terça-feira, 26 de agosto de 2003

Folha de S.Paulo

PREVIDÊNCIA

Partido votará contra texto

PDT romperá acordo de não propor destaques
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

O PDT pretende romper o acordo entre os partidos da base aliada e da oposição para que não sejam apresentados destaques hoje na votação em segundo turno da reforma da Previdência na Câmara. Há também a determinação de que seus 14 deputados votem contra o texto principal.

O objetivo dos pedetistas é estabelecer um subteto salarial único nos Estados, limitado a 90,25% dos vencimentos de um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). O texto aprovado em primeiro turno prevê que esse será o limite nos Estados para o Judiciário, mas o teto do Executivo será o salário do governador, e o do Legislativo, o dos deputados.

"Vou conversar com o líder do PDT. Isso não é bom para a Câmara. Temos um trato que tem que ser cumprido", disse o presidente da Casa, deputado João Paulo Cunha (PT-SP). O PDT informou ontem que o partido fechou questão a favor da apresentação dos destaques e contra a reforma, por unanimidade, em reunião do Diretório Nacional do partido na última sexta-feira.

PFL diz que vai obstruir a votação e classifica reforma de "meia-sola"
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A cúpula do PFL no Congresso divulgou ontem uma "nota ao povo brasileiro" em que ataca a reforma tributária, afirmando que o "governo está cometendo a sua mais grave insensatez".
A nota foi lida pelo presidente nacional do partido, senador Jorge Bornhausen (SC), que acrescentou os adjetivos "míope" e "meia-sola" para caracterizar a proposta. Segundo a nota pefelista, haverá aumento da carga tributária no país e os contribuintes, a economia e o equilíbrio federativo serão prejudicados caso o texto atual seja aprovado.
"Essa reforma é míope, não aponta para o crescimento do país", afirmou Bornhausen. O texto foi lido no gabinete da liderança do partido na Câmara. "A menos que o governo produza alterações profundas, não será difícil encontrar 210 deputados contrários a essa reforma", afirmou o deputado José Carlos Aleluia (BA), líder da bancada.
Sua contabilidade faz referência à necessidade de o governo ter 60% dos votos dos deputados para aprovação em plenário, ou seja, 308 de 513. Caso mais de 205 não votem a favor, a reforma seria rejeitada. O deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (BA) também estava presente e deu seu apoio. O partido reafirmou que continuará tentando obstruir a votação hoje.
Outra crítica à reforma partiu do presidente da Facesp (Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo) e da Associação Comercial de São Paulo, Guilherme Afif Domingos. Ele insinuou ontem que seria melhor não fazer a reforma tributária, caso seja mantido o atual texto.
"Se é para fazer mais emenda de cano, o risco é ter mais vazamento." Ele esteve ontem com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, para apresentar uma proposta que prevê o adiamento no pagamento de tributos federais.


REFORMA AOS PEDAÇOS

Guimarães quer converter IR em "Imposto Robin Hood"

Relator admite que projeto pode elevar carga tributária
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O deputado Virgílio Guimarães (PT-MG) admitiu ontem que o projeto de reforma tributária, do qual é relator, abre brechas para o aumento da carga tributária.

"Sem dúvida o sistema tributário é muito vulnerável", disse Guimarães. "A realização plena do sistema tributário é na legislação infraconstitucional. Isso merece muita atenção. Eu defendo aqueles que apontam o risco, mas não [os que] apontam a certeza [de aumento da carga tributária]."

Ele participou de debate sobre a reforma promovido pela Força Sindical, em São Paulo. Também estavam presentes o presidente da Fecomercio-SP (Federação do Comércio do Estado de São Paulo), Abram Szajman, o próprio presidente da Força, Paulo Pereira da Silva, o coordenador de estudos tributários da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Cláudio Vaz, e o tributarista Ives Gandra Martins.

Para o deputado, porém, "essa talvez seja a reforma tributária mais preocupada em ter instrumentos de controle" contra a possibilidade de elevação dos impostos. O relator disse ainda que é preciso esperar pela queda na taxa de juros para que caia também a carga tributária. Ele respondia à afirmação de Szajman e de Gandra Martins de que era impossível esperar uma carga menor devido ao tamanho do Estado brasileiro.

"O principal gasto [do Estado] é a taxa de juros. Precisamos derrubar a taxa de juros. Esse é o nosso inimigo central", disse Guimarães. "Aí sim vamos poder reduzir a carga tributária." Ele acredita porém que "a carga tributária deve ficar neutra". "Para quem vai investir, para quem vai exportar, quem vai produzir e para as populações mais pobres, a carga tributária cai. Para os sonegadores, [para] os que apostam na guerra fiscal, a carga vai fazer justiça."

Discussão
Guimarães e Gandra Martins chegaram a discutir. O relator, após ouvir as críticas do advogado, disse: "A reforma tem que ser equilibrada, adequada, sem esses comandos aparentemente auto-aplicáveis, que só se aplicam para o aumento da arrecadação dos advogados tributaristas". O tributarista respondeu que "certamente os advogados ganharão muito dinheiro graças", justamente, "à reforma tributária", pois ela criará disputas a serem resolvidas.

Uma "grande novidade" da proposta, segundo o relator, é a maior função redistributiva do Imposto de Renda. "O IR, que é o Imposto de Renda, seria melhor se ele fosse chamado de IRH, Imposto Robin Hood", pois vai "tirar do rico e passar para o pobre".

Os instrumentos para isso, ele disse, serão acertados em legislação infraconstitucional. O dinheiro que vai "para o pobre" será o Imposto de Renda negativo. "Vai se aproximar muito da legislação que está em tramitação do projeto de renda mínima, do senador [Eduardo] Suplicy [PT-SP]."

Estatização
O tributarista Ives Gandra Martins afirmou ontem que existe o risco de que a implementação de progressividade no ITCMD (imposto sobre a herança), prevista na reforma tributária, possa levar à estatização ou à desnacionalização de indústrias brasileiras.

Afirmando que o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) defendeu como alíquota máxima "razoável" 35% para as heranças, Gandra Martins disse: "Como os grandes empresários são as grandes fortunas, cada vez que morrer um grande empresário no país, seus herdeiros teriam que vender um terço [da empresa] ou entregar um terço para pagar o tributo. Em duas gerações, nós teríamos a estatização das empresas".

Guimarães disse defender a exclusão do patrimônio produtivo da tributação. Caso contrário, ele disse, o país poderia "afugentar investimentos", o que "não seria inteligente". Essa exclusão, entretanto, não consta do relatório.