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Quarta, 12 de novembro de 2003
Folha de S.Paulo
CONTRA O RELÓGIO
Palocci acena com R$ 400 mi para agradar
governadores
Governo cede a Estados para acelerar
reformas no Senado
RAYMUNDO COSTA / DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo
cedeu à pressão dos governadores e já admite repassar
cerca de R$ 400 milhões aos Estados, em 2004, para investimentos
em obras de infra-estrutura no Norte, Nordeste, Centro-Oeste e áreas
de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Os Estados querem
dobrar essa quantia.
O recuo se
deve à necessidade de o governo destravar a tramitação
das reformas no Senado. Nas contas do Planalto, sem o apoio da oposição,
não há votos para aprovar a tributária, e a maioria
em torno da previdenciária é estreita. Os governadores consideraram
"positivo" o aceno, feito ontem de manhã pelo ministro
Antonio Palocci Filho (Fazenda).
Os nove governadores
do Nordeste haviam agendado uma audiência com o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Na véspera, foram informados pelo
Planalto de que a reunião seria com Palocci e o ministro José
Dirceu (Casa Civil) porque Lula acabara de chegar de viagem e tinha compromissos
para colocar em dia.
A mudança
irritou os governadores, até porque Dirceu ironizou o grupo durante
a reunião. O ministro disse que eles talvez devessem procurar o
PSDB e o PFL. Argumento: se a oposição tinha sido forte
o suficiente para mudar o FDR (Fundo de Desenvolvimento Regional) e "travar"
a tramitação das reformas, seria forte também para
aprovar suas reivindicações.
Dirceu referia-se
à mudança feita pelo relator Romero Jucá (PMDB-RR)
no texto aprovado pela Câmara. O projeto do governo previa a criação
de um fundo de R$ 2 bilhões para financiar projetos empresariais
nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e áreas do Rio,
Minas e Espírito Santo. Por pressão dos governadores, Jucá
determinou a criação de um fundo para investimentos, mas
que só começaria a repassar dinheiro a partir de 2005.
Reunidos na
semana passada em João Pessoa (PB), os governadores do Nordeste
decidiram que, sem o fundo, não apoiariam a unificação
da legislação do ICMS nem a redução de 44
para cinco do número de alíquotas. Ontem, Palocci cedeu.
Disse que havia disponibilidade no Orçamento de 2004 de "uns
R$ 400 milhões".
Técnicos
da Fazenda informaram mais tarde que se trata de R$ 360 milhões.
Os governadores Lúcio Alcântara (PSDB-CE) e Ronaldo Lessa
(PSB-AL) consideraram boa a proposta, mas a maioria acha o valor muito
pequeno para ser dividido por 23 Estados.
Apesar da
perspectiva de acordo, os itens que tratam do ICMS na reforma tributária
podem ficar para uma etapa posterior. Em outro encontro, que reuniu os
senadores e os oito governadores tucanos, o governador de São Paulo,
Geraldo Alckmin, defendeu que seja votado agora só o que for "estritamente
necessário". "O texto é que está constitucionalizando
a guerra fiscal. Nossa proposta é tirar do texto qualquer referência
à guerra fiscal", disse Alckmin.
No final da
tarde, os governadores do Nordeste, além de Aécio Neves
(PSDB-MG), tiveram uma reunião com o presidente do Senado, José
Sarney (PMDB-AP), que vai comandar as negociações para tentar
aprovar a tributária.
Sem acordo,
o Senado pode votar só a prorrogação da CPMF (o imposto
do cheque), a DRU (Desvinculação de Receitas da União),
a partilha da Cide (contribuição sobre combustíveis)
com os Estados e o fundo de compensação da desoneração
das exportações.
Ontem pela
manhã, José Dirceu não descartou uma convocação
extraordinária do Congresso para aprovar a reforma tributária
neste ano: "Vamos discutir. Até 15 de dezembro tem tempo.
Cada dia tem sua agonia. Quando chegar 10 de dezembro nós vamos
discutir isso". Dirceu disse que um eventual atraso na votação
não atrasará a reforma ministerial.
PSDB decide apoiar a emenda da Previdência
KENNEDY ALENCAR / DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Os oito governadores
e os 11 senadores do PSDB definiram ontem seu apoio à reforma da
Previdência em almoço em Brasília. Em relação
à reforma tributária, o PSDB deverá aprovar o núcleo
da proposta, insistindo antes na votação da proposta do
senador Tasso Jereissati (CE) apenas como forma de extrair concessões
para os governadores do partido.
Como a reforma
da Previdência interessa aos governadores, pelo efeito positivo
no caixa dos Estados, o PSDB decidiu ajudar o governo a aprovar a proposta
que tramita no Senado. Para aprová-la, o governo precisa do apoio
de 60% dos 81 senadores. "Todos os governadores e senadores chegaram
à conclusão de que devemos dar apoio à reforma da
Previdência e votar o texto aprovado pela Câmara", disse
Alckmin à Folha.
Numa avaliação
feita ontem por líderes dos partidos governistas, em almoço
na casa do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o governo
calculava ter apenas 47 votos no Senado garantidos a favor do texto-base
da reforma da Previdência e precisava conquistar pelo menos mais
dois votos para aprová-la no plenário.
Já
em relação à reforma tributária, Alckmin disse
que "cresce o sentimento de votar o estritamente necessário",
seja a emenda Tasso, o que ele defende, seja um acordo com o governo para
fatiar o texto que veio da Câmara. Na prática, o PSDB fará
política com a emenda Tasso. O partido sabe que não há
prazo para aprová-la neste ano, pois ela teria de tramitar na Câmara.
Logo, a estratégia é tentar extrair do governo federal concessões
para os Estados, já que não há consenso sobre reforma
tributária nem no próprio PSDB.
É por
isso que o partido deverá aprovar o "estritamente necessário"
ou "o miolo da picanha" da reforma, como diz o presidente.
O "miolo
da picanha" tem cinco itens: prorrogação da CPMF (Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira) e da DRU
(Desvinculação das Receitas da União) até
o fim de 2007; repasse aos Estados e municípios de 25% da receita
da Cide (contribuição sobre combustíveis); fundo
de R$ 8,5 bilhões por ano para compensar Estados e municípios
pelo fim da cobrança do ICMS sobre as exportações;
e incidência da Cofins sobre bens importados.
A reforma
tributária está emperrada. À noite, em reunião
no gabinete de Sarney, os governistas tentaram fazer um acordo com a oposição,
mas o PFL não concordou em suspender prazos regimentais e, pelo
cronograma previsto, o segundo turno só ocorrerá por volta
de 27 de dezembro.

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