Quinta-feira, 18 de setembro de 2003
Folha de S.Paulo
ROLO TRIBUTÁRIO: Governistas
querem começar 2º turno já na semana que vem
Câmara aprova tributária
em 1º turno após duas semanas
RANIER BRAGON/ DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois de duas semanas marcadas por tentativas frustradas, o governo
conseguiu às 17h45 de ontem encerrar a votação em
primeiro turno da reforma tributária na Câmara dos Deputados.
Não houve acordo com o PFL. O partido suspendeu a obstrução,
mas anunciou que continuará tentando fazer alterações
na proposta.
O resultado da última das sete votações de ontem
foi festejado pelos governistas com gritos e chuva de papel picado no
plenário da Câmara. O texto-base da proposta tributária,
relatada pelo deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), foi aprovado
no último dia 4, mais de quatro meses depois de a reforma ter chegado
à Câmara, em 30 de abril. A expectativa dos governistas é
iniciar a votação em segundo turno na quarta-feira. Vencida
essa etapa, o texto segue para o Senado.
A Câmara manteve os pontos-chave da reforma, que são, entre
outros, a prorrogação da CPMF (o "imposto" do
cheque) e da DRU (Desvinculação das Receitas da União,
que permite o gasto livre de 20% das receitas) até 2007, além
da federalização da legislação do ICMS (Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), principal
fonte de receitas dos Estados. As alíquotas do imposto cairão
de 44 para cinco.
"Essa vitória importante do governo se explica pela combinação
de uma sólida base parlamentar com uma eficiente capacidade de
negociação", afirmou o deputado Aldo Rebelo (PC do
B-SP), líder do governo na Câmara.
Ontem foram votadas e rejeitadas sete emendas apresentadas pelo PFL.
Como o partido não obstruiu os trabalhos, as votações
não levaram mais que duas horas.
A tramitação da reforma foi marcada por várias alterações
no projeto. A única que não teve a anuência do governo
foi a derrubada da idéia de tornar progressiva, com teto de 15%,
as alíquotas do imposto sobre heranças e doações.
A proposta caiu anteontem, mantendo a alíquota única de
4%.
Críticas
As mudanças patrocinadas pelo governo buscaram atender a governadores,
empresários, empresários, prefeitos, base aliada e oposição,
mas ainda há muitas críticas. "A base do governo deveria
estar preocupada com a insatisfação que essa tramitação
gerou. A festa de hoje pode ser o lamento de amanhã", afirmou
o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), que liderou
uma fracassada tentativa de acordo com o governo para atender a uma reivindicação
da Bahia.
O PFL rachou na negociação (uma parte queria o acordo,
mas a outra era contra) e, isolado pelo PSDB, que fechou acordo com o
governo, acabou se desgastando.
A mudança solicitada era retirar das novas regras do ICMS as empresas
que receberam benefícios fiscais dos Estados. O objetivo era evitar
que a Bahia perdesse parte da arrecadação vinda da fábrica
da Ford instalada no Estado.
Momentos depois do encerramento da votação da reforma no
plenário, o governo acabou tendo que enfrentar um problema com
o aliado PMDB na votação da redação final
da proposta aprovada, ocorrida na comissão especial da Câmara
que analisou o projeto.
O PMDB, liderado pelo deputado Osmar Serraglio (PR), e a bancada do Rio
argumentaram que o texto apresentado não contemplava acordo fechado
entre o Planalto e a governadora do Rio, Rosinha Matheus (PMDB). O acordo
previa que o Estado teria em 11 anos parte da arrecadação
de ICMS sobre o petróleo.
Os governistas afirmaram que a redação contempla o acordo,
mas não convenceram os peemedebistas. O texto foi aprovado na comissão
simbolicamente, mas teve os votos contrários do PMDB e os das bancadas
do Rio e do Paraná.
PFL racha e não chega a acordo com Planalto
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O PFL rachou na reta final da votação da reforma tributária
e acabou não conseguindo entrar em acordo com o governo para alterar
a proposta como forma de atender à pressão da Bahia. Duas
alas do partido se debateram em reuniões tensas que colocaram em
xeque a autoridade do líder da bancada, deputado José Carlos
Aleluia (BA).
O deputado liderou os cerca de 35 dos 67 pefelistas que eram contra um
acordo com o governo e que buscavam reforçar a marca oposicionista
da legenda.
O deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), que seguia as orientações
do senador Antonio Carlos Magalhães (BA), liderava o grupo "rebelde",
de cerca de 30 deputados, que buscava desde a semana passada um entendimento
com o governo.
O objetivo era determinar que as empresas que receberam benefícios
fiscais dos Estados ficassem de fora das novas regras de cobrança
do ICMS, principal fonte de recursos dos Estados.
Isso atenderia a Bahia, que teme perder parte da arrecadação
relativa à fábrica da Ford instalada no Estado. A medida
era também do agrado de outros governadores.
Devido a isso, enquanto parte do PFL se acomodava em gabinetes para negociar
com o governo, outra ia ao plenário e patrocinava atitudes de franca
oposição, como a tentativa de obstruir a tramitação
da reforma por meio de manobras regimentais.
No meio do fogo pefelista, o governo aceitava fazer o acordo -exigia,
para isso, o fim das manobras de obstrução-, mas acabou
transitando para uma posição consolidada ontem de que o
acordo não era mais possível.
Além de se aproveitar da divisão pefelista, os governistas
apresentaram como argumento o fato de que a bancada paulista (São
Paulo perderia com a mudança) e partidos da base aliada (contrariados
com as atitudes de plenário do PFL "oposicionista") era
contra a proposta de mudança. O governador Aécio Neves (PSDB-MG)
chegou a enviar carta aos deputados mineiros orientando-os a votar contra
o possível acordo.
A sensação de que o acordo não sairia acabou levando
os "dois PFLs" a se reunir pela última vez na noite de
anteontem no gabinete da liderança do partido.
A bancada baiana ameaçou votar contra a orientação
do líder. A reunião acabou resultando em um meio-termo:
o PFL não obstruiria mais a votação. Em troca, o
governo aceitava votar 7 das 14 emendas apresentadas pelo partido -a idéia
da Mesa era usar argumentos regimentais para rejeitar todas. (RANIER BRAGON)
ROLO TRIBUTÁRIO: Objetivo
é assegurar a aprovação da reforma previdenciária
Governo negocia e admite fatiar tributária
no Senado
RAQUEL ULHÔA / DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em negociação com a oposição para facilitar
a aprovação da reforma da Previdência no Senado, o
governo acenou ontem com a possibilidade de fatiar a tributária,
aprovando neste ano só questões consensuais e que precisam
ser promulgadas até dezembro, para que possam vigorar em 2004.
Pelo entendimento, o Senado poderá votar em 2003 apenas a prorrogação
da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação
Financeira) e da DRU (Desvinculação das Receitas da União),
a partilha da Cide (contribuição cobrada sobre o consumo
de combustível) da União com Estados e a criação
do fundo de compensação dos Estados que perdem arrecadação
com a desoneração das exportações.
A hipótese de adiar a votação de questões
polêmicas -como a mudança da cobrança do ICMS (Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) da origem
para o destino- foi admitida pelo líder do governo, Aloizio Mercadante
(PT-SP), aos líderes do PFL, do PSDB e do PMDB antes da apresentação
do relatório do líder do PT, Tião Viana (AC), sobre
a Previdência na CCJ (Comissão de Constituição
e Justiça).
Em seu parecer, Viana manteve inalterado o texto da Câmara, mas
assumiu o compromisso com os líderes de negociar as seguintes mudanças:
nova regra para o subteto salarial dos servidores do Executivo estadual
e municipal, flexibilização das regras de transição
para favorecer servidores que estão prestes a se aposentar, criação
de uma faixa de isenção da cobrança dos inativos
levando em conta critérios de idade e doença e maior controle
social na gestão dos fundos de pensão.
O próprio ministro Ricardo Berzoini (Previdência), ao participar
de audiência sobre a reforma, admitiu mudanças nas regras
do subteto salarial dos servidores do Executivo estadual e municipal.
"O subteto vai atingir Estados e municípios e não a
União. Portanto, se tiver entendimento, podemos mudar as regras",
disse.
A negociação iniciada pelos líderes em duas frentes
-em torno da previdenciária e, ao mesmo tempo, da tributária-
estabeleceu uma trégua entre governo e oposição,
e o plenário do Senado retomou ontem as votações.
"A tensão que havia foi desfeita", disse Renan Calheiros
(PMDB-AL).
Desde quinta-feira passada, PFL e PSDB estavam em obstrução
para impedir votações no plenário e atrapalhar a
tramitação da reforma da Previdência numa reação
à inclusão, pela Câmara, de benefícios a São
Paulo, Minas e Rio.
"Vamos dar uma trégua. A oposição suspende
temporariamente a obstrução e vai aguardar o desenvolvimento
das conversas. Resolvendo as divergências em torno da tributária,
desanuvia o ambiente", disse o líder do PSDB, Arthur Virgílio
(AM). Ele defende que o Senado vote apenas a CPMF, a DRU, a Cide e o fundo
de compensação em 2003 e que o restante seja debatido por
mais um ou dois anos: "Vamos ter a pressa que a prudência permitir".
Um argumento apresentado por Mercadante a favor de adiar a decisão
sobre o ICMS é o fato de que não há tempo hábil
para que as novas regras entrem em vigor em 2004 mesmo que sejam aprovadas
neste ano, porque dependem de regulamentação e de leis complementares.
"Vamos fazer um esforço para votar tudo neste ano, mas, se
for necessário separar o que é possível e indispensável
ser aprovado até dezembro [para vigorar no próximo ano]
do que não poderá ser implementado em 2004, vamos fazê-lo",
disse.
O PFL é contra o fatiamento da reforma, segundo o líder,
José Agripino (RN). Mas uma proposta de Mercadante agradou ao PFL:
a criação de um grupo suprapartidário de senadores
para ajudar no relatório. "A gente abre um armistício
para o governo, diante do início do processo de diálogo
na reforma tributária e do compromisso do líder do PT de
fazer alterações na reforma da Previdência que humanizem
o texto", disse.
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