sexta-feira, 15 de agosto de 2003

O Globo

Lula: ‘O pior já passou’
BRASÍLIA

Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou a aprovação da reforma da Previdência pela Câmara, em primeiro turno, para fazer um balanço dos sete meses de governo e prometer, novamente, a retomada do crescimento. Ao comemorar a aprovação da reforma em cadeia nacional de rádio e TV, Lula agradeceu o apoio da oposição e disse que “o pior já passou”. Mandou também duro recado aos sem-terra e aos ruralistas: não admitirá radicalização, não permitirá o confronto e não compactuará com ilegalidades.

No pronunciamento de dez minutos e 50 segundos, Lula disse que controlou a inflação, iniciou a queda de juros e conseguiu aumentar as exportações. Admitiu dificuldades e pediu mais tempo e paciência.

REFORMA DA PREVIDÊNCIA: “Nunca governo algum conseguiu aprovar na Câmara, em três meses e meio, reforma tão importante para o futuro do país, que garante o futuro de aposentadorias e pensões, traz maior equilíbrio às contas e, de forma definitiva, elimina no serviço público os altos salários e aposentadorias absolutamente incompatíveis com a realidade brasileira. Além disso, interna e externamente, o Brasil dá demonstração de que já não foge dos seus principais problemas; ao contrário, os enfrenta com firmeza e determinação. (...) O Brasil agradece o patriotismo que eles demonstraram (parlamentares, governadores). E o maciço apoio do povo, sem o qual não se resolverá nenhum grande problema. Tenho certeza que, passada a emoção, todos reconhecerão a importância da reforma para o futuro do nosso país e dos nossos filhos e netos.”

REFORMA AGRÁRIA E MST: “Neste momento, o governo, sem alarde, já tem adiantados estudos para o início da reforma agrária, que começará este ano onde ela é mais urgente. Fui eleito para mudar o Brasil, mas não de qualquer jeito. Fui eleito para mudar para melhor e, sobretudo, em paz. É o que vou fazer. Não compactuarei com nenhum tipo de ilegalidade. A lei será cumprida ao pé da letra. Chamo a atenção dos sem-terra e dos proprietários rurais: o governo tem seu tempo e seu prazo, e a radicalização não beneficia ninguém. Todos sabem que somos comprometidos com mudanças e justiça social. Uma reforma agrária organizada, justa e pacífica é dos meus maiores compromissos. Mas isso não se faz do dia para a noite.”

CRESCIMENTO ECONÔMICO E MÁGICA: “Era preciso, antes, vencer a inflação que disparava no fim do ano passado. Isso nós já fizemos. Depois, era preciso que os juros começassem a baixar. Isso já está acontecendo. Agora, não vou enganar vocês: não existe mágica. Ou começamos a entender que para fazer as coisas direito, e bem feitas, é preciso um pouco mais de tempo, ou o Brasil vai viver eternamente de improviso em improviso, de sobressalto em sobressalto. Planos econômicos mágicos não funcionam. Essa lição o passado já nos mostrou de forma clara e dura. E a classe média e o povo pobre, sempre, são as maiores vítimas.”

SOBRESSALTOS: “Chega de sobressalto! Vamos resolver nossos problemas com calma e com segurança. O pior já passou, meus amigos, posso garantir isso a vocês. Estamos no caminho certo. E tenham certeza, as boas notícias estão começando a chegar.”

SETE MESES DE GOVERNO: “Controlamos a inflação, reduzimos o risco Brasil e recuperamos a confiança do nosso país no exterior. Isso está possibilitando a redução das taxas de juros, fundamental para a retomada do crescimento econômico. Visitamos 12 países abrindo mercados para nossos produtos. (...) Isso, e muito mais coisas, em apenas sete meses. E ainda tem gente reclamando! Tenham certeza: um a um, os grandes problemas serão enfrentados. Sempre de maneira equilibrada, serena e democrática. E de maneira firme e decidida”.

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Genoino: os petistas que se abstiveram não ficarão impunes


SÃO PAULO e BRASÍLIA. A reincidência dos oito parlamentares petistas que anteontem se abstiveram na votação de destaques ao texto básico da reforma da Previdência não passará impune pela direção do PT. O presidente nacional do partido, José Genoino, garantiu ontem que não há lista negra com o nome dos deputados, mas que a direção não fará vista grossa à decisão dos dissidentes. Caberá ao diretório nacional, em setembro, decidir sobre a punição.

O grupo dos oito rebeldes — Walter Pinheiro (BA), Chico Alencar (RJ), Paulo Rubem (PE), Orlando Fantazzini (SP), Mauro Passos (SC), Maninha (DF), João Alfredo (CE) e Ivan Valente (SP) — divulgou nota dizendo que não tinha prazer em votar contra o governo e que só o fez por ter chegado a uma situação-limite. Mesmo reiterando que não querem sair do PT, os deputados insistiram não poder aceitar que o partido saia da trilha da coerência histórica e do compromisso com a mudança.

— A Previdência não vale uma dissidência. É uma rima, mas não uma solução. Para nós, é doloroso votar contra a decisão do partido. Das nove emendas consensuais, apenas uma foi contemplada (diminuição do redutor das pensões) e os louros ainda ficaram para o PFL — disse Chico Alencar.

Genoino: “Espécie de ‘não’ envergonhado”

Genoino continuará apelando para que o grupo não rompa o pacto partidário na votação em segundo turno na Câmara e também no Senado.

— Na verdade, os oito deputados votaram uma espécie de não envergonhado.

Ele foi incisivo ao comentar a posição dos três deputados que ontem votaram contra as emendas da reforma. Da chamada ala radical do PT, João Fontes (SE), Luciana Genro (RS) e João Batista Babá (PA) mantiveram a posição contra o texto básico da reforma.

— Esses parlamentares não são mais do PT, apenas estão com a sigla do PT. Eles deveriam ter coerência e pedir para sair (do partido) — disse.

Novas mudanças na reforma da Previdência desagradam a Berzoini
Catia Seabra

BRASÍLIA.Ainda que se dizendo satisfeito com a aprovação da reforma na Câmara, o ministro da Previdência Social, Ricardo Berzoini, manifestou ontem sua contrariedade com a decisão dos deputados de elevar para R$ 2.400 o limite acima do qual as pensões sofrerão redução e reduzir o percentual de corte para 30%, em vez dos 50% que constavam do texto básico.

Alegando que essa nova concessão garantirá pensões incompatíveis com os padrões internacionais, Berzoini afirmou preferir a aprovação da proposta pela qual seria garantida a integralidade só até os R$ 1.200, como constava do relatório aprovado na comissão especial.

— Essa fórmula seria a mais correta para evitar pensões de longa duração com valores muitos elevados. Com o texto aprovado, quem tem remuneração de R$ 4.500, por exemplo, vai receber R$ 3.800. É uma remuneração muito elevada para os padrões internacionais. É só pesquisar — disse o ministro.

Para ele, esse foi um dos pontos em que a negociação passou dos limites desejáveis, mesmo que preservada a essência da reforma.

— Na questão das pensões, fizeram mais mudanças do que eu gostaria. É óbvio que eu preferia a proposta original. Mas, para deputados, a pensão era simbólica. E seria ilusão acreditar que a proposta seria mantida.

Ministério ainda calcula impacto do novo texto

Apesar disso, o ministro repetiu que está contente com o resultado da proposta, graças à manutenção de medidas que exigem a permanência do funcionário por mais tempo no serviço público.

— Estou feliz. O coração da reforma foi preservado.

Mas, citando o colega Gilberto Gil, da Cultura, Berzoini admitiu:

— Obviamente eu citaria um, dois pontos, em que se passou do limite do que eu desejava. Mas, como disse meu colega Gilberto Gil, a perfeição é uma meta perseguida pelo goleiro da seleção...

Segundo ele, o ministério ainda calcula o impacto do novo texto em comparação à proposta originalmente enviada pelo governo ao Congresso. Cálculos preliminares apontariam uma queda estimada em cerca de R$ 3 bilhões da expectativa de economia ao longo de 20 anos: em vez de poupar R$ 52 bilhões, a economia, será de R$ 49 bilhões. Os números oficiais só serão divulgados na semana que vem.

“Uma luta intensa para manter o texto”

Agora, a briga de Berzoini será para que a reforma não sofra alteração no Senado. Frisando que respeita a autonomia da Casa, o ministro disse que lutará pela manutenção da redação atual.

— A idéia é preservar. Fazer uma luta intensa para manter o texto — disse ele.

Além da ampliação das exigências para a concessão de aposentadoria, o ministro se disse satisfeito porque o governo cumpriu o calendário idealizado para a tramitação da reforma, permitindo que outras leis sejam aprovadas até o fim do ano. O ministro reconheceu, porém, que a lei complementar fixando o modelo dos fundos de pensão será ainda objeto de muita discussão.

— O governo não tem pressa. Mas também não tem falta de pressa — disse.

 

As concessões


APOSENTADORIA INTEGRAL

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: Fim da aposentadoria integral para atuais e futuros servidores. Criava o benefício médio. A aposentadoria seria calculada com base na média das contribuições.

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: Fim da aposentadoria integral apenas para os futuros servidores. Os atuais funcionários públicos poderiam se aposentar com o mesmo salário da ativa desde que tivessem 55 anos e idade e 30 de contribuição (no caso das mulheres) e 60 anos de idade e 35 de contribuição (no caso dos homens). Eles teriam de cumprir outras duas exigências: 20 anos no serviço público e dez anos no último cargo

O TEXTO APROVADO: As regras previstas no relatório foram mantidas, à exceção de uma: os atuais servidores, para ter direito à aposentadoria integral, terão de ficar cinco anos no último cargo.

PEDÁGIO

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: O cálculo do benefício para quem se aposentasse antes de cumprir todas as exigências seria feito pela média de salários desde julho de 1994, com redutor de 5% para cada ano de aposentadoria antecipada.

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: O mesmo que o texto original

O TEXTO APROVADO: O redutor baixou de 5% para 3,5% para cada ano de aposentadoria antecipada, mas só para os servidores que se aposentarem em 2004 e 2005.

PARIDADE

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: Não previa a paridade entre os reajustes dos servidores da ativa e os inativos

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: Garantia a paridade. Os servidores aposentados teriam datas e valor de reajustes iguais aos dos servidores da ativa

O TEXTO APROVADO: A paridade só será garantida para quem se aposentar cumprindo todos os requisitos, mas ela só será regulamentada em lei ordinária

PENSÕES

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: Todas as pensões seriam reduzidas em 30%

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: Para os atuais pensionistas, ficava mantida a pensão integral. As futuras pensões seriam pagas integralmente até o limite de R$ 1.058. O que excedesse esse valor sofreria redução de até 70%

O TEXTO APROVADO: As futuras pensões terão redução de 30% na parcela do benefício que exceder R$ 2.400.

TAXAÇÃO DE INATIVOS

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: Estabelecia a taxação dos servidores inativos a partir da faixa de isenção de R$ 1.058. A alíquota de 11% incidiria sobre a parcela do benefício superior a R$ 1.058

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: O mesmo que o texto original

O TEXTO APROVADO: Prevê a taxação dos servidores inativos da União em 11% no que exceder R$ 1.440. Nos estados e municípios, eles serão taxados no que exceder R$ 1.200.

TETO PARA OS SERVIDORES

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: Todos os servidores passariam a receber, no máximo, R$ 2.400 quando se aposentassem. Quem quisesse complementar sua aposentadoria teria de contribuir para um fundo de pensão complementar

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: Nenhum servidor que fosse admitido a partir da aprovação da reforma se aposentaria com mais de R$ 2.400

O TEXTO APROVADO: Estabeleceu as mesmas regras previstas no relatório

SUBTETO PARA JUÍZES

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: O subteto dos juízes estaduais seria correspondente ao salário dos governadores

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: O subteto para os juízes estaduais corresponderia a 75% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Para os juízes federais, seria o salário de ministro do STF.

O TEXTO APROVADO: O subteto para o Judiciário nos estados corresponderá a 90,25% do salário do ministro do STF

TETO DOS TRÊS PODERES

O QUE PREVIA O TEXTO ORIGINAL: O teto dos três poderes foi fixado em R$ 17.170

O QUE PREVIA O RELATÓRIO: Não houve mudança

O TEXTO APROVADO: Para o Executivo, o máximo será o que ganha o governador do estado. Para o Legislativo, o limite é o salário dos deputados estaduais.