sexta-feira, 18 de julho de 2003
O Globo
Nem Lula derruba paridade
Isabel Braga e Valderez Caetano
BRASÍLIA
Apesar da resistência do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, que só cedeu depois de horas de negociação,
o relatório do deputado José Pimentel (PT-CE) sobre a reforma
da Previdência, apresentado 78 dias depois de o texto original do
governo chegar à Câmara, incluiu a paridade, que garante
aos servidores aposentados o mesmo índice de reajuste dos que estão
na ativa. A medida era defendida pelos parlamentares da base aliada, apesar
da oposição do Planalto e do ministro da Fazenda, Antonio
Palocci. Apenas Ricardo Berzoini, ministro da Previdência, defendia
a medida no governo. A paridade, assim como a manutenção
da aposentadoria especial, só beneficiará os atuais servidores.
A taxação dos funcionários públicos inativos,
que tanta polêmica provocara no PT e em outros partidos da base,
foi mantida. A Câmara, porém, teve que ceder em dois pontos:
a redução para R$ 1.058 do limite para o pagamento integral
de pensões, que os deputados queriam que fosse de R$ 2.400 (a partir
de R$ 1.058, o benefício poderá ser reduzido em até
70%) e o subteto para o Judiciário estadual, que caiu de 90,25%
para 75% do salário de ministro do Supremo Tribunal Federal.
Berzoini foi uma voz isolada no governo
Uma voz quase isolada no governo em defesa da paridade, o ministro da
Previdência, Ricardo Berzoini, acabou vitorioso depois de um dia
de intensas e confusas negociações. Ele festejou o fato
de Lula ter cedido à sua sugestão de manutenção
da paridade e explicou que, ao dar aos aposentados reajuste na proporção
equivalente ao salário-base da ativa, o governo está tirando
dessa conta todas as vantagens adicionais obtidas pelo funcionário
ao longo da carreira.
A paridade, porém, não será mais da forma como é
hoje. Segundo o relatório, fica mantido reajuste idêntico
para servidores da ativa e aposentados sobre a remuneração
e as verbas de caráter pessoal - como qüinqüênios
e promoções de carreira. Poderão ser excluídos
benefícios de caráter indenizatório: horas extras,
auxílio alimentação, auxílio moradia, entre
outros. Para isso, a União, os estados e municípios terão
de apresentar lei regulamentando a questão. A integralidade das
atuais pensões está mantida.
A aposentadoria especial para os atuais servidores será mantida
desde que cumpridas três exigências: idade mínima de
55 anos (mulheres) e 60 anos (homens), 30 anos de contribuição
(mulheres) e 35 (homens), além de 20 anos no serviço público
e dez no cargo. Os que quiserem se aposentar antes, de acordo com as regras
atuais (48 anos de idade para mulher e 53 para homens) terão um
redutor de 5% em suas aposentadorias por ano antecipado (em relação
aos 55/60).
Para os futuros servidores ficou mantido o regime único, com teto
de benefícios de R$ 2.400, o mesmo sistema dos trabalhadores da
iniciativa privada que contribuem para o INSS. O reajuste desse valor
será feito com base no Índice Nacional de Preços
ao Consumidor do IBGE. A partir desse teto, os servidores públicos
poderão contribuir para fundos de pensão fechado, com gestão
paritária em que governo e funcionário contribuem igualmente
(um por um). Ainda não se sabe se será contribuição
definida e se cada categoria da União terá um fundo próprio.
O texto manteve ainda a aposentadoria especial para professores do ensino
básico e médio (50/55 anos de idade e 25/30 de contribuição).
Também manteve o previsto na atual regra, de aposentadoria aos
50/55 anos de idade para magistrados, integrantes do Ministério
Público e Tribunal de Contas da União.
Congresso promete rever teto do Judiciário
Helena Chagas e Isabela Abdala
BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva resistiu
até o último momento à inclusão da paridade
nos reajustes entre inativos e servidores da ativa, medida defendida quase
que solitariamente pelo ministro da Previdência, Ricardo Berzoini,
na reunião da coordenação política do governo
ontem de manhã no Alvorada. Além de Lula, manifestaram-se
contra a paridade os ministros José Dirceu (Casa Civil), Luiz Gushiken
(Secretaria de Comunicação) e Antonio Palocci (Fazenda).
Berzoini e o líder do governo na Câmara, Aldo Rebelo, foram
mandados ao Congresso para defender, a contragosto, a retirada desse dispositivo
do relatório de José Pimentel.
- Lula não quer a paridade - anunciou Berzoini ao chegar ao gabinete
da presidência da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP),
onde contou também que o presidente recusara qualquer mudança
no texto envolvendo os futuros funcionários.
- Mas sem paridade não pode ter acordo. Dei minha palavra - reagiu
João Paulo, com o apoio dos líderes e parlamentares que
lá estavam.
O impasse só foi resolvido num telefonema ao presidente da República,
disparado da saleta reservada do presidente da Câmara, onde ficaram
apenas o anfitrião, o ministro e o líder do governo. Dessa
conversa, sabe-se que Lula abriu mão da paridade, apesar de considerar
que engessa a política de recursos humanos. Prevaleceu, porém,
o argumento de que, do ponto de vista fiscal, a medida pode ser vantajosa,
além de fundamental para o acordo com o Congresso e o Judiciário.
Lula deixou claro, contudo, que este é o limite do governo no
que diz respeito a concessões. Em troca do recuo presidencial,
João Paulo e os líderes no Congresso também tiveram
que ceder em duas outras questões importantes: aceitaram reduzir
de R$ 2.400 para R$ 1.058 o teto da integralidade das pensões,
que a partir desse valor poderão sofrer redução de
até 70%, e acabaram concordando com o subteto de 75% do salário
dos ministros do STF para os desembargadores. Com isso, contentaram os
governadores, que chegaram a reclamar da manutenção da paridade
mas acabaram contemplados em suas principais reivindicações
- inclusive a polêmica taxação dos servidores inativos,
que permaneceu intocada no texto.
Nesse ponto da conversa, porém, líderes e parlamentares
reunidos no gabinete de João Paulo com Berzoini passaram a temer
a reação do Judiciário, que esperava ver atendida
a reivindicação de um subteto de 90,2% do salário
do STF para os desembargadores nos estados. O vice-líder Sigmaringa
Seixas (PT-DF), com bom trânsito entre os juízes, foi despachado
para uma conversa com o presidente do STF, Maurício Corrêa,
e tranqüilizou-o.
- Mandamos ao Judiciário o recado de que as negociações
continuam, e que o subteto poderá ser modificado e restabelecidos
os 90,2% ainda na fase de votação do projeto na Comissão
- disse um dos participantes.
Na verdade, o presidente da comissão especial que analisa a reforma
da Previdência, o pefelista Roberto Brant (MG), que também
estava no gabinete de João Paulo, prometeu pôr em votação
emenda restaurando o subteto de 90%. O raciocínio dos líderes
do governo é de que, se passar o relatório como está,
juízes e desembargadores podem derrubar esse parágrafo da
emenda em julgamentos futuros, sob o argumento de que a Constituição
assegura a irredutibilidade dos vencimentos da magistratura.
Apesar do acordo fechado com o Executivo, outras mudanças futuras
foram discutidas na reunião no Congresso, como a elevação
do limite de idade para aposentadoria dos atuais funcionários para
65 anos e até da chamada "compulsória" para os
servidores públicos, que subiria de 70 anos para 75 anos. Isso
também agradaria aos juízes, sobretudo os do STF. Alguém
lembrou na hora que o próprio Corrêa cai nessa compulsória
no ano que vem, quando completa 70 anos.
A esta altura, depois de muita negociação e horas de atraso
na leitura do parecer, o plenário começava a esvaziar, os
deputados queriam viajar. Os pefelistas presentes chegaram a sugerir um
adiamento para a semana que vem. Mas os petistas reagiram: o Congresso
acabaria desmoralizado e o governo, desgastado. Saíram então
todos para o plenário, atrás do relator José Pimentel.
Problema resolvido?
- Acho que 75% dos problemas foram resolvidos... Não, quase cem
por cento - dizia o líder do PT, Nelson Pellegrino, que participou
das reuniões no Alvorada e na presidência da Câmara.
João Paulo, de partida para uma viagem à Argentina, ouviu
sugestões de colegas para conhecer as casas de tango de Buenos
Aires:
- Nem precisa. Já dancei um tango aqui hoje.
Palocci: 'Chegamos muito perto do limite
que a reforma pode suportar'
Vivian Oswald
BRASÍLIA. Mesmo depois de perder a queda-de-braço pela
manutenção do texto original da reforma da Previdência,
o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, evitou falar em derrota e aproveitou
para dar um recado ao Congresso: o projeto da reforma chegou muito perto
do seu limite de mudanças. Ele disse que, como está, a reforma
é boa para o país e que qualquer alteração
adicional poderia comprometê-la.
- Se essas mudanças se ampliarem, podem vir a comprometer a reforma.
Para se buscar uma reforma equitativa e sustentável, chegamos muito
perto do limite das mudanças que um projeto como este pode suportar
para se manter integrado, coerente e conseguir seu objetivo de uma futura
Previdência que seja universal e justa - afirmou.
Palocci reconheceu que a proposta não agradou a todos, mas destacou
que ela não terá impacto fiscal expressivo. Integrantes
do governo estimam que o prejuízo que o atual texto da reforma
deve provocar em relação à proposta inicial deve
ser de R$ 1,7 bilhão durante 20 anos.
- Temos a certeza que o Senado e a Câmara terão a visão
correta do que está em jogo. Ninguém espera, nem o governo
pode esperar ao fazer duas reformas deste porte, que não haja nenhuma
modificação numa casa tão rica em debates como é
o Congresso brasileiro - disse, acrescentando que talvez esta não
seja a última reforma, mas é de grande importância.
Negociações para a tributária
O ministro da Fazenda lembrou que o governo deve participar de uma nova
rodada de negociações em torno da reforma tributária,
que, segundo ele, não terá apenas céu de brigadeiro.
- Isso faz parte da natureza de reformas como esta. Precisamos estar
cientes de que é assim que se constrói uma reforma que é
de grande porte. Assim vamos também trabalhar na questão
tributária. Não esperamos que tenhamos na questão
tributária apenas céu de brigadeiro - afirmou.
Segundo ele, durante a reforma tributária haverá debates
com setores interessados.
- Principalmente na questão tributária, onde se está
mexendo com aquilo que é imposto, que, se fosse uma questão
agradável, não teria esse nome - acrescentou.
Governadores se dividem sobre as mudanças
na reforma
BRASÍLIA. O governadores se dividiram na avaliação
do resultado final do acordo da reforma da Previdência e da atuação
do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Enquanto Aécio
Neves (MG) e Eduardo Braga (AM) elogiaram o empenho de Lula para manter
a proposta original, Jarbas Vasconcelos (PE) disse que a paridade e a
integralidade são inconvenientes e que defenderá o texto
enviado ao Congresso em abril. Cássio Cunha Lima (PB) foi reticente.
- O que estava claro era que havia a necessidade de negociação
- afirmou ele.
Aécio disse que a proposta que resultou do acordo será
defendida pelos parlamentares ligados aos governadores:
- O presidente Lula foi absolutamente correto com os governadores e,
a partir de agora, esta proposta será defendida no Congresso pelo
governo federal e também pela base ligada aos governadores.
Para o governador do Amazonas, Eduardo Braga, Lula foi correto com os
estados e coerente com o país.
- Do jeito que a reforma estava sendo alterada, seria para apenas dez
anos e, ao decidimos cacifar as propostas, concluímos que ou fazíamos
as reformas ou não teríamos a estabilidade do dólar
e do risco-país.
Jarbas Vasconcelos disse que defenderá o texto original.
- Se o texto original tivesse prevalecido, não teríamos
o inconveniente da integralidade e da paridade.
Já Cássio Cunha Lima duvidou da manutenção
da contribuição dos servidores inativos no Congresso.
- Acho que isso ainda vai ser mudado...
Na avaliação da governadora do Rio Grande do Norte, Wilma
Faria, os princípios da reformas foram preservados.
- Gostei, por exemplo, das mudanças na pensão.
Aliados avisam que tentarão mudar
o texto
Lydia Medeiros, Isabel Braga e Valderez Caetano
BRASÍLIA. Nem a manutenção do princípio da
paridade entre os salários dos servidores e as aposentadorias do
setor público, incluído na última hora no relatório
da reforma da Previdência, satisfez completamente a base governista.
Sobraram críticas entre os aliados, que disseram que tentarão
mudar o texto. O vice-líder do governo, deputado Beto Albuquerque
(PSB-RS), estava inconformado com o relatório de José Pimentel
(PT-CE):
- Preterir o acordo feito com sua base para agradar aos governadores
é uma escolha perigosa para um governo recém-começado.
A base foi desconsiderada e o presidente não poderia fazer isso,
tem de entender que vivemos numa República - criticou Albuquerque.
A insatisfação do deputado traduz o sentimento de boa parte
dos aliados, que não gostaram de duas mudanças no relatório:
a redução do limite de isenção das pensões
de R$ 2.400 para R$ 1.058 e a fixação do teto salarial dos
magistrados estaduais em 75% dos vencimentos dos ministros do Supremo
Tribunal Federal.
O líder do PCdoB, Inácio Arruda (CE), afirmou que há
muitas diferenças entre o governo e o partido em relação
à reforma. Ele disse que houve pressa para ler o relatório
ontem, e que o governo se preocupou demais com as repercussões
no mercado financeiro.
No PT também houve reação. O deputado Ivan Valente
(SP) considerou que as condições impostas para a aposentadoria
integral do funcionalismo são muito rígidas e que a reforma
não resolve o problema de 40 milhões de brasileiros que
estão hoje fora do sistema previdenciário.
Embora reconheça que algumas das propostas da reforma são
bastante rigorosas, o líder do PT, deputado Nelson Pellegrino (BA),
fez questão de elogiar o trabalho de Pimentel, especialmente a
manutenção da paridade.
Já o presidente do PT, José Genoino, disse ser contra a
paridade entre os salários dos servidores ativos e inativos.
Outro crítico severo da proposta para os pensionistas é
o líder do PTB, Roberto Jefferson (RJ). Segundo ele, a redução
do teto de isenção de R$ 2.400 para R$ 1.058 será
um sacrifício brutal, sobretudo com o desconto dos 11% da contribuição
previdenciária. Para Jefferson, ainda há tempo para discutir
e alterar a proposta, apesar de ver avanços no relatório.
O líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), disse que o partido
está satisfeito porque as mudanças não quebram a
espinha dorsal da reforma e preservam o direito adquirido dos servidores
com a aposentadoria integral e a paridade.
O líder do PPS, Roberto Freire (PE), também não
gostou da condução política da reforma, que considerou
apressada.
Para o deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ), o governo fez o discurso de
que a reforma era o mal menor e que abriria caminho para o crescimento
da economia, mas sabia que não poderia manter sua proposta original.
Apitaço e confusão no
Congresso
BRASÍLIA. Com faixas, apitos e usando nariz de palhaço,
servidores públicos contrários à reforma da Previdência
foram ao Congresso protestar. Enquanto o governo acertava os detalhes
finais do projeto que queriam derrubar, os funcionários gritavam
palavras de ordem: "Ô Lula, onde vai você? Vai copiar
o FHC"; "Um, dois, três, quatro, cinco mil, ou pára
essa reforma ou paramos o Brasil"; e ainda "Lula, ano que vem
tem eleição, vão pagar pela sua traição".
Os servidores públicos fizeram uma manifestação
na Esplanada dos Ministérios e um grupo de cem deles tentou acompanhar
das galerias da Câmara a leitura do relatório do deputado
José Pimentel. Os deputados Chico Alencar (PT-RJ) e Jandira Feghali
(PCdoB-RJ) pediram ao presidente da Câmara, João Paulo Cunha
(PT-SP), para abrir as galerias, mas não foram atendidos. João
Paulo informou que apenas 63 pessoas, que estavam com senhas, poderiam
entrar no plenário. Os demais assistiriam à sessão
de dentro do auditório Nereu Ramos, que fica a mais de 100 metros
do plenário.
Chico Alencar classificou a decisão de João Paulo como
antidemocrática. Jandira, por sua vez, disse que o governo estava
com tanto medo dos servidores que queria distância deles do plenário.
Crítica do projeto, a deputada integra a base aliada, mas estava
com os servidores, assim como Alencar e a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).
Na chegada à Câmara, João Paulo Cunha já tinha
enfrentado vaias dos funcionários públicos, que o chamaram
de pelego e traidor. Houve apitaço e muita confusão.
Para evitar os manifestantes, João Paulo mudou seu trajeto até
o gabinete, e não passou pelo Salão Verde, onde estavam
os servidores do Legislativo, que também gritavam muito. Os manifestantes
cantaram o Hino Nacional e trechos de um samba de Beth Carvalho: "
Você tratou com traição/ a quem sempre te deu a mão".
O ministro Ricardo Berzoini, que estava na Presidência da Câmara,
saiu pelos fundos. Mas o vice-líder do governo, professor Luizinho
(PT-SP), não escapou do manifesto irado.
- Isso faz parte do processo democrático - disse, tentando enfrentar
a raiva dos funcionários, sem esconder o desconforto.
José Geraldo (PT-PA) enfrentava os revoltosos:
- Vocês estão é com dor de cotovelo porque nosso
governo está dando certo.
Jandira Feghali afirmava que o projeto é ruim e que houve retrocesso.
- Aprovar o relatório significa assinar cheques em branco - disse
ela, mais tarde, referindo-se aos pontos que serão especificados
em lei ordinária ou complementar: a paridade, o cálculo
dos futuros benefícios e o formato dos fundos de pensão.
- É um projeto ruim e difícil. Não podemos nem dizer
que a previdência complementar para os futuros servidores será
pública, porque essa palavra nem sequer é mencionada no
texto! O projeto não é bom porque desestimula a carreira
pública.
A deputada Alice Portugal informava que o partido vai defender as aposentadorias
integrais e a paridade para o funcionalismo, e vai lutar contra a cobrança
de contribuição previdenciária para aposentados e
pensionistas do setor público.
- Os recuos do governo foram insuficientes - disse.
CUT: ou reforma muda
ou greve ganhará força
Ricardo Galhardo
SÃO PAULO. O presidente da Central Única dos Trabalhadores
(CUT), Luiz Marinho, levará recado duro ao presidente Luiz Inácio
da Silva, com quem se reunirá hoje, em Brasília: se o governo
não incluir algumas propostas da central no texto da reforma da
Previdência, a CUT deverá apoiar a greve dos servidores federais.
- Vamos continuar trabalhando na pressão junto aos líderes
dos partidos e junto ao governo. A greve está mantida pelas entidades
e, se não houver perspectiva de diálogo e negociação,
é possível o fortalecimento da greve - disse.
Ele afirmou não se importar se a declaração for
interpretada como um aviso ao presidente.
- Se o governo quiser entender assim, pode ser.
Considerado cria política de Lula no Sindicato dos Metalúrgicos
do ABC - que dirigiu até dois meses atrás - Marinho deve
engrossar o tom na reunião. Presidente da central que congrega
a maior parte dos servidores públicos, Marinho disse estar muito
insatisfeito com o relatório do deputado José Pimentel.
- Do jeito que está o relatório é altamente negativo,
especialmente para os salários mais baixos. O funcionário
público que ganha baixo salário pode ficar em situação
pior do que o trabalhador da iniciativa privada. Até aqui a reforma
está desequilibrada em favor dos altos salários. Por enquanto
não nos agradou em nada. Se o governo está tentando nos
agradar está trabalhando muito mal - afirmou.
Para o presidente da CUT, a reforma proposta no relatório de Pimentel
está longe de cumprir a função de justiça
social apregoada por Lula. Na reunião, ele defenderá a inclusão
de pelo menos três dispositivos que, segundo a CUT, ajudariam a
equilibrar a reforma em favor dos que ganham menos: retirada do redutor
de 5% ao ano nas aposentadorias de quem ganha até R$ 2.400; proteção
das pensões também até o teto de R$ 2.400 e fim da
taxação dos inativos.
- Estes três pontos em particular fazem com que a central não
tenha absolutamente nenhuma condição de apoiar o relatório,
muito pelo contrário - disse Marinho.
O presidente da CUT admite que as mudanças feitas na proposta
original do governo melhoram a situação dos servidores,
mas avalia que os benefícios ficaram restritos aos que ganham altos
salários.
- Para quem ganha R$ 15 mil vale a pena trabalhar mais sete anos para
ter aposentadoria integral, mas para quem ganha R$ 700 a diferença
da média para a integralidade às vezes nem justifica - disse.
Por isso, embora preveja dificuldades principalmente em função
das pressões dos governadores, o presidente da CUT não se
dá por vencido:
- Esta novela está longe de terminar, vai pelo menos até
setembro. Aquele golzinho de virada é sempre mais saboroso.
Além da possibilidade de greve, Marinho disse que a CUT deve não
só participar, como também organizar protestos contra a
reforma. O principal deles foi marcado para agosto pelas entidades grevistas.
- A manifestação (de agosto) não será apoiada
pela CUT. Poderá ser organizada pela CUT. Nunca dissemos que as
manifestações e pressões não faziam parte
do processo - afirmou Marinho.
Além disso, a CUT pretende realizar pedágios em aeroportos
para pressionar parlamentares e, se preciso, ir às casas dos deputados
e senadores para levar suas reivindicações. Para Marinho,
a reunião de hoje com Lula pode ser um divisor de águas
na postura até agora acanhada da central frente às reformas.
- Espero que o presidente tenha sensibilidade e avalie a questão
de hoje (ontem) para amanhã (hoje) - disse.
Marinho critica metáfora de Lula
Irritado com a falta de respaldo junto ao governo, Marinho chegou a criticar
a metáfora usada pelo presidente para exemplificar a "justiça
social" da reforma: por que uma cortadora de cana tem que trabalhar
até os 55 anos e uma procuradora do estado não?
- Evidentemente a metáfora não serve. Eu diria que o presidente
foi infeliz.
A Força Sindical, que representa quase exclusivamente trabalhadores
do setor privado, também criticou o relatório de Pimentel.
Em nota intitulada "Quem vai pagar a conta?", o secretário-geral
da Força, João Carlos Gonçalves, o Juruna, diz que
a manutenção da integralidade para servidores reduz a capacidade
de investimento do governo e, portanto, impede a realização
de obras. "Isso nos leva a questionar que justiça social é
essa que obriga a maioria dos trabalhadores brasileiros a pagar pelos
privilégios de uma pequena minoria. É justo perguntar: que
tipo de reforma é essa?", critica o texto.

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