terça-feira, 12 de agosto de 2003

Jornal do Brasil

Câmara corre para destrancar votações hoje
Meta é concluir 1º turno da reforma

PAULO DE TARSO LYRA

BRASÍLIA - O governo acelerou o ritmo para tentar concluir, ainda hoje, a votação da reforma da Previdência em primeiro turno. O líder governista na Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), acertou com o presidente da Casa, João Paulo Cunha (PT-SP), uma sessão extraordinária esta manhã para votar as três medidas provisórias que trancam a pauta. Duas das três MPs estão com os relatórios prontos.

- O impasse, que será superado, relaciona-se às exigências para a concessão de crédito, incluídas na MP de microfinanças e consórcios.

O Planalto já tem a estratégia para acelerar a votação dos destaques. Está praticamente acertada a derrubada das duas propostas do PTB, uma permitindo que benefícios e aposentadorias superem o teto de R$ 17.170. Por ora, o acerto é político. Na semana passada, levantou-se a hipótese de transformar os destaques do PTB numa emenda aglutinativa, mais fácil de ser derrotada em plenário.

O Executivo também conversa com o PSDB em torno do destaque que reduz de dez para cinco anos o tempo de permanência no cargo, para garantia da aposentadoria integral. Os tucanos alegam que as regras atuais são muito rígidas e impedem a ascensão profissional no funcionalismo. O presidente Lula quer manter o texto original: 60 anos de idade (homem), 55 anos (mulher), 35 anos de contribuição (homem), 30 anos (mulher), 20 anos no serviço público e 10 anos no cargo.

Se a estratégia governista der certo, só dois destaques serão colocados em votação hoje: o que eleva para R$ 1.440 o teto de isenção dos servidores inativos da União. Acima deste valor, serão cobrados 11% de contribuição. O segundo, apresentado pelo PFL, tem como objetivo isentar as pensões de qualquer redutor ou taxação. Pelo texto aprovado na semana passada, pensões acima de R$ 2.400 terão redutor de 50%, além dos 11% de contribuição.

Otimista, Aldo acha possível que, no segundo turno, previsto para o fim do mês, aumente o número de votos favoráveis na base governista. O texto original e a taxação dos inativos, votados na semana passada, só foram aprovados graças ao apoio do PFL e do PSDB.

Senado quer mudar texto da Previdência
Paim: ''Casa não pode apenas carimbar textos da Câmara''

BRASÍLIA - Contrariando a expectativa do governo e do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), de que a reforma da Previdência será facilmente aprovada na casa, senadores de diferentes partidos - inclusive do PT - criticaram o texto que deverá sair da Câmara e defenderam modificações.

Para o vice-presidente do Senado, Paulo Paim (PT-RS), a reforma já aprovada em primeiro turno na Câmara não reflete a opinião dos 81 senadores, que buscam alternativas a questões como a tributação dos inativos e as regras de transição. Segundo o petista, o Senado ''não pode apenas carimbar textos aprovados pela Câmara''.

Líder da minoria no Senado (PFL e PSDB), Efraim Morais (PFL-PB) anunciou que vai apresentar emenda contra a tributação dos inativos e disse ser ''questão de honra'' para o seu partido derrubar esse item na Casa, com votos de todas as legendas e da maioria dos pefelistas. Na Câmara, a bancada do PFL ficou dividida. Dos 69 deputados pefelistas, 31 apoiaram a taxação de inativos.

- Aqui no Senado será diferente, porque os senadores são mais experientes e maduros - disse Morais. - Vamos modificar o texto, independentemente da pressão do governo - afirmou. O PFL tem 18 senadores.

O PSDB, que ajudou o governo na Câmara, estará dividido no Senado. O líder da bancada, Arthur Virgílio (AM), votará a favor, mas foi informado pelos tucanos Antero Paes de Barros (MT) e Leonel Pavan (SC) de que eles votarão contra a cobrança dos aposentados. Não haverá fechamento de questão na bancada tucana.

O líder do PDT, Jefferson Péres (AM), também garantiu que seu partido (cinco senadores) votará contra a cobrança. Para ele, a tramitação da reforma no Senado não será tão tranqüila quanto espera o governo.

- Espero que o ânimo do Senado não seja aprovar a proposta porque a Câmara aprovou. Isso é deixar o Senado numa posição subalterna - disse Péres.

Em discurso no plenário, Mão Santa (PMDB-PI) chamou a proposta aprovada pela Câmara de ''farsa'' e conclamou o PMDB a votar contra, pelo menos, a taxação dos inativos.

- É na velhice que gastamos mais com remédios - disse, citando doenças que costumam surgir na idade avançada. - E as viuvinhas? Vão ficar sem pensão? Sei lá se a Adalgizinha [sua mulher]vai ser pensionista, e vou abrir mão antes?.

No plenário, os senadores reagiram às declarações atribuídas a Sarney, de que a proposta já chegará concluída.

- Como presidente do Senado, ele só poderia garantir a nós a tranqüilidade para apresentar as emendas que quisermos. Compete a nós analisar profundamente uma matéria como essa. Temos de examinar com olhos de lince, buscando corrigir equívocos - afirmou o peemedebista Pedro Simon (RS).
Agência Folha

Dissidentes comunistas mantêm voto

BRASÍLIA - Dos quatro deputados do PCdoB que votaram contra o texto principal da reforma da Previdência, pelo menos dois afirmam que repetirão o voto no segundo turno na Câmara dos Deputados. O partido, que ocupa a liderança do governo na Casa, abriu processo disciplinar contra os parlamentares, o que pode resultar em expulsão da legenda.

Os deputados contrários à proposta foram Jandira Feghali (RJ), Sérgio Miranda (MG), Afonso Gil (PI) e Alice Portugal (RJ). A bancada na Câmara tem 11 integrantes.

Feghali e Afonso Gil afirmaram ontem que votarão contra novamente. ''Meu voto é um só, independente de ser no primeiro, segundo ou quinto turno, porque a matéria é uma só'', disse ela. O deputado Afonso Gil afirmou que não teme ser expulso do partido. ''Podem abrir dois, três, 20 processos. A reforma vai contra o bolso dos trabalhadores. Por que não fazem uma auditoria para ver quem roubou a Previdência?''.

Já o deputado Sérgio Miranda não quis adiantar se manterá seu voto. Ele minimizou a abertura de processo disciplinar pela legenda, considerando-a ''normal para quem contraria uma norma do partido''. O líder do governo, deputado Aldo Rebelo, não quis comentar uma possível retaliação ao PC do B, que liberou a bancada na questão dos inativos. Resultado: sete de 11 parlamentares votaram contra a medida.

- O governo não tem influência sobre decisões internas dos partidos da base. Nossa função é buscar a unidade e os votos necessários para aprovar as reformas - afirmou.
Com Agência Folha

Carga fiscal mais alta
Contribuinte pagará a conta da reforma tributária, afirmam especialistas
EDNA SIMÃO

BRASÍLIA - Apesar de o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, garantir que não haverá aumento de impostos, a reforma tributária, em negociação no Congresso, vai mesmo atingir o bolso do contribuinte. Para se ter uma idéia, só a transformação da Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF) em imposto permanente já representa uma tungada na conta corrente de clientes bancários. Tributaristas avaliam que a emenda embute medidas que elevam a conta fiscal e outras com o objetivo de bancar a política social do governo Lula.

- A reforma vai aumentar a carga tributária - diz o advogado tributarista Julio Cesar Alves, da De Rosa Siqueira.

Alves afirma que o governo quer bancar a política social com a reforma tributária. O texto prevê a criação do programa de transferência de renda para famílias carentes. O projeto será executado por meio de convênios entre a União, Estados e municípios.

- Isso não deveria fazer parte da reforma tributária. É política social - observa Alves.

O contribuinte vai pagar a conta também do acordo selado entre o Planalto e os governadores para dividir a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide, o ''imposto'' dos combustíveis).

- A reforma não elevará a carga tributária agora, mas a médio prazo. Pode, contudo, provocar aumento imediato com o pleito de Estados e municípios de divisão da Cide e da CPMF - analisa o cientista político Christopher Garman, da Tendências Consultoria.

O raciocínio é simples. Com orçamento apertado, o governo não tem como abrir mão de receitas sem compensação. As alternativas são mínimas, observa Garman: ou reduz despesas ou aumenta impostos. Se reajusta a Cide, o impacto será repassado ao consumidor final.

O tributarista Ives Gandra reforça. Diz que o governo está dando instrumentos para governadores e prefeitos elevarem a carga tributária. Estudo da Receita Federal mostra que os impostos encerraram 2002 representando 35,86% do PIB - soma das riquezas do país.

Gandra alerta que a progressividade no impostos sobre compra e venda de propriedades e o imposto sobre herança e doações abrem espaço para ampliar a carga sobre os contribuintes.

- Dizer que a reforma tributária será neutra não é verdadeiro. O governo incluiu instrumentos no texto que abre, a possibilidade de aumento de tributos. O contribuinte vai perder com a reforma - afirma.

O estabelecimento de alíquotas mínimas e máximas para o ICMS cobrado pelos Estados é exemplo disso. Gandra Martins observa que nada no texto garante ao consumidor que o percentual determinado por governadores não seja mais alto. E imposto mais alto é sempre repassado para o preço final do produto. O consumidor paga a conta.

Decisão sobre CPMF é adiada
DOCA DE OLIVEIRA

BRASÍLIA - A distribuição de parte da arrecadação da CPMF com Estados e municípios será uma decisão política do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Com tal convicção, o relator da reforma tributária, Virgílio Guimarães (PT-MG), entrega o parecer final na quinta-feira à comissão especial, sem tocar no tema. Prevê-se que o documento será votado na próxima semana.

- É preciso preservar o equilíbrio fiscal da União. Esta será uma decisão política - avisou Guimarães, favorável à medida.
Momentos antes, o líder do governo na Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), sinalizara que a questão da CPMF deve ser, mesmo, o calcanhar-de-aquiles da reforma tributária. Dependente da arrecadação de R$ 23 bilhões para fechar as contas, o Ministério da Fazenda tem jogado duro sobre a questão.

- O governo não admite, em hipótese nenhuma, dividir a CPMF. Já cedeu na Cide - informou o líder, num recado para Virgílio Guimarães. - O relator tem sua opinião, mas o governo descarta mudança - insistiu Aldo.

O parecer à reforma tributária está em fase de conclusão. Guimarães vai incluir a exigência de noventena para a cobrança de novos impostos e estuda a melhor regra para a composição do Fundo de Compensação aos Estados Exportadores.

Os partidos de oposição, principalmente o PFL, mostram interesse em interferir no texto. Além disso, empresas e indústrias mobilizam parlamentares para incluir na emenda medidas de estímulo à retomada do crescimento econômico.