sexta-feira, 21 de junho de 2003
Jornal do Brasil
Judiciário apresenta a conta
Governo tem pendências de R$ 3 bilhões nos
tribunais superiores
Ana Maria Tahan e Hugo Marques
BRASÍLIA - Esta será uma semana decisiva para o embate
entre o Planalto, os parlamentares aliados do governo e o Judiciário.
O ministro da Casa Civil, José Dirceu, em conversas com os líderes
do PT na Câmara, Nelson Pellegrino (BA), e o vice-líder do
governo, Professor Luizinho (PT-SP), repicou o aviso: as mudanças
na reforma da Previdência chegaram ao limite. Nada mais há
a ceder.
Apesar do recado de Dirceu, cresce o inconformismo com a intervenção
do governo num acordo que fora fechado entre os aliados e o Judiciário,
com o apoio do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP),
e o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini. Um acordo no qual
pesou muito uma conta levada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal,
ministro Maurício Corrêa. Ele mostrou aos parlamentares que
o governo tem pendências judiciais nos tribunais superiores equivalentes
hoje a R$ 3 bilhões. Pendências que serão julgadas
até o fim do ano. Não fez ameaças, mas todos entenderam
que, se o Judiciário se sentir prejudicado na reforma, o Planalto
terá de fazer caixa para acertar altos acordos na Justiça.
- Nunca falei sobre isso e nunca conversaram sobre isso comigo - afirmou
Corrêa ontem.
O governo não passa recibo sobre a conta, confirmada ao Jornal
do Brasil por dois participantes da reunião na casa do presidente
da Câmara. O fato é que este foi um fim de semana de conchavos
em Brasília. Ao contrário de outros, quando deputados embarcam
de volta aos Estados na quinta-feira, os principais articuladores do PT
não saíram da capital federal. Discutiram formas para conter
a revolta dos aliados e de parlamentares do próprio partido antes
de quarta-feira, data em que o relatório será discutido
na Comissão Especial.
Líderes da coalização de apoio ao Planalto, contudo,
se articulam para atender a principal reivindicação dos
juízes: elevar o subteto dos desembargadores estaduais novamente
para 90,25% do salário de ministros do Supremo Tribunal Federal.
No relatório da reforma, o subteto foi estabelecido em 75%.
Apesar de o percentual do subteto ser uma reivindicação
dos governadores - sai dos orçamentos estaduais a verba para o
Judiciário local e os maiores salários do setor são
pagos aos desembargadores, os membros dos Tribunais de Justiça
dos Estados -, os deputados não querem arcar com a responsabilidade
de votar contra a vontade de juízes.
- O governo deveria ter respeitado o acordo. Mudou por pressão
dos governadores - afirma um dos vice-líderes, Beto Albuquerque
(PSB-RS).
Albuquerque vai sugerir a ''estadualização'' do subteto.
Pela fórmula, a Câmara impõe o limite máximo
de 90,25% dos salários no Judiciário e os Estados negociam
com os tribunais locais percentuais diferenciados. Os governadores, contudo,
não querem arcar com a responsabilidade e, menos ainda, as Assembléias
Legislativas. Os governadores têm contas a pagar penduradas na Justiça.
São centenas de ações de pagamento de precatórios,
as dívidas judiciais. Deputados estaduais e partidos não
querem enfrentar desembargadores que, por tabela, também presidem
os Tribunais Regionais Eleitorais e julgam causas de campanhas.
Corrêa cobra o
acerto
Adriano Machado/BG Press
BRASÍLIA - O Judiciário não vai se entregar sem
luta. Os juízes articulam uma greve a partir de hoje, organizada
pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). O presidente
do STF, ministro Maurício Corrêa, alerta ser importante restabelecer
os 90,25% acertados anteriormente para o subteto. Manter a referência
de 75% para os salários de desembargadores e juízes, alerta
Corrêa, provoca ''quebra de hierarquia''.
- É incompreensível que um desembargador do Estado venha
a ganhar menos que um juiz substituto da Justiça Federal. A Justiça
não pode aceitar isso - avisa o presidente do STF.
O líder do PT na Câmara, Nelson Pellegrino (BA), defende
o acerto fechado com o governo, mas não cerra a porta para uma
nova negociação com o Judiciário.
- O diálogo tem que ser retomado. A partir de terça-feira
vou manter contato com entidades do Ministério Público e
da Magistratura - informa Pellegrino.
A palavra de ordem, segundo Pellegrino, agora é ''negociação''.
Com cautela, baixou o tom da semana passada, na qual o vice-líder
do governo, Professor Luizinho, acusou o Judiciário de chantagear
o governo.
No time do Planalto, o vice-líder anda na contramão dos
líderes aliados e até de Pellegrino, o comandante da bancada.
Afirma que o governo tem número mais do que suficiente para aprovar
a reforma da Previdência em plenário, onde serão necessários
308 votos.
Professor Luizinho garante que as reivindicações dos parlamentares
foram atendidas. Entre os itens, cita a aposentadoria integral e a equivalência
salarial entre ativos e inativos.
- Temos a maioria tranqüila para aprovar a reforma, na Comissão
Especial e no plenário - assegura Professor Luizinho.
Greve por alto salário
BRASÍLIA - Ministros do Supremo Tribunal Federal têm salário
de R$ 17,4 mil. Se aprovada a emenda constitucional com o subteto de 75%,
os desembargadores dos Tribunais de Justiça poderiam ganhar no
máximo R$ 13 mil. Com o subteto de 90,25%, o salário de
um desembargador atingiria no máximo R$ 15,7 mil. Muitos ganham
bem acima disso, até mais do que um ministro do Supremo. O salário
dos desembargadores varia de Estado para Estado. Há quem receba
até R$ 30 mil por mês.
O presidente do STF, ministro Maurício Corrêa, não
comenta tais disparidades. E evita o confronto antecipado com o Planalto
ou o Congresso. O tom conciliador adotado no fim de semana por alguns
líderes do governo já rendeu uma pequena vitória.
O presidente do STF criticou ontem a eventual paralisação
articulada pela Associação Brasileira dos Magistrados.
- Sou terminantemente contra a greve. Espero que reflitam melhor e aguardem
a votação da proposta na Comissão Especial. A partida
está começando agora - afirma Corrêa.
Ele evita tecer comentários sobre eventuais inconstitucionalidades
de dispositivos da reforma da Previdência, como a taxação
de inativos. Para Corrêa, emitir qualquer juízo de valor
agora seria um ''pré-julgamento''.
- Depois, eu não teria condições de julgar, eu me
sentiria impedido para analisar o caso no STF - diz Corrêa.

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