quarta-feira, 16 de julho de 2003

O DIA

Reforma ganha cara nova
Pressionado, Governo oficializa mudanças na Previdência, aceita aposentadorias integrais para servidores e negocia até a paridade

BRASÍLIA - A Reforma da Previdência está ganhando cara nova, menos carrancuda para atuais servidores federais, estaduais e municipais. Pressionado pelo Judiciário e a greve do funcionalismo, além da própria base parlamentar, o Governo fez mudanças significativas no texto enviado ao Congresso. E aceitou alterar pontos fundamentais, extintos na proposta anterior, com exceção da polêmica contribuição previdenciária dos inativos (desconto de 11% sobre a parcela do salário acima de R$ 1.058). Entre as medidas, está a manutenção da integralidade (aposentadoria igual ao último salário da ativa). A paridade (mesmos reajustes para ativos e inativos) é um dos pontos indefinidos na mesa de negociação. Confira aqui a queda-de-braço pela forma da reforma.

Para ter direito à integralidade, os atuais servidores serão obrigados a cumprir regras rígidas: ter 35 anos de trabalho (homem) ou 30 (mulher), 25 no serviço público e 20 na carreira, além de 60 anos de idade (homem) e 55 (mulher). Para os futuros servidores públicos, a reforma será impiedosa: terminam a integralidade e a paridade, e o teto de salário na aposentadoria passa a ser de R$ 2.400, com a possibilidade de complementação por um fundo de previdência.

Regras mudam também para as pensionistas

O Governo também concordou em mudar a proposta inicial em relação às pensionistas. Antes, limitava as pensões a 70%. Agora, aceita pagar integralmente até R$ 2.400, mais metade do que ultrapassar esse valor. Os subtetos salariais nos estados e municípios também serão alterados. Na proposta inicial, eram limitados aos vencimentos dos governadores e prefeitos. Agora, manterão proporção mais generosa em relação ao teto salarial da União – vencimento de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). A mudança atende a uma reivindicação dos juízes.

Para conseguir o aval às mudanças, os ministros José Dirceu (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Previdência) se reuniram com cinco governadores, representantes das regiões do País: Aécio Neves (MG); Germano Rigotto (RS); Marconi Perillo (GO); Wilma Faria (RN) e Eduardo Braga (AM).

Relator da Reforma da Previdência na Câmara, José Pimentel (PT-CE), defendeu as mudanças. Disse que o impacto da concessão de aposentadorias integrais para os estados será igual ao da União. Ele acrescentou que a integralidade vai reduzir de R$ 52,14 bilhões para R$ 50,7 bilhões a economia que a União terá com a reforma em 20 anos.

Relatório adiado a pedido de Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhou por telefone, de Madri, na Espanha, as negociações em torno da Reforma da Previdência. Ao longo do dia, foram várias as conversas com o ministro José Dirceu, a quem Lula fez um pedido especial.

O presidente encarregou o ministro de conversar com os líderes aliados no Congresso para que fosse transferida de hoje para amanhã a leitura do relatório sobre a proposta de Reforma da Previdência. E o motivo era simples: Lula argumentou que queria estar no Brasil no momento da apresentação do texto. Dirceu confirmou o adiamento, após consultar as lideranças, o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, e o relator José Pimentel.

Para presidente do STJ, democracia corre risco

Em Brasília, dois dos maiores críticos da Reforma da Previdência – os presidentes do Superior Tribunal de Justiça, Nilson Naves, e do Supremo Tribunal Federal, Maurício Corrêa – reuniram-se na sede do STF para acompanhar as mudanças negociadas. Naves destacou que o Poder Judiciário se mantém unido em torno de três pontos: integralidade, paridade e manutenção do subteto para o Judiciário estadual na faixa de 95% dos salários dos ministros dos tribunais superiores.

Também advertiu que a quebra dessas garantias previstas na Constituição pode desequilibrar a magistratura e ameaçar o próprio estado democrático de direito.

 

Governadores respondem hoje se aceitam mudanças no projeto inicial

Os cinco governadores que estiveram no Palácio do Planalto discutindo a Reforma da Previdência com os ministros garantiram que vão concluir a consulta aos demais 22 chefes de Executivo estaduais até hoje à noite. Segundo Eduardo Braga (PPS), após as consultas, os governadores vão se pronunciar se aceitam as mudanças no projeto original, abrindo espaço para a apresentação, amanhã, do relatório do deputado José Pimentel (PT-CE).

“Acho que, no caso do Amazonas, não teremos problemas em manter a integralidade”, disse Braga. Mas a questão mais difícil se concentra na paridade. “É preciso olhar com cuidado a questão da paridade das aposentadorias com salários da ativa”, afirmou.

De Madri, onde acompanha a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Espanha, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, disse que os servidores devem trabalhar mais porque isso é salutar. O apelo por mais tempo de trabalho é, na avaliação dele, demonstração de apreço ao servidor.

“Não é razoável, num país com as dificuldades do Brasil, que um servidor se aposente aos 48 e aos 55 anos”, comentou o ministro. A proposta de aumento da idade mínima para as aposentadorias faz parte do coração da reforma, na opinião de Palocci.

Ministro ameaça cortar o ponto de servidor em greve

O ministro citou estudos do Palácio do Planalto que indicam que, se nada for feito para mudar as atuais regras previdenciárias, o funcionário público não terá como receber um centavo, num prazo que varia de 5 a 10 anos, e o direito à aposentadoria, previsto na Constituição, será letra morta.

Palocci aproveitou para mandar recado aos servidores e ameaçou cortar o ponto da categoria, em greve desde o dia 8, contra a Reforma da Previdência. “Em princípio, os ministros promovem os descontos. O presidente é que vai resolver sobre uma eventual negociação posterior. Faltou, faltou. Não se pode dar abono prévio das faltas”, disse.

CUT pressiona para ampliar teto

O Governo também estuda mudanças na proposta de Reforma da Previdência para atender a pedido da CUT (Central Única dos Trabalhadores). De acordo com o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), que se encontrou com o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, estão em discussão a ampliação do teto de aposentadoria de R$ 2.400 para R$ 2.700, o aumento do limite de isenção na taxação de inativos de R$ 1.058 para R$ 1.300 e ainda a elevação da integralidade da pensão de R$ 2.400 para R$ 2.700.

Outro pedido da CUT é para mudar o dispositivo que reduz em 5% por ano o valor do benefício para o servidor que se aposentar antes da idade mínima. O Governo faz as contas para tentar reduzir esse percentual para 3%.