quarta-feira, 16 de julho de 2003
Folha de S.Paulo
REFORMA NO AR
Reunião com governadores não define texto
final da Previdência
Planalto inclui aposentadoria
integral na proposta a Estados
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DO ENVIADO A BRASÍLIA
Após diversas oscilações, recuos e falta de definições
na reforma da Previdência, na última semana, o governo acabou
apresentando aos cinco governadores -em reunião ontem de três
horas e meia no Planalto- uma proposta que mantém a integralidade
das aposentadorias para os atuais servidores públicos desde que
respeitadas quatro condições.
No encontro, não houve definição sobre outro item
da proposta original do Executivo, também defendida pelos governadores:
o fim da paridade de reajustes entre salários da ativa e valor
da aposentadoria. Para os futuros servidores, deverá ser mantido
o projeto original do governo: fim da integralidade e da paridade.
Segundo o ministro Ricardo Berzoini (Previdência), que esteve na
reunião, a paridade para atuais servidores é uma possibilidade
que ainda será discutida.
O que ficou claro no encontro é que a integralidade (salário
integral na aposentadoria), desde que respeitadas algumas condições
e somente aos atuais servidores, foi um ponto de "entendimento"
e a paridade (aumentos para servidores da ativa valem para os aposentados)
continua sendo uma matéria "controversa".
Para ter direito à aposentadoria equivalente ao último
salário em atividade, o servidor precisará ter, segundo
Berzoini apresentou ontem: 20 anos na carreira em que se aposentar, 25
anos de serviço público, 60 anos de idade (homem) e 55 anos
(mulher) e 35 anos de contribuição (homem) e 30 anos (mulher).
Cálculos feitos pelo Ministério da Previdência, de
acordo com o ministro, mostram que o governo federal perderá, em
20 anos, R$ 1,7 bilhão da economia que teria com a reforma original.
Ou seja, em vez de economizar R$ 52,4 bilhões no período,
terá um ganho fiscal de R$ 50,7 bilhões.
A proposta ainda prevê que as futuras pensões serão
preservadas de qualquer desconto até R$ 2.400. Acima desse valor,
será aplicado um redutor de 50%. "A intenção
é preservar as pensões de menor valor", disse Berzoini.
O ministro enfatizou que esse valor pode ser muito alto para os Estados,
pois a maioria dos servidores estaduais ganha até R$ 2.400. "Portanto,
não há compromisso prévio com relação
a esse valor. Os governadores podem trazer novas sugestões."
Representando as cinco regiões do país, participaram da
reunião os governadores Aécio Neves (PSDB-MG), Germano Rigotto
(PMDB-RS), Marconi Perillo (PSDB-GO), Wilma de Faria (PSB-RN) e Eduardo
Braga (PPS-AM). Também estavam presentes os ministros Berzoini
e Luiz Guhiken (Comunicação de Governo) e o secretário-executivo
da Fazenda, Bernard Appy.
Do Congresso, participaram os líderes governistas Aldo Rebello
(PC do B-SP) e Amir Lando (PMDN-RO), o relator da reforma, o deputado
José Pimentel (PT-CE), o líder do PTB na Câmara, deputado
Roberto Jefferson (RJ), e o presidente da Câmara, João Paulo
Cunha (PT-SP).
Ao sair do encontro, Pimentel disse que seu relatório já
estava pronto e que o prazo de um dia servirá para que os governadores
apresentem uma "posição clara". Questionado se
outras mudanças ainda eram possíveis, disse apenas que o
relatório já levou em conta "tratativas com os líderes
da oposição e da situação".
Para Rebello, a sinalização de Perillo e Braga de que a
proposta não fere o projeto original acordado com os governadores
deverá ser acompanhada pelos demais.
"A proposta [atual], nos primeiros 12 a 13 anos, é muito
mais vantajosa para os Estados do que a PEC 40. Mas em 20 anos, ela se
equilibraria", disse Pimentel. Segundo ele, os governadores pediram
para que o cálculo do impacto das mudanças nos Estados,
entregue na reunião, não fosse divulgado. (JULIANNA SOFIA,
LEILA SUWWAN, JOSÉ ALBERTO BOMBIG)
Maratona de reuniões
definiu novas propostas
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA
Os setores envolvidos diretamente nas negociações da reforma
da Previdência patrocinaram ontem uma maratona de reuniões
para tentar emplacar mudanças na proposta.
As nove horas que antecederam a reunião do ministro José
Dirceu (Casa Civil) com os governadores foram marcadas por pelo menos
oito reuniões e uma infinidade de conversas e troca de telefonemas
no Congresso e no Palácio do Planalto.
A articulação começou às 8h, em um café
da manhã na casa do presidente da Câmara, João Paulo
Cunha (PT-SP), que reuniu Dirceu e os líderes dos partidos aliados
ao governo.
Na reunião, saiu a definição de que a Câmara
defenderia a manutenção da integralidade (benefício
da aposentadoria igual ao salário da ativa) e da paridade (extensão
aos aposentados dos reajustes concedidos ao pessoal da ativa) para os
atuais servidores, mas com aumento de cinco anos na exigência de
permanência no serviço público.
Depois do café, o palco das negociações foi transferido
para a Câmara e para o Palácio do Planalto. A bancada do
PT se reuniu para discutir a proposta, e servidores e a CUT foram recebidos
pela liderança do governo.
Após esse encontro, João Paulo colocou em palavras a insatisfação
dos congressistas com o que eles vêm classificando de supervalorização
dos governadores nas negociações.
"Quem vota são os deputados e os senadores. Então
não há acordo possível feito lá fora que esteja
garantido sem consultar os partidos e deputados", afirmou.
O ministro Ricardo Berzoini (Previdência) também foi à
Câmara se encontrar com a bancada do PFL.
Na mesma hora, sete deputados que lideram o grupo governista do PT almoçaram
com Dirceu no Planalto para definir o discurso a ser adotado daqui em
diante.
Governo negocia pontos
da reforma com a CUT para atenuar desgaste
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo deseja ajudar a CUT (Central Única dos Trabalhadores)
a encontrar uma saída política para que a direção
da entidade também possa dizer que obteve uma vitória na
negociação da reforma da Previdência.
A tendência é atender em parte alguns pedidos da entidade,
como o aumento do teto das aposentadorias. Ele pode passar para R$ 2.700,
em vez da proposta original do governo de R$ 2.400. A CUT defendia um
valor mais alto, de R$ 4.800.
O relator da reforma da Previdência, José Pimentel (PT-CE),
não descartou essa proposta de alteração. "Vou
fazer os cálculos atuariais nesta noite [ontem] para ter uma noção
exata do impacto que essa medida representaria."
A CUT é a central sindical que mais ajudou o Planalto nas últimas
semanas, sobretudo porque se posicionou contra a greve dos servidores
públicos. Ocorre que o governo recuou e a CUT ficou fragilizada
politicamente.
Outro pedido da central em estudo é o que eleva o limite de isenção
da contribuição dos inativos, que poderia passar de R$ 1.058
para R$ 1.300. A entidade defendia limite de isenção de
R$ 2.400.
Pela proposta, dos salários que excederem o limite será
cobrada contribuição apenas sobre a faixa que ficar acima
do piso, qualquer que seja ele.
Para atender a reivindicação da CUT e fixar o piso em R$
2.400, o governo enfrenta oposição dos governadores. Segundo
Pimentel, a mudança foi "frontalmente" recusada pelos
cinco chefes de Executivos estaduais reunidos ontem no Palácio
do Planalto.
"Os governadores disseram que não têm margem para aumento
[do piso] porque, por exemplo, no Norte e no Nordeste, com exceção
da Bahia, de Pernambuco, do Ceará e do Pará, 90% dos atuais
aposentados e pensionistas têm benefício que vai até
R$ 1.058", disse o relator da reforma.
Os governadores são os principais interessados na tributação
dos inativos para resolver problemas de déficit no caixa dos seus
Estados, e o Planalto condicionou qualquer mudança no texto da
reforma da Previdência à aprovação dos governadores.
Outro pedido da CUT se refere ao redutor das aposentadorias de quem deseja
se aposentar mais cedo, mas que não recebe o salário integral.
A reforma prevê um redutor de 5% no valor da aposentadoria para
cada ano antecipado. A CUT deseja que esse redutor seja válido
somente para as faixas de rendimento que excederem R$ 2.400.
Para o presidente da central, Luiz Marinho, a proposta do governo de
manter a aposentadoria integral e a paridade de reajustes para os atuais
servidores foi uma "concessão aos altos salários".
Assim, a alteração na regra de aplicação
do redutor atenderia quem ganha menos.
É possível que nenhuma dessas propostas da CUT seja incorporada
à reforma, mas alguma coisa derivada delas pode ser incluída
no relatório. A negociação se dará até
amanhã, quando o texto final deverá estar pronto para ser
lido na comissão especial.
(FERNANDO RODRIGUES E FERNANDA KRAKOVICS)
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Colaborou RANIER BRAGON, da Sucursal de Brasília
REFORMA NO AR
Presidente intervém no calendário porque
quer ouvir governadores sobre proposta da Previdência
Sem consenso, Lula decide adiar relatório
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A fim de dar tempo para que os governadores sejam consultados, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, que está na Europa, determinou
o adiamento da apresentação do relatório da reforma
da Previdência, que estava marcada para hoje, por 24 horas.
O mesmo pedido havia sido feito pelos governadores, que advertiram o
Palácio do Planalto: não pretendem assumir sozinhos o ônus
por eventuais mudanças na proposta original de reforma da Previdência,
acertadas entre eles e o presidente em pelo menos três reuniões
em Brasília.
A intervenção de Lula ocorreu quando sete deputados que
lideram o grupo governista do PT almoçavam ontem com José
Dirceu (Casa Civil), no Planalto, para definir o discurso a ser adotado
daqui em diante. No meio da reunião, o ministro recebeu o telefonema
do presidente pedindo o adiamento para amanhã, quando ele já
estará em Brasília.
Na reunião do final da tarde, na Casa Civil, Dirceu manteve contato
com o presidente Lula e com o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda)
por telefone durante todo o encontro.
Os 27 chefes de Executivo estaduais também pediram o adiamento
e devem tomar conhecimento das propostas hoje, por meio dos cinco governadores,
cada um representando uma região, que as discutiram ontem no Palácio
do Planalto. Ao final do dia, os governadores darão uma reposta.
Ontem, ao sair da reunião com Dirceu, a comissão de cinco
governadores informou que ainda não houve acordo em torno da nova
proposta do governo, que prevê a manutenção da aposentadoria
integral dos atuais servidores. "Não aceitamos nada por enquanto.
Vamos ouvir os demais governadores", afirmou Germano Rigotto (PMDB-RS).
O recado dos governadores ao governo federal foi dado na reunião
que começou às 16h45 e terminou às 19h30 na Casa
Civil. Também participaram o ministro Ricardo Berzoini (Previdência)
e líderes congressistas.
Eles admitem discutir mudanças como a manutenção
da aposentadoria integral dos atuais servidores públicos, mas querem
também negociar "reivindicações históricas",
como maior participação dos Estados na divisão do
bolo tributário. Apesar disso, os governadores afirmaram que não
vão barganhar nem misturar as propostas da reforma da Previdência
com a tributária.
Em reunião prévia no meio da tarde, em um hotel de Brasília,
também avaliaram que o governo federal, ao dizer que eventuais
mudanças na reforma previdenciária depende deles, tenta
fazer média com setores corporativistas e jogar sobre eles a responsabilidade
das mudanças.
"Não dá para o governo federal transferir aos governadores
o ônus da manutenção desta ou daquela parte da reforma
porque ela contraria esse ou aquele segmento. Esta é uma questão
grave", afirmou o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB).
"Fomos solidários, fomos co-responsáveis, e, de repente,
nós não podemos ter nas nossas costas o ônus e a responsabilidade
pelas mudanças e por recuos em relação a essas mudanças",
fez coro o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB).
Esse foi o tom da reunião no Planalto. Além de Aécio
e Perillo, participaram da discussão os governadores Eduardo Braga
(PPS-AM), Germano Rigotto (PMDB-RS) e Vilma Maia (PDT-RN).
Na reunião prévia realizada em um hotel de Brasília,
os governadores acertaram que não decidiriam nada na conversa no
Planalto: iriam apenas tomar conhecimento das mudanças em discussão
entre o governo, o Judiciário e o Congresso.
"O momento é de uma certa apreensão, de uma certa
tensão. Conversamos várias vezes e até agora não
temos respostas concretas em relação a reivindicações
histórias por parte de governadores e prefeitos", disse Perillo.
"Queremos saber até aonde o governo está disposto
a ir, tanto na reforma previdenciária quanto na tributária",
disse Aécio.
Aposentadoria integral divide especialistas
DA REDAÇÃO
Dois especialistas ouvidos ontem pela Folha discordam sobre as consequências
da possível manutenção da aposentadoria integral
para atuais servidores e sobre a paridade de vencimentos entre ativos
e inativos. Eles concordam, porém, que estender a aposentadoria
integral aos novos servidores seria um "retrocesso".
Para o economista Raul Velloso, a idéia de que a aposentadoria
integral seja incompatível com o equilíbrio fiscal é
amplamente aceita. Manter o benefício, portanto, minaria a confiança
dos investidores no governo.
Marcelo Viana Estevão, ex-secretário de Previdência
Social, discorda. Seu argumento é que, como a proposta atual prevê
que a aposentadoria do servidor será a média dos 80% maiores
salários desde julho de 94, corrigidos pela inflação,
já seria muito próxima do último salário do
servidor na ativa.
Sobre a paridade -que garante às aposentadorias os mesmos reajustes
concedidos aos ativos-, Velloso acha que isso cria uma incerteza em relação
à evolução futura da despesa pública.
Estevão concorda que o mecanismo engessa a política de
remuneração do governo, mas argumenta que a alternativa
pode ser pior. Ele explica: a proposta prevê que as aposentadorias
sejam corrigidas. Sem a vinculação com os reajustes dos
ativos, a tendência é o Judiciário decidir pelo reajuste
de acordo com o INPC, como ocorre com os benefícios do INSS. Em
maio, eles foram corrigidos em 19,71%, contra 1% de reajuste dado aos
servidores.
O ex-secretário acha ainda que o acordo que o governo tenta fazer
tem a vantagem de contar com a participação do Judiciário,
o que minimiza o risco de decisões contrárias ao espírito
da reforma.
REFORMA NO AR
Ministro diz que salários dos servidores em
greve serão retidos, mas não descarta fazer reposição
depois
Dias parados serão descontados,
diz Palocci
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI
O governo vai descontar dos funcionários públicos em greve
o salário correspondente aos dias parados. A informação
é do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, que não
toma a medida como uma represália, mas como rotina administrativa.
Palocci não descarta uma negociação posterior para
repor os salários a serem agora retidos. "O presidente da
República é que vai resolver."
O ministro não esconde que ficou incomodado com o que chama de
"ruídos" sobre recuo do governo na proposta de reforma
da Previdência, ao que se seguiram outros ruídos, agora sobre
recuo do recuo.
Mas Palocci nega que a greve do funcionalismo tenha estado na origem
das articulações que levaram à sensação
de que o governo abrandaria sua posição.
Pelo que a Folha apurou, o governo acredita que foi a intervenção
do Judiciário no debate que levou às negociações
envolvendo propostas alternativas.
Agora, no entanto, o governo está convencido de que o presidente
da República repôs o debate nos trilhos. Lula disse na semana
passada, em Portugal, que a reforma fora negociada no CDES (Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social) e com os governadores. Logo,
embora o Congresso seja soberano para mudar propostas do Executivo, a
aceitação das mudanças passa por novo acordo com
os governadores.
Parece mais lógica a avaliação do governador da
Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB), que acompanha o presidente
na viagem à Europa: "Ninguém é louco de apresentar
uma proposta e dizer que ela é negociável".
Traduzindo: o governo tinha mesmo que ser inflexível, porque uma
proposta declaradamente negociável seria estraçalhada. Agora,
busca os limites para preservar o que Palocci chama de "coração"
da reforma. Na semana anterior, Tarso Genro, o coordenador do CDES, apontara
o que Lula achava ser o "coração" da reforma (Tarso
usou a palavra "cerne", o que dá no mesmo): "seu
caráter redistributivo, a eliminação dos privilégios
e a questão fiscal".
Palocci não entra em detalhes sobre o que é e o que não
é parte do "coração" da proposta. Mas,
no almoço de ontem com empresários espanhóis, pôs
toda a ênfase apenas no aspecto fiscal:
"Algumas delas [as reformas], como a reforma da Previdência,
tendem a produzir impactos diretos sobre as contas do setor público",
afirmou.
O ministro desenvolve um raciocínio que contraria totalmente a
idéia sobre a reforma que faz a maioria dos funcionários
públicos e que está na lógica da greve. Diz, em essência,
que trabalhar por mais tempo é "salutar".
O raciocínio completo de Palocci começa por dizer que "a
mensagem da reforma não é a de tirar direitos". São,
na verdade, duas mensagem. A primeira é a de que o direito à
aposentadoria inscrito na Constituição precisa "ser
sustentável nas contas" (é a mesma lógica exposta
por Lula, na semana passada, segundo a qual, se não houver a mudança
agora, daqui a alguns anos não haverá como pagar a aposentadoria
dos servidores públicos).
Por fim, a segunda parte da mensagem: "O fundamental é a
ampliação do prazo de trabalho das pessoas. Os servidores
devem entender isso como salutar". O ministro não quis comentar
a afirmação do presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho),
Francisco Fausto, que afirmou que a proposta do PT caracteriza "estelionato
eleitoral", por, supostamente, retirar direitos, ao contrário
do prometido na campanha eleitoral do ano passado.
"No nosso programa de governo, está o compromisso de fazer
a reforma da Previdência", diz o ministro. De fato está,
mas sem detalhe algum, exceto enquadrá-la na discussão de
um contrato coletivo de trabalho com o funcionalismo, discussão
que mal começou.
Greve se amplia, mas
movimento enfrenta divisão
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Apesar do aumento de 50% para 55% na adesão à greve do
funcionalismo, segundo os servidores, a paralisação completou
a primeira semana com um racha. O Ministério do Planejamento informou
ontem que interrompeu os balanços diários sobre a greve
na sexta-feira e voltará a divulgar sua versão sobre a adesão
à greve quando tiver dados consistentes.
Mais da metade das entidades que comandam a greve prefere negociar mudanças
no texto da reforma da Previdência com deputados, em vez de aguardar
uma posição do governo federal.
A greve começou no dia 8 e é comandada pela Coordenação
Nacional de Entidades de Servidores Federais, composta por 11 entidades.
Seis delas participaram ontem de reunião com o deputado João
Paulo Cunha (PT-SP). Outras quatro permaneceram em reunião no comando
de greve.
Ponto pode ser cortado, dizem advogados
RICARDO WESTIN
DA REDAÇÃO
Advogados ouvidos pela Folha afirmam que não há problemas
legais em descontar do salário dos servidores públicos os
dias de paralisação em protesto contra a reforma da Previdência.
A intenção do governo, em represália à greve
que começou na semana passada, foi anunciada ontem pelo ministro
Antonio Palocci Filho (Fazenda).
Em qualquer disputa que travem na Justiça contra o governo a respeito
do ponto cortado, os servidores públicos estarão sempre
em desvantagem, de acordo com os advogados.
A Constituição assegura o direito de greve aos trabalhadores.
No entanto, no caso dos servidores públicos, diz que esse direito
será regulamentado por uma lei. Mas essa lei ainda não existe.
"O Supremo Tribunal Federal entende que, enquanto não essa
lei não vier, os servidores não podem fazer greve. Por isso,
é lícito que o poder público corte o pagamento",
explica a professora de direito constitucional da Uerj (Universidade do
Estado do Rio de Janeiro) Ana Paula Barcellos.
O advogado Márcio Pestana, professor de direito administrativo
da Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), afirma
que, diante da ausência de uma norma que regulamente a greve, a
Justiça pode usar a lei que disciplina a greve no setor privado.
Ainda assim, as chances de os trabalhadores terem sucesso na disputa
são pequenas porque, segundo Pestana, o motivo da greve não
tem a ver com as relações de trabalho. "O motivo é
político", diz ele. "Trata-se ainda de um projeto [sobre
mudanças na Previdência], que não está ferindo
os direitos de ninguém, pelo menos neste momento."
"Eles não teriam respaldo legal para pleitear a revisão
do corte do ponto na Justiça", afirma o advogado trabalhista
Antônio Carlos Magalhães Leite.
A situação dos servidores públicos pode se complicar
ainda mais caso entrem na Justiça contra o governo, acrescenta
o advogado trabalhista Elias Kubo:
"Se a Justiça considerar a greve abusiva, também pode
haver multas para os sindicatos e até exoneração
de quem tem cargo comissionado."
Paralisação do INSS deixa
63 mil sem atendimento em 6 Estados
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) tem deixado de atender diariamente
cerca de 63 mil pessoas no Estado de São Paulo e nas capitais de
Alagoas, Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Sul, por causa
da greve dos servidores federais, que entrará hoje no oitavo dia.
A paralisação, por tempo indeterminado, é um protesto
contra a reforma da Previdência encaminhada ao Congresso pelo presidente
Luiz Inácio Lula da Silva. Os servidores querem a retirada do projeto.
De acordo com levantamento da superintendência do INSS de São
Paulo, a adesão tem crescido no interior do Estado desde que a
greve começou, no último dia 8. O protesto fechou ontem
32,2% dos 118 postos de atendimento do INSS no interior, contra 15,25%
no primeiro dia da manifestação.
A paralisação é grande na cidade de São Paulo,
onde 23, das 27 agências do INSS, pararam completamente ontem. Outras
duas tiveram funcionamento parcial e só duas abriram as portas.
Nas 13 agências da Grande São Paulo, sete suspenderam o atendimento.
Em todo o Estado, 44 mil pessoas deixam de ser atendidas por dia.
A greve ontem também foi marcado pelos primeiros sinais de adesão
entre os servidores da Saúde. O posto de atendimento médico
"Várzea do Carmo", considerado um dos maiores de São
Paulo, com cerca de 800 atendimentos por dia, parou parcialmente, pela
manhã. Os servidores federais querem manter o protesto por tempo
indeterminado.
No posto também estão lotados servidores estaduais, cuja
maioria trabalhou normalmente ontem.
Em cinco capitais onde a adesão dos servidores da Previdência
Social atingiria 100% dos profissionais, segundo os próprios sindicatos
da categoria, cerca de 19 mil pessoas estão deixando de ser atendidas
diariamente.
No Rio Grande do Sul, onde a média de atendimentos é de
3.000 pessoas por dia, os seis postos de serviço de Porto Alegre
não funcionam há uma semana. O movimento grevista é
forte também em Pelotas, Rio Grande e Santa Maria, de acordo a
direção do Sindisprev-RS. Nenhum serviço ao público
estaria sendo realizado, segundo a entidade.
Em Maceió (AL), 1.800 pessoas estão sendo prejudicadas
todos os dias pelo fechamento das três agências locais. Apenas
a liberação de pagamento de segurados está sendo
feita, segundo informações do Sindisprev-AL.
No Ceará, outro Estado que tem conseguido adesão total
à greve, cerca de 1.500 pessoas não estão sendo atendidas
por dia nos oito postos de Fortaleza. De acordo com Vera Level, da direção
do Simprece, alguns serviços via internet e informações
básicas ao público eram possíveis até ontem.
As paralisações afetam totalmente também os serviços
previdenciários em Recife e em Salvador. Nas duas capitais, cerca
de 11 mil pessoas deixam de receber assistência nos postos de atendimento
diariamente.
A assessoria de imprensa da Previdência Social em Brasília
informou que ainda não há um balanço oficial sobre
os reflexos das paralisações pelos Estados.

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