Segunda-feira, 22 de dezembro de 2003

Folha de S.Paulo

PENTE FINO

Contribuintes têm gasto no cartão incompatível com a renda; 10 mil são suspeitos de omitir informações sobre imóveis

Receita vai apertar o cerco a sonegadores
SÍLVIA MUGNATTO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

No início de 2004, a Receita Federal pretende intimar vários contribuintes por omitirem informações sobre a compra de imóveis e o recebimento de aluguéis, além daqueles que movimentaram valores incompatíveis com suas rendas no cartão de crédito. No primeiro caso, cerca de 10 mil contribuintes estão sob suspeita.

O secretário-adjunto da Receita, Paulo Ricardo Cardoso, disse que os dados preliminares sobre a movimentação com cartões de crédito -que a Receita recebeu em outubro- mostram que algumas pessoas que se declaram isentas de Imposto de Renda movimentaram mais de R$ 50 mil por mês até junho deste ano.

De acordo com Marcelo Fisch, coordenador de Fiscalização da Receita, houve quem movimentasse R$ 300 mil por mês no cartão de crédito.

As estimativas da Receita, antes da entrega das informações, apontavam para uma movimentação geral de R$ 200 bilhões por ano de 40 milhões de cartões. O gasto médio mensal por pessoa seria de R$ 450.

Em 2003, a Receita criou uma declaração anual para informações imobiliárias e estipulou que semestralmente as administradoras de cartão de crédito terão de enviar dados sobre as compras mensais acima de R$ 5.000.

No caso das informações sobre imóveis, as primeiras são de 2002, as intimações serão feitas para esclarecer por que alguns contribuintes declaram não ter renda, mas possuem vários imóveis.

"Encontramos um contribuinte com 32 imóveis em São Paulo. Na declaração dele não aparece nenhum rendimento de aluguel, embora as administradoras de imóveis declarem ter recebido comissão", contou Cardoso.

Fisch disse que foram entregues 20 mil declarações de empresas sobre imóveis. Mas em São Paulo cerca de mil empresas que tiveram faturamento em 2002 não apresentaram a declaração.

Essas empresas também terão que se explicar. Cardoso disse que a declaração de imóveis é necessária porque a Receita já possui dados dos cartórios. "Mas algumas pessoas demoram cinco anos para registrar uma operação."

Em cinco anos termina o prazo da Receita para autuação.

Sobre as operações com cartão de crédito, Cardoso disse que, como aconteceu com os dados da CPMF, as movimentações de grandes valores devem estar sendo feitas por "laranjas" (pessoas que voluntariamente ou não agem por outras pessoas).

A Receita continuará atuando sobre profissionais liberais, diretores de empresas e pessoas que remetem dinheiro para o exterior por meio das contas de não-residentes. "Não é para deixar as pessoas em estado de tensão, mas queremos identificar a capacidade contributiva de cada um", disse Cardoso.

No caso dos profissionais liberais, o problema está em variações patrimoniais expressivas sem a declaração de rendimentos correspondente.

Cardoso explicou que alguns profissionais, como dentistas e médicos, abatem gastos com leasing (aluguel) de automóveis, alegando que o carro é essencial para o trabalho. "Se fosse assim, qualquer pessoa poderia fazer a dedução, mas não pode", disse.

PENTE FINO

Total é 50% maior do que o do mesmo período do ano passado; 530 mil contribuintes ficam na malha fina

Autuações da Receita já atingem R$ 39 bi
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em 2003, até o mês de novembro, o valor das autuações da Receita Federal cresceu 50,3% em relação ao mesmo período do ano passado. O comércio lidera o ranking das empresas, e os profissionais liberais e autônomos, o das pessoas físicas.

No ano passado, até novembro, foram cobrados R$ 25,851 bilhões entre tributos e multas. Neste ano, no mesmo período, foram cobrados R$ 38,856 bilhões. De acordo com o secretário-adjunto da Receita Federal, Paulo Ricardo Cardoso, não existe um tributo específico que esteja sendo sonegado pelo comércio. "Tem de tudo."

Mas o secretário diz que o setor financeiro (bancos e fundos de pensão) continua devendo mais em termos proporcionais. Enquanto a média das dívidas do comércio é de R$ 3 milhões, a do setor financeiro é de R$ 15 milhões.

Segundo Cardoso, permanece o problema de que várias instituições financeiras não estão recolhendo direito a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira).

"Eles argumentam que não devem recolher em determinadas operações", disse.

Imposto de Renda
Neste ano, segundo a Receita, 530 mil contribuintes foram parar na malha fina do IR (Imposto de Renda), mas nem todas as pessoas cujas declarações não foram automaticamente aprovadas pelo sistema da Receita serão notificadas para prestar esclarecimentos.

Em muitos casos, eventuais erros ou problemas são corrigidos pelo próprio fisco sem ser preciso intimar o contribuinte. As declarações que forem corrigidas internamente pela Receita serão em seguida liberadas. Caso haja restituição de imposto, o contribuinte receberá o imposto pago em excesso nos lotes residuais, ao longo do próximo ano.

O contribuinte que cai na malha fina precisa aguardar uma notificação da Receita Federal para poder esclarecer as dúvidas do fisco. Não adianta comparecer em um órgão da Receita antes de ser convocado. Após a intimação, é preciso comparecer no local e no prazo estabelecido com os documentos necessários para comprovar os dados da declaração.