena".

A expectativa do Palácio do Planalto é aprovar a reforma até meados de dezembro - a taxação só começaria em abril. Já o aumento do teto de aposentadoria para os trabalhadores da iniciativa privada dos atuais R$ 1.800 para R$ 2.400 trará uma arrecadação adicional de R$ 1,8 bilhão em 2004.

No entanto, as novas as alíquotas de contribuição que incidirão sobre os salários dos trabalhadores precisarão ser definidas em lei complementar, que não será votada este ano. Caso não haja convocação extraordinária, o projeto só começará a ser apreciado depois de 15 de fevereiro, quando acaba o recesso do Congresso.

Segundo o Ministério da Previdência Social, o projeto de lei complementar servirá para definir as alíquotas de contribuição para quem ganha menos de R$ 2.400. A cobrança sobre o novo teto seria automática, o que evitaria uma perda grande de arrecadação. Atualmente, as alíquotas de contribuição para o INSS variam de 8% a 11%, conforme o valor do salário.

Por temas
O líder do PT e relator da reforma da Previdência, Tião Viana (AC), dividirá por temas as 336 emendas que começam a ser votadas hoje na CCJ. "Desde a semana passada, estou tentando liderar um acordo, para que a votação da Previdência se faça de maneira pacífica. É claro que o governo terá de ceder em alguns pontos para que a oposição colabore com a votação", disse o presidente da CCJ, senador Edison Lobão (PFL-MA).

Presidente entra na articulação para apressar votação de reformas

BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou nas articulações para apressar a votação da reforma tributária e garantir a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e a Desvinculação das Receitas da União (DRU), que tem de ser aprovada ainda este ano para vigorar em 2004.

Depois de se reunir ontem com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, o chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), o presidente marcou para 9 horas de hoje uma conversa com o presidente do Congresso, senador José Sarney (PMDB-AP), o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), e o relator da reforma tributária na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR).

Para fechar o apoio do PMDB e ganhar votos dos partidos de oposição, o governo investe na proposta alternativa apresentada pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que adia a polêmica em torno da unificação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do fim da guerra fiscal, prevendo uma reforma em três etapas.

"A emenda Tasso está ganhando corpo e força no Congresso e deve sair em etapas. Uma proposta da magnitude da reforma tributária não se pode impor nem mesmo por maioria de votos e este também não é o desejo do governo. Não desejamos - e o presidente Lula também não quer - que esta seja uma reforma imposta", disse Sarney, ontem à tarde.

Pressionado por governadores de estados mais pobres, que querem dinheiro vivo no Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) para compensá-los pela perda do ICMS como instrumento de atração de investimentos, o governo prefere evitar o confronto na votação e investir no consenso.

Por isto mesmo, a unificação das alíquotas do ICMS será adiada. Segundo Sarney, a primeira etapa se restringirá apenas aos "temas imperativos da governabilidade", como a CPMF e a DRU, além do fundo para compensar os prejuízos dos estados exportadores com a desoneração das exportações. "Se a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) está sendo feita em etapas, porque não a reforma tributária", questionou Sarney.

"Vamos avançar a partir da proposta do Tasso e definir com mais profundidade o que fazer em cada etapa", adiantou Calheiros, sobre a reunião com o Lula. Segundo o líder, a reforma ministerial está fora da agenda até porque ele tratara de pedir a Dirceu que avisasse a Lula, ainda na quinta-feira, que o PMDB só quer falar de reforma ministerial depois de aprovadas as reformas tributária e previdenciária.

"Preferimos entrar no governo numa reforma mais ampla que enxugue a equipe e dentro de um pacto estratégico de poder. Não adianta nada indicar dois ministros e ser coadjuvante no processo. Temos de entrar no núcleo do poder", disse Calheiros.

No encontro de ontem com Dirceu e Mercadante, Palocci falou da preocupação com o gasto público e queixou-se mais uma vez da "pressão dramática" dos políticos e dos governadores pela liberação de recursos. De fato, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), passou pelo gabinete do líder do governo no Senado à tarde para repetir que o Norte e o Nordeste não abrem mão dos recursos do FDR e que não concordam com o início dos repasses apenas em 2005, como prevêem o relatório de Jucá e o substitutivo de Jereissati.

"Queremos R$ 600 milhões a partir do ano que vem, como anunciou o governador (da Paraíba) Cássio Cunha Lima (PSDB)", insistiu Dias.

Para acalmar os governadores, Sarney e Calheiros informam que o FDR terá de, ao menos, ser mencionado nesta primeira etapa, ainda que só possa ser melhor detalhado mais adiante. "Não há como se criar o fundo, sem que se concretize a reforma do ICMS, mas podemos aprová-lo como princípio constitucional, vinculado à vigência da redução das alíquotas e da unificação da legislação do ICMS ", diz Calheiros.

Segundo Sarney, esta primeira fase da reforma, concretizada a partir do consenso, poderá ser promulgada de uma única vez, sem a necessidade de fatiar a promulgação de cada item separadamente, como a CPMF e a DRU. A segunda fase da reforma trataria da unificação do ICMS, podendo chegar até o imposto sobre valor agregado (IVA) na etapa final. "Esta é uma linha viável, para que cheguemos a uma boa solução", defende o presidente do Senado.

Rigotto inicia movimento para impedir "fatiamento da reforma"

O governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto (PMDB), iniciou ontem, em São Paulo, um movimento para tentar barrar o "fatiamento da reforma tributária". "Preocupa-me muito o fatiamento que está sendo proposto, pois o governo federal está preocupado em votar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e a Desvinculação das Receitas da União (DRU) e, portanto, pode estar aceitando essa pressão conservadora", reiterou.

Rigotto deu uma palestra na Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Sem citar nomes, ele disse que há governadores que não desejam a uniformização das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e que alguns setores empresariais também estão nessa mesma direção.

"Isso é muito preocupante, pois, se não houver a unificação do ICMS, o sistema tributário continuará irracional e a carga tributária irá aumentar", considerou.

Segundo o governador do Rio Grande do Sul, inicialmente todos os 27 governadores estavam unidos em torno da proposta de unificação do ICMS. Porém, Rigotto informou que alguns colegas mudaram de idéia. "Por isso, estou muito preocupado com essa questão", afirmou.

Cofins
Ele criticou também a medida provisória (MP) que aumenta a alíquota do Cofins para 7,6%. De acordo com Rigotto, a retirada da cumulatividade é muito positiva, mas a área econômica do governo não precisa "turbinar" a percentagem. Rigotto afirmou que o PMDB batalhará no Congresso para tentar estabelecer taxas diferenciadas com o objetivo de não penalizar alguns segmentos, como o de serviços.

O governador falou também a respeito da reforma ministerial que porá o partido no primeiro escalão da administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Rigotto disse que é contra a ida da legenda para o Poder Executivo federal, mas que é uma voz isolada e acatará o que a cúpula da sigla decidir. "Continuo defendendo que o PMDB dê sustentação ao governo Lula, mas sem integrar nenhum ministério", sustentou.