quinta-feira, 14 de agosto de 2003
O Globo
Acaba a batalha na Câmara
Isabela Abdala e Adriana Vasconcelos
BRASÍLIA
Para concluir na noite de ontem a aprovação em primeiro
turno da reforma da Previdência e assegurar uma votação
tranqüila em segundo turno, sem a apresentação de destaques,
os líderes do governo tiveram que fazer acordos de última
hora e ceder mais uma vez. Diante da pressão do PFL e setores da
base governista, os negociadores do governo aceitaram diminuir de 50%
para 30% o redutor que incidirá sobre a parcela das pensões
acima do teto de R$ 2.400. O acordo também reduziu de dez anos
para cinco anos o tempo mínimo de permanência no cargo, para
dar benefício integral a quem está perto de se aposentar.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhou as últimas
negociações através de seus líderes e hoje
viaja para o Paraguai. Mas deixou gravado um pronunciamento que deverá
ir ao ar em cadeia de rádio e TV comemorando a aprovação
da reforma da Previdência na Câmara. Pelo acordo, o texto
não sofrerá novas mudanças no Senado.
PTB surpreende e rompe
acordo
No início da noite, o governo ainda foi surpreendido em plenário
com a rebeldia de um partido aliado. O PTB rompeu o acordo firmado no
gabinete do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP),
minutos antes do início da votação e exigiu que os
dois destaques da sua bancada - que na prática, acabavam com o
teto salarial - fossem votados. Mas foi derrotado e o teto mantido, na
votação do primeiro destaque, com o apoio de 436 deputados,
apenas três votos contra - Anivaldo Vale (PSDB-PA), Lavoisier Maia
(PSB-RN) e Eduardo Cunha (PP-RJ) - e 19 abstenções.
Se fosse aprovado, o destaque do PTB permitiria aos parlamentares e servidores
em geral o acúmulo de aposentadoria, pensão e salário,
ultrapassando o teto de R$ 17.170.
- Se estamos aqui diminuindo vantagens de milhares de pessoas não
poderíamos manter as nossas. O Congresso se qualificou com essa
votação - comemorou o deputado Roberto Brant (PFL-MG).
O segundo destaque do PTB possibilitaria a criação de verbas
extras que ficariam fora do teto. O governo venceu essa batalha por 403
votos sim, 27 não e 34 abstenções.
O acordo com o líder do PTB, Roberto Jefferson (RJ), garantia
que os destaques seriam substituídos por uma emenda aglutinativa
e que, portanto, caberia aos autores conseguir os 308 votos. Assim que
João Paulo abriu a sessão, o líder do PTB foi pressionado
pelos deputados Luiz Antônio Fleury (PTB-SP) e Nelson Marquezelli
(PTB-SP) a romper o acordo e exigir a votação em separado
dos destaques.
Rebelião derrotada
com a oposição
Para derrotar a rebelião da base, o governo novamente teve o apoio
da oposição: PSDB e PFL acompanharam a orientação
do líder do governo na Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que
travou um ríspido embate com o líder do PTB, em meio à
votação.
- Nós erramos e vamos pagar o preço por isso, mas a minha
bancada entendeu que tinha que ser paladina. O funcionário público
está sendo punido violentamente com essa reforma - disse Jefferson.
- Não precisamos da proteção da ilustre bancada
do PTB. Nada de errado está sendo votado hoje. Não precisamos
ter medo de nada - respondeu irritado Aldo Rebelo.
As negociações começaram cedo. O presidente da Câmara
promoveu um café da manhã com os líderes e vice-líderes
da base e os ministros da Casa Civil, José Dirceu, e da Fazenda,
Antonio Palocci. A resistência dos ministros em ceder ainda mais
nas pensões para encaminhar um acordo com o PFL sobreviveu apenas
até o final da tarde.
Ao longo do dia, os líderes governistas mostraram ao Executivo
que era melhor aliviar mais um pouco o redutor das futuras pensões
e, com isso, garantir uma votação simplificada na Câmara
e o começo de um entendimento para a tramitação do
texto no Senado. O PFL manteve o destaque que eliminava o redutor das
pensões ciente que seria derrotado: o governo obteve 361 votos,
contra 104 e nove abstenções.
O PT voltou a enfrentar dissidências em sua bancada na votação
do destaque do PFL, que retiraria do texto da reforma da Previdência
o redutor das pensões. Além do voto contrário dos
deputados rebeldes João Batista Babá (PA), Luciana Genro
(RS) e João Fontes (SE), a orientação do líder
do partido, Nelson Pellegrino (BA), não foi seguido por mais oito
parlamentares que decidiram se abster. Os mesmos que já haviam
optado pela abstenção na votação do texto
base do relatório de José Pimentel (PT-CE) na semana passada:
Walter Pinheiro (BA), Paulo Rubem (PE), Orlando Fantazzini (SP), Mauro
Passos (SC), Maninha (DF), João Alfredo (CE) e Ivan Valente (SE).
Já o PCdoB desta vez votou unido a favor do governo. Os 11 deputados
da bancada se posicionaram contra o destaque do PFL. No próprio
PFL, 32 votaram contra o destaque do partido e 33 a favor.
Além de diminuir o percentual do redutor das pensões para
30%, a emenda garantiria o teto de R$ 1.440 para a isenção
da contribuição dos servidores inativos e o aumento da idade
para a aposentadoria compulsória de 70 para 75 anos a partir de
2012. Em troca da retirada de um destaque apresentado pela bancada do
PSDB, os tucanos garantiram a flexibilização das normas
para aposentadoria integral: em vez da exigência de dez anos no
cargo, serão cinco anos no cargo e dez na carreira.
A emenda aglutinativa que reunia as última mudanças foi
aprovada por volta das 23h, com 444 votos a favor, 7 contra e 10 abstenções.
Irritados com a atitude da véspera dos líderes do PT, Nelson
Pellegrino (SP), e do PMDB, Eunício Oliveira (CE), que assinaram
um ofício apoiando a inclusão dos delegados de Polícia
Civil, oficiais da Polícia Militar, auditores e fiscais de renda
dos estados no subteto do Judiciário, de 90,25% dos salários
dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), os demais líderes
da base ameaçaram divulgar ontem uma nota. A nota desautorizaria
a reabertura das negociações sobre o subteto nos estados.
Mas o assunto foi esquecido no decorrer do dia.
Idas e vindas nas regras de pensões
O governo alterou três vezes sua proposta original para a fixação
de valores de pensões deixadas por servidores públicos.
Veja como foram as mudanças:
PROPOSTA ORIGINAL : Todos os benefícios sofreriam um corte de
30%.
PRIMEIRA MUDANÇA: As futuras pensões seriam pagas na integralidade
até o limite de R$ 1.058. O valor acima desse teto ficaria sujeito
a lei complementar que poderia reduzir até 70% do pagamento.
SEGUNDA MUDANÇA: As futuras pensões seriam pagas integralmente
até o teto de R$ 2.400 e o restante teria uma redução
de 50%.
TERCEIRA E ÚLTIMA MUDANÇA : O governo aceitou reduzir o
corte nas pensões. A integralidade das futuras pensões será
até o limite de R$ 2.400. Acima disso, o redutor será de
apenas 30%.

|