segunda-feira, 07 de julho de 2003

Folha de S.Paulo

STJ manda arquivar ação contra desembargador afastado do TRF
STF suspende interrogatório em caso semelhante
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

      O STJ (Superior Tribunal de Justiça) determinou o arquivamento de uma ação penal contra o desembargador Paulo Theotonio Costa, acusado de apresentar declaração falsa à Receita Federal para omitir receita sujeita ao imposto de renda.
      Em caso semelhante, o desembargador Roberto Haddad, afastado do TRF-3 em abril último, obteve liminar no STF (Supremo Tribunal Federal) para suspender interrogatório na ação penal a que responde sob acusação de ter falsificado documento entregue à Receita Federal. O interrogatório fica suspenso até o julgamento do habeas corpus impetrado pelo magistrado.
      O desembargador Costa também encontra-se afastado do TRF-3 (Tribunal Regional Federal), com sede em São Paulo. Seu afastamento ocorreu em dezembro de 2001, quando o STJ recebeu denúncia em que o juiz é acusado de manipular habeas corpus para liberar narcotraficante com prisão preventiva decretada.
      Além dessa ação penal, que continua tramitando no STJ, Theotonio Costa responde a inquérito criminal naquela corte por suspeita de enriquecimento ilícito, instaurado a partir de reportagem da Folha de julho de 1999.
      Em setembro de 2002, durante as investigações sobre a origem dos bens do magistrado, o MPF (Ministério Público Federal) ofereceu denúncia contra Theotonio Costa sob a acusação de crime contra a ordem tributária.
      Segundo o MPF, o juiz entregara à Receita Federal declaração falsa no exercício de 1998 (ano-base 1997) e apresentou declaração retificatória em outubro de 1998, ou seja, depois da publicação da reportagem da Folha. O objetivo da retificatória seria omitir a suposta sonegação.
      Notificado pela Receita Federal, Theotonio Costa pagou o débito e requereu a extinção da punibilidade. Em maio último, a Receita Federal certificou a liquidação do débito, em processo administrativo. A subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio opinou pela extinção da punibilidade, "diante do pagamento do débito tributário pelo acusado antes do recebimento da denúncia", como prevê a lei 9.249.
      O ministro Fernando Gonçalves, do STJ, que também é o relator do inquérito que apura a suspeita de enriquecimento ilícito de Costa, determinou, então, o arquivamento da ação penal.
Interrogatório
      No caso do desembargador Haddad, o ministro-relator Fernando Gonçalves, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), designara o próximo dia 4 de agosto para o interrogatório dele e de sua ex-mulher, a advogada Maria Cristina Aparecida Souza Figueiredo Haddad, também denunciada.
      Em abril, Haddad foi afastado do cargo por decisão unânime da Corte Especial do STJ. Em seu voto, o ministro Gonçalves mencionou o inquérito criminal a que Haddad responde no STJ por suspeita de enriquecimento ilícito (também instaurado com base na reportagem da Folha).
      Em maio, o juiz afastado impetrou habeas corpus no STF, com pedido de liminar, contra a decisão do STJ, sob a alegação de falta de justa causa para a denúncia. A liminar foi indeferida pelo ministro-relator Gilmar Mendes.
      No último dia 2, atendendo a pedido dos acusados, Mendes deferiu liminar "tão-somente para suspender a realização do interrogatório" no STJ até o julgamento do mérito pelo STF.

Servidores iniciam primeira greve sob Lula
Entidades estimam que 40% dos servidores federais devem parar; para sindicalista, João Paulo só negocia "perfumaria"
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

      Contrários ao texto da reforma da Previdência proposto pelo governo, servidores públicos federais ligados às 11 entidades que compõem a CNESF (Coordenação Nacional das Entidades de Servidores Federais) iniciam a partir de amanhã a primeira greve por tempo indeterminado desde o início do governo Lula.
      Estimativas da coordenação apontam para uma adesão de 40% a 45% dos servidores federais à paralisação ainda neste mês, o que corresponde a cerca de 400 mil funcionários públicos parados. A promessa do movimento grevista é suspender as atividades nas universidades e escolas técnicas, no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), nos serviços de saúde, na Receita Federal e no Judiciário, entre outros setores.
      A decisão de paralisar as atividades foi tomada no fim de semana em reunião plenária da CNESF, em Brasília. Quase houve unanimidade: dos 397 delegados presentes, apenas quatro se abstiveram e os demais votaram pela greve. No mês passado, a coordenação promoveu uma marcha em Brasília contra a reforma, reunindo cerca de 30 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios.
      Mesmo diante da ameaça de greve, o governo tem afirmado que não negociará a proposta de reforma da Previdência. Há menos de um mês, durante instalação da Mesa Nacional de Negociação Permanente (fórum de discussão entre governo e servidores), o ministro José Dirceu (Casa Civil) deixou claro que qualquer negociação deverá ser feita diretamente com o Congresso.
Ontem, a Folha tentou ouvir o Ministério do Planejamento sobre a greve. Vários recados foram deixados, mas até a conclusão desta edição a assessoria de imprensa não havia respondido.
      "Chegamos a pedir uma audiência com o presidente Lula para discutir o assunto, e a resposta que tivemos foi que o tema deverá ser tratado conosco pelo ministro [Ricardo] Berzoini [Previdência]. Ou seja, o nosso pedido não foi aceito", relatou José Domingues, um dos representantes da CNESF.
Perfumaria
      Ele acrescentou que as negociações diretas com o Congresso não têm atendido às principais reivindicações dos servidores. "Um grupo esteve reunido com o João Paulo [João Paulo Cunha, presidente da Câmara]. Ele só negocia perfumaria. Isso não resolve", declarou o sindicalista, acrescentando que a reivindicação original do movimento grevista é pela retirada da reforma do Congresso.
      João Paulo afirmou na semana passada que pelo menos três pontos da reforma da Previdência devem ser alterados: o aumento da idade mínima para aposentadoria, a forma de cálculo do benefício e a aposentadoria especial a que têm direito os professores.
      Os pontos são alvo de um grande número de emendas dos deputados e já são tratados informalmente pelos governistas como temas que devem ser "aperfeiçoados"- ou "ter uma atenção melhor", nas palavras de João Paulo.
Calendário
      Domingues enfatiza que a suspensão da greve só será possível se o governo mudar o calendário de tramitação da reforma, aceitando discutir com os servidores. "Não entendemos por que esse atropelo. Não somos contra reformar a Previdência, mas não aceitamos a proposta que está aí", comentou.
      Nos últimos meses, sindicatos de servidores de vários setores deflagraram paralisações pontuais e temporárias para protestar contra a reforma.
FRASES
      Chegamos a pedir uma audiência com o presidente Lula para discutir o assunto, e a resposta que tivemos foi que o tema deverá ser tratado conosco pelo ministro Berzoini
      Um grupo esteve reunido com o João Paulo. Ele só negocia perfumaria. Isso não resolve
JOSÉ DOMINGUES

Greve acontece em meio a racha entre entidades
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

      A anunciada greve dos servidores ocorrerá em meio a um racha no movimento sindical do funcionalismo. Na semana passada, 52 entidades de funcionários públicos lançaram as bases de uma nova central -exclusiva de servidores -, o que expôs uma fratura na hegemonia da CUT (Central Única dos Trabalhadores) entre os servidores públicos.
      A CUT não está engajada no movimento de greve por acreditar que pedir a retirada da reforma da Previdência é abreviar o caminho para o fracasso. O presidente da central, Luiz Marinho, tem preferido fazer críticas pontuais à proposta do governo, mostrando alinhamento com o Planalto.
      Das 11 entidades federais que fazem parte da CNESF, apenas duas não são ligadas à CUT. O restante, filiado à central, defende a greve. Outros sindicatos, apesar de não integrarem a estrutura da CNESF, também têm combatido a reforma da Previdência.
      A nova central de servidores, que espera congregar 1 milhão de funcionários, só deverá ter uma estrutura definitiva a partir de setembro, quando serão eleitas as diretorias regionais e nacionais. Até lá, promete realizar manifestações e atos em defesa do funcionalismo.