terça-feira, 09 de setembro de 2003

Folha de S.Paulo

REFORMA AOS PEDAÇOS

Petista diz que não há como evitar tramitação conjunta

Governo teme pressão maior com duas reformas no Senado
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A coincidência de tramitação, no Senado, das reformas tributária e da Previdência pode causar prejuízo para ambas, na avaliação do governo federal. A expectativa dos senadores é que a tributária -em tramitação na Câmara- chegue à Casa na segunda quinzena de setembro. A previdenciária, que já está no Senado, será votada "na melhor das hipóteses" em 8 de outubro, em primeiro turno, segundo o líder do PT e relator, Tião Viana (AC).

"Não temos como evitar a tramitação conjunta. Isso traz preocupação. As duas juntas podem gerar uma forma de pressão política que pode significar prejuízo de uma e de outra", disse Viana.

No Senado, a reforma tributária provoca mais interesse do que a previdenciária. O receio do governo é que a reforma da Previdência seja usada para pressionar por mudanças na tributária.

Hoje, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), reunirá os líderes partidários para "tentar ajustar" os dois calendários.

O primeiro impasse em torno da reforma tributária já divide oposição e governo no Senado, que disputam o cargo de relator. "O governo considera que é fundamental ter sua relatoria, por ser matéria que trata da governabilidade. Além disso, nós, junto com o PMDB, temos maioria na CCJ", disse Viana.

O PFL quer que o presidente da comissão, Edison Lobão (PFL-MA) nomeie Rodolpho Tourinho (PFL-BA), mas o governo não aceita. O líder do PT defendeu ontem a indicação de Fernando Bezerra (PTB-RN), que, embora seja ex-presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), é da base governista e é considerado um aliado confiável.

O PMDB, por sua vez, também está no páreo com o senador Romero Jucá (RR).

Como relator da reforma da Previdência, Viana disse que pretende apresentar seu relatório na semana que vem, desde que na quinta-feira desta semana a CCJ realize audiência pública sobre as emendas propostas, com a presença do ministro Ricardo Berzoini (Previdência) e de representantes dos setores interessados.

"Essa audiência pública vai ser um marco para a relatoria saber como proceder em relação às emendas [propostas de mudanças do texto]", disse Viana.

Até o início da noite de ontem, 161 emendas à reforma da Previdência haviam sido apresentadas na CCJ. Embora prometendo examinar cada uma e conversar com todos os senadores, o líder do PT reafirmou que não pretende alterar o texto aprovado pela Câmara dos Deputados.

As únicas emendas que Viana admite acolher são as supressivas -que propõe retirar trechos da proposta- sem alterar o mérito.

Gerdau defende mudar tributária
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

Descontentes com a reforma tributária, os empresários irão promover nesta semana uma série de reuniões para discutir formas de mudar o texto no Senado. Hoje, em Brasília, diversos líderes empresariais irão se encontrar para traçar uma estratégica comum pressão no Senado.

Um dos empresários mais ativos é o industrial Jorge Gerdau Johannpeter, 66, presidente da Ação Empresarial, um influente grupo de pressão política criado por ele e cuja principal bandeira sempre foi a reforma tributária.

Nesta entrevista concedida à Folha por telefone, na sexta-feira, de sua casa, em Porto Alegre, Gerdau afirmou que o empresariado estará em "reunião permanente" para tentar mudar a reforma no Senado. Ele acha que há muitos pontos a serem aprimorados.

Folha - O que o sr. achou da reforma tributária aprovada pela Câmara dos Deputados?

Jorge Gerdau Johannpeter - O projeto tem alguns avanços, mas temos que tentar algumas correções que considero muito importantes para melhorar a reforma.

Folha - O que o sr. considerou positivo?

Gerdau - Foi positivo, por exemplo, o fato de a CPMF ter continuado temporária. Também foram positivos a instituição do teto de 25% para o ICMS e o fim da cumulatividade do Cofins. Mas há muitos pontos que terão de ser aprimorados.

Folha - Que pontos seriam esses?

Gerdau - Em primeiro lugar, acho que deveria constar, como estava na proposta original da reforma tributária, a redução gradativa da CPMF para os próximos quatro anos até atingir a alíquota de 0,08%, em vez de valor fixo que ficou estabelecido de 0,38%. Do jeito que está, a CPMF continua sendo um imposto cumulativo que fica embutido nos produtos exportados. No ICMS, além do teto de 25%, o Congresso deveria manter a obrigatoriedade de uma incidência média como a que existe hoje, de 12% a 15%, para evitar que haja aumento da carga tributária. A reforma deveria fechar as portas para potenciais aumentos da carga tributária.

Folha -O sr. acha que o Congresso irá fechar essas portas?

Gerdau - Nos últimos dez anos, o Brasil sofreu um aumento da carga tributária de 22% do PIB para 36% do PIB sem ninguém ter perguntado à população se ela queria ou não que isso acontecesse. O Congresso existe para defender o contribuinte, e não para atender o Executivo. Essa é uma tese um pouco agressiva, mas foi o contribuinte que elegeu o Congresso.

Folha - Por que o sr. acha que não há essa consciência?

Gerdau - É uma questão de cultura histórica. O próprio contribuinte não reclama da carga tributária porque não sabe quanto paga de imposto no país. O imposto no Brasil é escondido.

Folha - O que o sr. considera fundamental para mudar no projeto?

Gerdau - Uma peça chave reivindicada pelo empresariado é a desoneração tributária dos bens e produtos destinados à produção. No mundo inteiro, não se tributam os bens de capital. Esses impostos, na reforma tributária aprovada pela Câmara, caíram pela metade para os bens de capital, mas ainda não é suficiente. O Brasil deveria zerar os impostos.