Sábado, 20 de dezembro de 2003

Folha de S.Paulo

REFORMAS

Cerimônia foi comandada por presidentes das Casas, sem presença de Lula; Sarney é rápido, e João Paulo improvisa

Congresso promulga tributária e Previdência
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Sem a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e em meio à crise entre Câmara e Senado devido à esperada convocação extraordinária em janeiro, o Congresso promulgou ontem a reforma da Previdência, que ainda terá mudanças, e a primeira etapa da reforma tributária.

A cerimônia foi comandada pelos presidentes do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). Lula, que no início da semana anunciou a intenção de comparecer à cerimônia, desistiu em razão do mal-estar gerado no Congresso, que preferia um evento discreto.

Diferentemente de Sarney, que fez um discurso rápido e solene, João Paulo surpreendeu com um pronunciamento longo, de improviso, em tom de prestação de contas e afirmação do Legislativo.

"Houve a marca do Senado e da Câmara na melhoria das condições do nosso povo. Se nós repararmos bem, o risco Brasil não caiu por uma obra divina. Todos os passos dados pela Câmara e pelo Senado tinham correlação imediata com a avaliação do risco Brasil." João Paulo afirmou que o Congresso garante instrumentos "para que possamos em 2004 comemorar não somente números e cifras, mas que a gente possa ver parte do povo tendo seu emprego e as condições de vida da nossa população sendo melhoradas".

O deputado apontou "contribuições" dadas pelo Legislativo nas áreas econômica e social, como a aprovação dos projetos que tratam da regulamentação do sistema financeiro, da nova Lei de Falências, do Estatuto do Desarmamento e do Idoso, de preservação da mata atlântica -este ainda pendente de votação no Senado- e de combate à violência.

Em seu discurso, Sarney disse que o Congresso teve relação de "absoluto equilíbrio" com os demais Poderes e "não faltou ao país". Atribuiu à "coragem" do presidente Lula a promulgação.

Em razão do conflito entre as duas Casas por causa da posição de João Paulo contrária à convocação extraordinária -definida por ele como um "escândalo"-, o senador Demóstenes Torres (PFL-GO) aproveitou para criticar o discurso do deputado.

"Escândalo é o desempenho que ele [João Paulo] teve hoje pela manhã na reunião conjunta do Congresso, quando fez uma espécie de "por que me ufano deste país", elogiando um governo que, na realidade, não está tão bom assim das pernas", disse.

Criticou o fato de João Paulo ter citado a aprovação de projetos que amenizariam a criminalidade. "Uma verdadeira vergonha de quem é, na realidade, partidário do "queridismo penal" e que, por conta de uma lei alterada na Câmara, vai soltar 40 mil presos no Natal, perigosos, com condenação acima de oito anos", disse.

Próximos passos
Aprovadas com votos da oposição nas duas Casas, ambas as reformas estão incompletas.
A maior parte da tributária foi alterada e será submetida novamente à Câmara. A previdenciária já está em processo de alteração na proposta de emenda constitucional chamada de PEC paralela, aprovada no Senado.
As reformas serão publicadas no "Diário do Legislativo" só em 31 dezembro, para que vigorem a partir de 1º de janeiro de 2004.

O PDT entrou no STF (Supremo Tribunal Federal) com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a cobrança da contribuição previdenciária dos servidores inativos e a redução em 30% na pensão das viúvas, instituídas pela emenda constitucional da reforma da Previdência.

Berzoini defende PEC sem mudança
JULIANNA SOFIA
RAYMUNDO COSTA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, declarou ontem que o acordo feito pelo governo no Senado para garantir a aprovação da chamada "PEC paralela" da reforma da Previdência não deverá ser mantido caso a Câmara altere o texto aprovado pelos senadores.

Nas suas contas, a "PEC paralela" reduz em R$ 6 bilhões a economia de R$ 47,2 bilhões estimada pelo governo com a reforma da Previdência nos próximos 20 anos. A emenda foi criada pelos senadores como uma proposta alternativa ao texto principal da reforma para atenuar pontos importantes, como a paridade e as regras de transição para aposentadoria do funcionalismo.

"É um direito regimental da Câmara, mas o ideal é que não haja mudanças. No acordo político feito no Senado, o governo se responsabiliza com o texto que foi produzido no Senado", disse Berzoini, dando claros sinais de que o Executivo não deve aceitar mudanças que comprometam ainda mais os resultados da reforma.

O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), já avisou, no entanto, que a "PEC paralela" será modificada. Segundo João Paulo, a Câmara criará uma comissão especial para analisar a proposta, que vai receber emendas dos deputados.

O texto principal da reforma da Previdência foi aprovado no Senado diante da garantia do governo de que a "PEC paralela" não será engavetada. Para assegurar celeridade na votação da proposta alternativa, os líderes no Senado pressionaram o governo a convocar extraordinariamente o Congresso para trabalhar em janeiro.

Berzoini destacou que a "PEC paralela" beneficia os servidores públicos federais e, por esse motivo, quanto mais rápido for aprovada, melhor para o funcionalismo. "A proposta tem o apoio do governo. Mas, com o intuito de ajudar, a Câmara pode atrapalhar", afirmou o ministro.

Ele alertou que, em alguns casos, os servidores que estão próximos da aposentadoria devem esperar pela aprovação da "PEC paralela" para se aposentarem em condições mais favoráveis.

Pelas regras de transição da proposta alternativa, o servidor pode se aposentar antes de atingir a idade mínima de 55/60 anos (mulher/homem), sem redução no valor do benefício, desde que tenha mais tempo de contribuição de que o limite mínimo de 30/35 anos (mulher/homem).

O ministro acrescentou que o governo ainda estuda os mecanismos que serão usados pelo Executivo para regulamentar a reforma da Previdência, promulgada ontem, mas que só deve começar a valer em 31 de dezembro.