Quinta-feira, 04 de dezembro de 2003

Folha de S.Paulo

PEC paralela emperra outra vez no Senado
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

         O governo e a oposição não conseguiram fechar ontem um acordo para acelerar a tramitação da chamada PEC paralela da reforma da Previdência no Senado e votá-la até a próxima quarta-feira. O PFL e o senador Paulo Paim (PT-RS) chegaram a acusar o Palácio do Planalto de ter rompido entendimento firmado na noite anterior.
         A Proposta de Emenda Constitucional paralela tramita na Casa junto ao projeto original de reforma da Previdência, para abrigar as mudanças negociadas em relação ao texto original. O objetivo é acelerar a promulgação, já que a PEC paralela voltará para a Câmara.
         O líder do PFL, senador José Agripino (RN), e Paim chegaram a anunciar a conclusão da negociação ao saírem da reunião de líderes, realizada ontem de manhã no gabinete do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). A imprensa chegou a ser convidada a entrar e registrar a assinatura do acordo. Vinte minutos depois, os jornalistas tiveram de se retirar.
         Paim e Agripino não sabiam das condições do governo para incluir na PEC paralela a regra de transição para os atuais servidores. Segundo Paim, o ministro Ricardo Berzoini (Previdência) teria aceito na noite anterior a proposta de transição feita por ele: "Ficou pior do que o texto que veio da Câmara".

Consumidor vai pagar pelo reajuste da Cofins
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

         O aumento de custos que setores como os de alimentos e de construção civil terão com a elevação da alíquota da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) em 2004 deverá ser repassado para o consumidor, caso não sejam feitas alterações na proposta do governo.
         Segundo a medida provisória nº 135, a partir de 1º de fevereiro de 2004 a alíquota da Cofins sobe de 3% para 7,6% sobre o faturamento das empresas. A cobrança deixa de ser cumulativa.
         "A gente já vem de um ano difícil, de desemprego elevado, de carga [tributária] alta, e se você ainda aumenta os impostos e a empresa não pode absorver, isso vai para o consumidor", disse o presidente da Nestlé, Ivan Zurita. Segundo ele, o aumento do custo com a alta da Cofins para o setor de alimentos é de cerca de 3,5%.
         O presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), Paulo Safady Simão, disse que o custo dos produtos finais da construção aumentará 2,3%.
         Ele também destacou problemas que a MP nº 135, que está em discussão na Câmara dos Deputados, gera em relação a contratos em andamento.
         "Para imóveis já vendidos, os recebíveis [valores a serem recebidos] a partir de fevereiro serão taxados sem nenhuma possibilidade de crédito. Isso é um rompimento, é uma mudança em cima de um contrato já assinado", disse Simão.
         Zurita e Simão saíram insatisfeitos ontem de encontro que reuniu cerca de 20 empresários, alguns deles membros do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, com o secretário da Receita, Jorge Rachid, e o secretario-executivo-adjunto do Ministério da Fazenda, Arno Augustin.
         Para Zurita, "a conclusão da reunião não foi nada animadora porque não se decidiu nada e o que se falou já era conhecido". O presidente da CBIC também deu sinais de descontentamento: "Não houve perspectiva de mudança de nada".
         Cada empresário apresentou o impacto da MP sobre seu setor. Além de construção civil e alimentos, estavam representados os setores automotivo, gráfico, de informática, têxtil, financeiro, de consórcios e de micro e pequenas empresas, entre outros. Uma nova reunião dos empresários com o governo deve acontecer amanhã ou na próxima segunda-feira.

 

TRIBUTOS: Fisco diz que média mensal de imposto arrecadado foi de R$ 157 milhões; para fabricantes, foi de R$ 220 milhões

Arrecadação de IPI tem dados conflitantes
JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

         O incentivo fiscal concedido às fabricantes de automóveis custou à Receita Federal uma queda de arrecadação de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) maior do que a alegada pelas próprias montadoras em documento entregue ao governo para convencê-lo a prorrogar a medida.
         De agosto a outubro, os três primeiros meses do incentivo, foram vendidos 366,5 mil carros, contra 396,7 mil veículos comercializados no mesmo período do ano passado (queda de 7,61%).
         Nesses três meses, a arrecadação (acumulada) do IPI ficou em R$ 471 milhões, 24% a menos que os R$ 619 milhões obtidos no mesmo período em 2002.
         No estudo apresentado ao governo, as montadoras afirmam que, entre agosto e outubro, a média mensal de arrecadação do IPI foi de R$ 220 milhões. Mas, pelos relatórios da Receita, essa média não supera R$ 157 milhões.
         Ainda de acordo com a Anfavea, a arrecadação média teria caído 11% no período em relação a julho. A queda foi maior. Isso porque em julho, quando foram comercializadas 113,7 mil unidades, o IPI rendeu ao governo R$ 187 milhões.          Assim, percebe-se que a média de R$ 157 milhões para os três meses seguintes foi 16% menor que o arrecadado em julho.
         Julho fora tomado por referência, segundo as montadoras, por ser imediatamente anterior à concessão do incentivo -mas não leva em conta efeitos como a sazonalidade. A diminuição da alíquota do IPI foi um pedido das montadoras para estimular as vendas.
         Por decisão do Ministério da Fazenda, a partir de 6 de agosto houve redução de até três pontos no tributo. O incentivo vigoraria até domingo passado. Mas, depois de semanas negando a possibilidade, o governo decidiu estender o incentivo até 28 de fevereiro. Em contrapartida, as montadoras não aumentarão os preços em dezembro e manterão o nível de emprego por três meses.
         A queda do IPI permitiu uma recuperação nas vendas nos últimos meses: em agosto (primeiro mês de vigência) foram comercializados 100,8 mil veículos. Em setembro, 125 mil, e, em outubro, 140,7 mil veículos -esse, aliás, foi o melhor mês desde maio de 2001. Em novembro, foram 130,39 mil unidades (incluídos ônibus e caminhões). A média diária de vendas também evoluiu, de 4.802, em agosto, para 6.125 em outubro.
         A arrecadação do IPI, com a perda dos três pontos percentuais, seguiu caminho oposto: de R$ 187 milhões, em julho (antes do incentivo fiscal e com vendas internas de 113 mil veículos), para R$ 147 milhões em outubro.
         Para contrapor a esperada queda do IPI, as montadoras argumentam o seguinte, no documento enviado ao governo: se somado IPI e outros tributos (leia-se PIS/ Confins) recolhidos pelo setor, a arrecadação sobe. O PIS e a Cofins são tributos que incidem sobre o faturamento das empresas.
         Segundo as montadoras, somados, os três impostos passaram de uma média mensal de R$ 440 milhões no período ""pré-alíquota menor" para R$ 500 milhões entre agosto e outubro.
         No relatório mensal divulgado pela Receita, a arrecadação de Confins aparece em uma única rúbrica. Ou seja, não são discriminados os valores arrecadados por diferentes setores da economia. A Folha contatou a Receita sobre a possibilidade de ter discriminados os valores do setor. Não recebeu resposta até o fechamento desta edição. Tampouco as montadoras divulgaram os números.

Decisão sobre IR "custará" R$ 1,83 bi
MARCOS CÉZARI
DA REPORTAGEM LOCAL

         Os contribuintes pessoas físicas pagarão mais R$ 1,83 bilhão à Receita Federal no próximo ano por conta da prorrogação da alíquota de 27,5% do Imposto de Renda, decidida na terça-feira à noite pela Câmara dos Deputados.
         O valor foi estimado ontem pelo advogado Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), com base na evolução da receita do IR nos últimos anos.
         Os 27,5% atingem os trabalhadores com ganhos acima de R$ 2.115 por mês. Como estava prevista a redução da alíquota para 25% a partir de janeiro, aqueles contribuintes pagarão mais 10% de imposto sobre a parcela da renda acima de R$ 2.115.
         A Receita Federal admite que perderia R$ 1,7 bilhão de arrecadação em 2004 sem a prorrogação dos 27,5%. Pelos cálculos de Amaral, os contribuintes entregarão valor maior ao fisco.
         Para a tributarista Elisabeth Libertuci, do escritório Libertuci Advogados, a decisão do governo, de não reajustar a tabela de desconto na fonte e de prorrogar por mais dois anos os 27,5%, provoca dupla perda aos contribuintes.
         Primeiro, porque muitos que estão isentos podem, com o decorrer do tempo, passar a pagar imposto devido a reajustes salariais. Segundo, os que ganham mais acabam tendo uma parcela do salário tributada em mais 10%.
         A somatória desses dois fatores poderá levar os contribuintes a pagar mais de R$ 3 bilhões a mais ao fisco somente no próximo ano. "Mais uma vez a classe média brasileira é chamada para pagar a conta", afirma a tributarista.

         Oito anos de vida
         Prevista ao final de 1997 para vigorar por apenas dois anos (durante o biênio 1998/99), a alíquota de 27,5% está completando seis anos de vida neste mês. Completará oito ao final de 2005.
         Depois de conviver por vários anos com diversas alíquotas (na década de 80 as tabelas de desconto na fonte chegaram a ter até dez alíquotas), a Receita havia decidido, ao final de 1995, fixar apenas duas: 15% e 25%.
         Assim, desde 1996 essa regra é mantida. Só que a alíquota máxima de 25% vigorou por apenas dois anos: 1996 e 1997. Em 1998 ocorreu o primeiro aumento para 27,5% -os 25% mais 10%. Inicialmente, os 27,5% deveriam vigorar no biênio 1998/99.
         O governo FHC, entretanto, conseguiu prorrogar os 27,5% para o triênio 2000 a 2002. No final do ano passado, nova prorrogação, com vigência para o primeiro ano do governo Lula.
         Agora, nova prorrogação por mais dois anos. No total, os contribuintes conviverão com os 27,5% por pelo menos oito anos.
         Mas o governo não tem usado apenas desse expediente para obter mais receita. A não-correção da tabela -cujo efeito é mais prejudicial ainda aos contribuintes, pois faz com que parte dos isentos passe a pagar imposto- é outra arma muito utilizada.
         A tabela ficou congelada por seis anos -de 1996 a 2001. No final de 2001 houve a correção de 17,5%, com o limite de isenção subindo de R$ 900 para R$ 1.058 a partir de janeiro de 2002.