segunda-feira, 07 de julho de 2003

O Globo

Previdência: comissão quer regras de transição
Adriana Vasconcelos e Isabela Abdala

      BRASÍLIA. O Congresso vai modificar a proposta do governo de reforma da Previdência para não prejudicar os servidores públicos que estão perto de se aposentar. Pesquisa realizada pelo GLOBO, que ouviu 27 dos 38 integrantes da comissão especial da reforma da Previdência, revela que eles são unânimes na defesa de regras de transição para a aplicação de algumas das mudanças propostas pelo governo, como a nova idade mínima e o cálculo dos benefícios, que acabaria com a aposentadoria integral.

      O Palácio do Planalto e o Ministério da Previdência estão cientes disso e devem se render à tendência manifestada pela comissão. E já começaram a negociar algumas das emendas apresentadas pela base governista.

Misturar regras em vigor com as novas é alternativa

      Entre as alternativas em estudo destaca-se a idéia de se estabelecer a mistura entre as regras em vigor e as novas, propostas pelo governo, para o cálculo dos benefícios dos atuais servidores que vierem a pedir aposentadoria: as regras atuais (a integralidade) seriam aplicadas sobre os 20 primeiros anos de contribuição e as novas regras (a média das contribuições) incidiriam sobre os últimos 15 anos.

      — Isso melhora muito as condições do benefício — confirma o vice-líder do governo, deputado Professor Luizinho.

      Outra proposta que vem sendo negociada garantiria uma transição para o aumento da idade mínima proposto pelo governo, de 48 para 55 anos no caso das mulheres e de 55 para 60 anos para os homens. Duas alternativas estão sob análise dos técnicos: a primeira diminuiria de 5% para 2% o redutor anual para as aposentadorias proporcionais e a segunda reduziria pela metade o tempo extra que os servidores que estão no máximo a sete anos da aposentadoria teriam de trabalhar.

      Um funcionário de 52 anos que, pelas regras atuais, poderia se aposentar no ano que vem,com a proposta do governo teria de trabalhar mais sete anos. Se as regras de transição forem aprovadas, ele trabalharia apenas mais três anos e meio.

      Garantir regras de transição para a nova idade mínima e o cálculo dos benefícios é a principal preocupação dos integrantes da comissão especial da reforma da Previdência. Dos 27 deputados ouvidos pelo GLOBO, 21 exigem transição para a idade mínima e 18 para o cálculo do benefício. Quatorze defendem a flexibilização para a aplicação do fim da aposentadoria integral e do redutor de 5% para quem decidir antecipar sua saída do serviço público.

      A pesquisa do GLOBO revelou ainda que a comissão especial está dividida em relação à taxação dos servidores inativos. Dos 27 deputados ouvidos, apenas 23 se manifestaram sobre o assunto: 12 admitiram ser contra e 11 a favor.

      Mas a certeza de que o governo conseguirá aprovar esta proposta levou 19 parlamentares a adiantarem que defenderão o aumento da faixa de isenção para a cobrança da contribuição previdenciária dos servidores públicos federais, de R$ 1.058 para R$ 2.400. Apenas quatro se manifestaram contra a idéia, que foi incluída entre as nove emendas da bancada do PT, mas enfrenta resistência dos governadores e do ministro da Previdência, Ricardo Berzoini.

      — Vou lutar para que não haja taxação de inativos até o fim, mas se não tiver jeito, voto a favor do aumento da faixa de isenção — disse o deputado Jair Bolsonaro (PTB-RJ).

      Dos 27 que responderam ao questionário, 17 defendem a criação de uma faixa de isenção para a redução de até 30% no valor das pensões e três foram contra. Essa também seria uma alternativa caso a redução dos benefícios das pensionistas seja inevitável.

      — Tenho sérias desconfianças da negociação dessas emendas. O comportamento da Mesa mostra que as nossas propostas não vão receber o respeito que merecem — afirmou a deputada Yeda Crusius (PSDB-RS), levantando dúvidas sobre a disposição do governo de negociar o mérito da reforma.

Jandira diz que não se considera vencida

      Ao responder à consulta, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) ressaltou que é contra a reforma enviada pelo governo. Mas, ao contrário da colega tucana, a deputada disse que não se considera vencida em questões polêmicas como a contribuição previdenciária dos servidores inativos.

      O relator da reforma, José Pimentel (PT-CE), e o deputado Enéas Carneiro (Prona-SP) se recusaram a participar da pesquisa do GLOBO. O ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, não quis comentar o resultado da consulta.


Receita faz R$ 12 bi em autuações

O Leão afia as garras
Vivian Oswald
BRASÍLIA

      Preocupada com as crescentes pressões por gastos no segundo semestre, a equipe econômica deu determinações expressas à Receita Federal para que não deixe escapar um único centavo da arrecadação. Discretamente, a determinação já vem sendo cumprida com a Receita aumentando mês a mês o número de autuações, apertando o cerco sobre os contribuintes. Nos primeiros cinco meses do ano, o Fisco autuou empresas e pessoas físicas em R$ 12,7 bilhões. Esse número representa um aumento de 67,1% e ultrapassou o volume de multas aplicadas no mesmo período de 2002 em mais de R$ 5,1 bilhões. O dinheiro das autuações costuma levar 18 meses para entrar nos cofres públicos, devido aos prazos que os contribuintes têm para recorrer das multas. Mas a Receita está confiante que boa parte dos recursos entre no caixa ainda este ano, por meio do novo Programa de Recuperação Fiscal (Refis).
      Boa parte das multas se refere a irregularidades identificadas pelo Fisco em anos anteriores, e as empresas poderão recorrer ao Refis para parcelar os débitos referentes à autuações recebidas agora, com juros mais baixos e em até 180 meses. A outra opção para elas é recorrer na Justiça, sob o risco de serem derrotadas e obrigadas a pagar a dívida em até 30 meses e com juros mais altos.
      A principal arma da Receita para aumentar as autuações é a malha fina das pessoas jurídicas, que está mais apertada do que nunca. Neste ano, quase quatro mil empresas já foram pegas pela malha, contra apenas 620 no ano passado. Com isso, as autuações passaram de R$ 173,4 milhões para R$ 894,1 milhões.
Receita cruza dados de CPMF e cartões
      Além disso, o sistema de inteligência artificial da Receita Federal tem cruzado cada vez mais informações de contribuintes, o que tem facilitado a identificação de ilícitos. Os dados da Receita incluem, além da CPMF e do Imposto de Renda, dados de cartões de crédito, transações imobiliárias, entre outros.
      Com base nessas informações, as ações fiscais até caíram um pouco, passando de 3.338 nos cinco primeiros meses do ano passado para 3.020 este ano. Mas as multas saltaram de R$ 6,7 bilhões para R$ 10,03 bilhões no período.
      Para intensificar ainda mais os trabalhos da Fiscalização, o secretário da Receita, Jorge Rachid, vai mudar a estrutura do Departamento de Inteligência da Receita, que vai trabalhar muito mais integrado às áreas de fiscalização e aduaneira.
Nos cinco primeiros meses do ano, a indústria foi o setor com maior número de autuações. Foram R$ 3 bilhões, do total de R$ 12 bilhões em multas aplicadas pela Receita este ano. Em seguida, vêm as instituições financeiras, com R$ 2,3 bilhões do total e o comércio, com R$ 2,16 bilhões.
      O setor da construção civil, um dos principais alvos da Receita este ano, recebeu praticamente o dobro das multas do mesmo período do ano passado. Foram 144 empresas multadas em R$ 376,8 milhões este ano, contra 160 companhias com multas de R$ 180 milhões no ano passado.
      Este setor vem sendo monitorado com pente fino pela Receita. Segundo o Fisco, 21 mil companhias que lidam com a área imobiliária começam a ser convocadas a prestar esclarecimentos nos próximos dias, por não terem declarado o valor das transações que realizaram no ano passado. A Receita também vai acompanhar o setor de frigoríficos, bebidas e cigarros.
      Também cresceram as autuações a pessoas físicas. De janeiro a maio, 5.795 cidadãos foram autuados em R$ 1,12 bilhão. No mesmo período de 2002, a Receita multou 3.213 pessoas físicas, em R$ 746,6 milhões. Mais uma vez, os proprietários e dirigentes de empresas foram os que mais apresentaram irregularidades. Ao todo, 488 foram autuados em R$ 355,2 milhões. Em seguida, vêm os profissionais liberais, com 938 autuações no valor total de R$ 245,7 milhões.


Base pressiona mais por mudanças nas reformas

      BRASÍLIA. A maior pressão por mudanças nas reformas tributária e da Previdência está sendo feita pelos próprios aliados. O balanço feito pelo líder do governo na Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), mostra que das 466 emendas apresentadas à reforma tributária 240 são de nove partidos da base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entre as 453 alterações à previdenciária, 234 são de deputados aliados e 197 de parlamentares da oposição.
Individualmente, no entanto, o PFL liderou o volume de emendas, apresentando 88 à tributária e 102 ao texto da reforma da Previdência. Rebelo preferiu minimizar o fato.
      - Os deputados da base têm espírito de participação e tomaram a iniciativa de proteger a proposta original, apresentando sugestões para aperfeiçoá-la - disse.
      Aldo descartou atraso na aprovação dos textos nas duas comissões especiais, porque, para ele, a maior parte das emendas trata de temas já debatidos pelo Congresso. Rebelo admitiu, entretanto, que o texto enviado pelo governo deve ser modificado:
      - O governo trabalha com a necessidade de a votação das duas propostas nas comissões ainda em julho. É impossível imaginar que, com mais de 400 emendas às duas reformas, o Congresso não vá fazer modificações no texto do governo.       Vamos negociar, mas preservando a essência da proposta original.
      O fim da aposentadoria integral para os servidores públicos - que recebeu 123 emendas - foi o tema mais polêmico entre os deputados. Há emendas que garantem o pagamento integral para todos, e outras apenas para carreiras específicas, como a de juízes e diplomatas. A da contribuição previdenciária dos servidores inativos recebeu 67 emendas, algumas acabando com a possibilidade de cobrança, outras aumentando o teto de isenção de R$ 1.058.