quinta-feira, 07 de agosto de 2003
Jornal do Brasil
Vandalismo no Congresso
Em protesto contra a reforma, 50 mil servidores vão
à capital. Manifestantes tentam invadir a Câmara e quebram
52 vidraças
Paulo de Tarso Lyra
BRASÍLIA - O Congresso viveu ontem quase uma hora
de pânico, pressão e violência. Um grupo de servidores,
participantes da marcha contra a reforma da Previdência, tentou
invadir o Legislativo para protestar contra a aprovação
do relatório do deputado José Pimentel (PT-CE), na madrugada
de quarta-feira. Impedidos pelos seguranças e alheios aos pedidos
de calma do comando de greve, o grupo começou a atirar paus, pedras
e até tampas de bueiro nos vidros do Congresso.
Manifestantes chutavam as vidraças e saíam
correndo, com as pernas sangrando. Saldo final do confronto: 52 vidraças
quebradas, 11 feridos, entre eles Adriano Gomes da Silva, funcionário
dos Correios de Garulhos, e um prejuízo estimado em R$ 20 mil.
A marcha reuniu ontem em Brasília cerca de 50 mil servidores.
Os presidentes da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e do
Senado, José Sarney (PMDB-MA), condenaram a atitude dos invasores.
Sarney lembrou que o Congresso foi vitimado, no passado, pela violência
institucional, mas não pode ficar sujeito à insensatez.
- Sem Congresso, não há democracia. Sem democracia, não
há liberdade. Sem liberdade, o cidadão simplesmente não
existe e as instituições desmoronam - ressaltou o presidente
do Parlamento.
Antes do início da ordem do dia, João Paulo Cunha (PT-SP)
disse que a tentativa de invasão do Congresso é um ''crime,
ato intolerável e antidemocrático''. Ele se definiu como
um ''guardião do democrático direito de manifestar-se, desde
que as manifestações não cerceiem a democracia''.
- Esse Poder não se calou diante das baionetas nem das ditaduras.
Esse Poder não se calará ante as minorias, muitas vezes
histéricas e descontroladas, que nos jogam pedras à guisa
de sensatez e de argumentos - afirmou.
Em nota oficial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva condenou
a tentativa de invasão e as depredações no Congresso.
Para Lula, o ato é ''irresponsável'' e foi cometido por
vândalos.
A confusão começou por volta das 13h, quando um grupo de
manifestantes decidiu ocupar a cúpula superior do Congresso. A
Polícia Militar, criticada há duas semanas por reprimir
servidores no interior da Câmara, não impediu a ação.
Um grupo de PMs tentou bloquear a passagem até a rampa que dá
acesso ao Salão Negro, mas não conseguiu conter os manifestantes,
que avançaram em direção à entrada envidraçada
do Congresso.
O funcionário dos Correios de Garulhos Adriano Gomes da Silva,
23 anos, foi detido pelos seguranças da Câmara e levado ao
departamento médico da Casa com ferimento no dedo indicador da
mão direita. A intervenção de alguns parlamentares,
como a senadora Heloísa Helena (PT-AL) e o deputado João
Fontes (PT-SE), impediu a prisão do manifestante. Ele será
responsabilizado criminalmente pelos danos causados. Adriano se diz inocente.
- Me empurraram em cima dos vidros. Caí em cima deles, me cortei
e quiseram me algemar. Não fiz nada - jurou.
Franciele Gazolla afirmou que a manifestação tinha como
objetivo protestar contra a antecipação da votação
do relatório da Previdência. De acordo com ela, o grupo tentou
entrar no Congresso porque ''não estava sendo ouvido''.
A Central dos Servidores Públicos condenou a ação
e afirmou que ''só a negociação e manifestações
pacíficas poderão gerar resultados''.
Os emergentes da reforma
PSTU tem planos para crescer
Gilberto de Souza
O Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado está em festa.
Apesar da derrota para o governo, no Congresso, comemora o espetáculo
do próprio crescimento. Para o presidente do PSTU, o quadro é
tão animador que já lança as bases de uma nova legenda.
José Maria estava que era só alegria, ontem, após
a marcha dos funcionários públicos sobre Brasília.
As bandeiras vermelhas, com o logo em amarelo, tremulavam por toda parte
e o discurso dos militantes - que prega o rompimento unilateral com o
FMI, a reforma agrária e urbana imediata e a moratória da
dívida externa - soava feito música aos ouvidos do ex-candidato
à Presidência da República. Chegou entre os últimos
colocados, mas a experiência valeu. ''Lançamos as bases de
um novo partido socialista no Brasil, que vai reunir os milhares e milhares
de militantes descontentes do PT'', previu. O próprio Zé
Maria é dissidente petista. Como ele afirmou, não há
pressa alguma para formar a nova legenda, pois já sabe que não
vai concorrer às eleições municipais. Tanto a pretensão
quanto o fôlego são mais longos. A senadora Heloisa Helena
e os deputados Luciana Genro e Babá - trio que lidera os radicais
do PT - têm lugar reservado no grupo, ainda sem nome definido. Mas
a cor da bandeira já está dada: será vermelha.
Greve será intensificada
Servidores planejam novas marchas
Olívia Vicente
Especial para o JB
Servidores públicos federais em greve desde o último dia
8 planejam intensificar o movimento, após a reforma da Previdência
aprovada em primeiro turno pela Câmara. Entre as principais reivindicações
dos trabalhadores estão novas regras de transição,
o fim da taxação de inativos de baixa renda e a elevação
do teto de aposentadoria para R$ 4,8 mil.
- Agora é que está começando nossa luta - disse
o secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT),
João Antônio Felício.
Felício frisa que nem tudo na reforma incomoda os servidores,
mas defende a alteração de vários pontos.
Para o presidente da CUT, Luiz Marinho, o novo sistema previdenciário
não beneficia os trabalhadores de baixa renda.
- Desagrada muito o fato de o governo não ter buscado uma composição
com o baixo poder aquisitivo dos trabalhadores - disse ele.
A CUT planeja uma manifestação contra a reforma no Senado
no próximo dia 19, com professores à frente. Tentará
uma audiência com a presidência da casa e abrir mais diálogo
sobre a pro- posta.
O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino
Superior (Andes) informou que diversas manifestações estão
sendo organizadas ainda este mês para pressionar o governo.
- Além de uma outra marcha a Brasília, prevista para este
mês, caravanas deverão seguir do interior para as capitais
de cada Estado - antecipou o vice-presidente da entidade, professor José
Domingues Godói Filho.
Godói acredita que este é o momento ideal para fortalecer
a greve, que praticamente paralisou postos do INSS em todo o país,
prejudicou importações e exportações e vários
outros serviços públicos.
- Não é só o futuro da Previdência que está
em jogo, mas o próprio conceito de Estado, que está se fragilizando
ante a autoridade do governo.
No Rio, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal
(Unafisco) fará amanhã uma assembléia para decidir
os rumos da greve, que deverá permanecer por tempo indeterminado,
segundo a diretora da delegacia sindical do Rio de Janeiro, Cátia
Bezerra.
Tributária fica
em compasso de espera
Discussão sobre impostos divide União, Estados e municípios
BRASÍLIA E SÃO PAULO - O presidente da Comissão
Especial que analisa a Reforma Tributária na Câmara, deputado
Mussa Demes (PFL-PI), entrou com requerimento pedindo a prorrogação
das discussões por mais 20 sessões. Mas a intenção
dos parlamentares da base aliada do governo é encerrar o debate
na próxima semana, com a entrega do relatório final. Estavam
previstas 40 sessões e o prazo oficial termina amanhã.
- Estou dando o tempo necessário para o relator resolver tudo.
Ele pode apresentar antes e encerrar a discussão, mas não
deve ser fácil, porque a briga pela CPMF (Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira) e pela
Desvinculação de Recursos da União é maior
- explicou o deputado. - Tudo pode mudar.
O governo pretende pôr um ponto final nas negociações
após a reunião entre o presidente Lula e os governadores,
marcada para amanhã. De acordo com o vice-líder do governo
na casa, deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), o objetivo é evitar
as discussões polêmicas em torno de pontos como a partilha
da Contribuição sobre Intervenção de Domínio
Econômico (Cide), o ''imposto'' dos combustíveis, e da CPMF,
apresentando o relatório mesmo que não haja consenso.
- O que temos é de encerrar as negociações com ou
sem entendimento. Não podemos mais ficar esperando para tentar
negociar o inegociável, como a CPMF. Neste momento não dá
pra repartir - disse.
Enquanto todas as atenções estão voltadas para a
Reforma da Previdência, o relator da proposta tributária,
deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), está concentrado
com sua equipe técnica acertando os detalhes para adiantar a entrega
do relatório, prevista para terça-feira.
Segundo Beto Albuquerque, as recentes queixas dos prefeitos sobre queda
no repasse de verba do governo federal têm justificativas. Muitas
administrações são prejudicadas pela má distribuição
dos recursos.
- Os prefeitos têm razão em fazer os protestos. Há
muito tempo eles arcam com o ônus, mas não levam todo o bônus.
Mas esse é um problema que não é de hoje. Se agravou
no governo passado - argumenta.
O deputado prevê uma melhor repartição no futuro.
- No momento em que pudermos fazer uma repartição maior
de recursos, o que não é possível neste momento por
causa do ajuste fiscal, seguramente nós faremos. Ainda mais com
os municípios, onde a vida realmente acontece - garantiu ele.
Cerca de 20 associações estaduais de municípios
aprovaram ontem a realização de uma marcha no dia 10 de
setembro, em Brasília, para pressionar o governo federal e o Congresso
por uma maior participação na divisão do bolo tributário.
Os prefeitos reivindicam uma fatia de 20% na arrecadação
total da União, segundo o presidente da Confederação
Nacional de Municípios, Paulo Ziulkoski (PMDB), prefeito de Mariana
Pimentel (RS). Hoje, os municípios ficam com 13,8% do total arrecadado.
A confederação tem cerca de 2 mil prefeituras filiadas
em todo o país e lidera a mobilização dos prefeitos,
que envolve também lideranças comunitárias.
Agências Brasil e Folha

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