terça-feira, 14 de outubro de 2003

Folha de S.Paulo

 

Palocci enquadra secretário e corregedor
Ministro convocou reunião com Rachid e Leão; em nota, Fazenda pede "unificação de esforços" na Receita
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) decidiu enquadrar tanto o corregedor-geral da Receita, Moacir Leão, quanto o secretário da Receita, Jorge Rachid, em uma tentativa de acabar com a guerra que existe hoje no órgão. Palocci convocou reunião ontem com os dois no próprio ministério. A conversa durou 45 minutos.
No começo da noite, o gabinete do ministro e o corregedor divulgaram notas para esclarecer suas posições. Palocci pediu a Rachid e a Leão que "procurem unificar seus esforços no sentido de aperfeiçoar o trabalho da Receita Federal". "O ministro fez um apelo para que as divergências atuais sejam superadas para o bem da Receita Federal", informou a assessoria de Palocci, por meio da nota. "O ministro criticou, porém, a criação de um ambiente conflituoso entre autoridades de grande responsabilidade."
Foi a primeira manifestação pública do ministro sobre o caso. A única declaração até agora de Palocci sobre as disputas na Receita havia ocorrido na quinta-feira da semana passada, quando informou que só iria falar "quando as palavras" fossem "mais valorosas que o silêncio".
Sem dizer diretamente, Leão negou que esteja perseguindo Rachid ou que esteja sendo motivado por questões políticas, como tem defendido nos bastidores a cúpula da Receita.
"O secretário da Receita Federal não é objeto de investigação pela Corregedoria nem acusado em processo disciplinar [...] Em nenhum momento, integrante de partido político ou grupo de interesse procurou o corregedor-geral com o propósito de utilizar a ação correcional para atender à finalidade política, fato que, se ocorresse, seria imediatamente repelido", escreveu o corregedor.

Lula e Dirceu

Palocci enquadrou Rachid e Leão depois de ter discutido ontem de manhã com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, o teor dos grampos da PF (Polícia Federal).
Um auxiliar de Lula informou à Folha que os três concluíram que os grampos não demonstram ações desabonadoras de Rachid nem indícios de corrupção, mas preocupação em reunir argumentos para se defender na disputa com Leão.
Após essa análise, Lula deu carta-branca a Palocci para chamar Rachid e Leão e pedir o fim da guerra entre eles. Apesar de Leão estar no cargo obedecendo a mandato, o presidente afirmou que o ministro da Fazenda poderia, se julgasse necessário, ameaçar toda a cúpula da Receita Federal de demissão.
Na conversa com Rachid e Leão, Palocci deixou essa ameaça no ar, afirmando que estava sendo criado um clima que inviabilizaria a permanência de ambos no cargo. Falou também que o presidente estava preocupado com a imagem da Receita.
Nos bastidores, porém, o ministro da Fazenda está fechado mesmo é com Rachid. Palocci convenceu Lula e Dirceu de que Leão, motivado por disputa de poder interna, resolveu atirar na cúpula da Receita e atingir Rachid.
Investigações
Em meados deste ano, a Corregedoria iniciou investigações sobre um auto de infração contra a construtora OAS. Rachid foi um dos auditores que passaram, em 1994, multa de R$ 1,1 bilhão à construtora, que depois caiu para R$ 25 milhões. A Corregedoria suspeita que possa ter havido irregularidade na autuação.
Desde fevereiro deste ano, o corregedor já abriu quatro inquéritos contra, direta ou indiretamente, altos funcionários ou ex-integrantes da cúpula da Receita.
No domingo passado, a Folha revelou gravações feitas pela Polícia Federal em que Rachid e seu secretário-adjunto Ricardo Pinheiro discutem como rebater as suspeitas levantadas por Leão. "Vamo pro pau, Rachid", disse Pinheiro, com o que o secretário concordou prontamente, apesar de até agora não ter feito nada.
Na semana passada, o corregedor disse à Folha que recebera informação de que denúncia contra ele havia sido "forjada" no gabinete de Rachid. O secretário negou o fato no mesmo dia.
A nota de ontem do ministério informou ainda que tanto o secretário quanto o corregedor "disseram estar contrariados com os referidos fatos" e que "expressaram sua disposição de superar a presente situação de dificuldade".