segunda-feira, 18 de agosto de 2003

O Globo

Lula aceita 'negociaçãozinha'

Em uma longa entrevista de mais de 40 minutos, exibida ontem em quatro blocos pelo "Fantástico", o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que vai aprovar a reforma tributária ainda este ano. O presidente garantiu que a reforma não vai aumentar a carga de impostos sobre o setor produtivo e que, se for preciso, ele cederá nas negociações. Na reforma da Previdência, o governo teve de fazer várias concessões em relação à proposta original para conseguir aprovar o texto na Câmara.

- Nós vamos fazer a reforma tributária de comum acordo. Se precisar ter uma negociaçãozinha ali outra aqui, desde que você não fira o núcleo da proposta, que é diminuir a carga tributária para o setor produtivo, nós vamos fazer - afirmou o presidente.

A entrevista do presidente reforçou a audiência do "Fantástico". O programa saltou de 38 para 43 pontos no Ibope quando as imagens do presidente e da primeira-dama foram ao ar, índice considerado elevado para o horário. Ao longo da conversa com os apresentadores Pedro Bial e Glória Maria, Lula fez um balanço dos primeiros meses do seu governo e refutou as acusações de que o PT está aprovando agora as reformas que obstruiu quando estava na oposição. Segundo Lula, o governo Fernando Henrique só não aprovou as reformas antes porque não quis.

- Essa é a única acusação que eu não aceito. Como é que pode um partido (o PT) que tem 100 deputados juntar mais 300 e fazer a votação (da reforma)? E como é que meu antecessor, que tinha 400 deputados, diz que foram os outros 100 que atrapalharam? Se eles tivessem vontade eles teriam feito e, na verdade, eles não tiveram vontade - afirmou o presidente.

Lula condena vandalismo

Indagado a respeito das manifestações em frente ao Congresso Nacional de militantes contrários à reforma da Previdência, Lula considerou uma insanidade atitudes como a dos servidores que quebraram as vidraças do Congresso. Ele disse que se fosse o presidente da Câmara, entraria com processo na Justiça para exigir que os servidores envolvidos nas manifestações pagassem os prejuízos causados.

- Aquilo depõe contra o movimento. Modéstia a parte, fui um dirigente sindical importante. E fiz todas as passeatas que um ser humano pode fazer e nunca quebramos nada - comparou Lula.

Lula descartou ainda a intenção de candidatar-se à reeleição nas eleições presidencias de 2006. Embora acredite que quatro anos de mandato não sejam suficientes, o presidente defendeu a alternância de poder, citando como exemplo o caso do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

- Sou contra a reeleição. Não acho que tudo deva ser feito por um só homem. Tem que ter uma equipe, um partido que o suceda. Meu antecessor, se não tivesse buscado a reeleição, teria saído do governo como um deus - disse o presidente.

Mas as farpas não foram destinadas apenas aos opositores. Lula criticou também aliados históricos do PT, como o MST, afirmando que a reforma agrária que o movimento quer é diferente daquela que será feita pelo governo petista. O presidente garantiu que fará valer as leis do país numa advertência direta às declarações do coordenador do MST, João Pedro Stédile, de que mil sem-terra não perderiam para um fazendeiro.

Sempre bem-humorado, Lula caminhou pelos jardins do Alvorada ao lado do ministro Antônio Palocci, tirou a pressão arterial, alimentou peixes e ainda discutiu com um empregado a melhor maneira de alimentar as emas que passeiam pela área externa do palácio.

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Relatório será apresentado hoje à comissão
Isabel Braga

BRASÍLIA. O relator da reforma tributária, deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), apresenta hoje o texto final à comissão especial. Depois de lido, o relatório será submetido a vistas por duas sessões e poderá ser discutido e até votado na comissão na próxima quinta-feira.

- No geral vou cumprir o que sempre disse que faria: apresentar um relatório sem surpresas - avisou Virgílio, sem no entanto dar detalhes sobre o texto final.

O governo trabalha com a possibilidade de votar a reforma tributária o mais rapidamente possível na Câmara, para que as principais mudanças sejam negociadas no Senado. O relatório deverá contemplar reivindicações do setor empresarial, como a desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a aquisição de bens de capital em investimentos das empresas. O relatório também deve incluir a manutenção das isenções de impostos na Zona Franca de Manaus por dez anos.

Para atender aos estados, o relatório trará a criação de um fundo constitucional que compensa as perdas pela desoneração do ICMS nas exportações. A unificação das alíquotas do ICMS está prevista mas o relator tinha dúvidas, até ontem à noite, sobre as regras de transição para a cobrança do imposto. Uma das hipóteses mais fortes é estabelecer um prazo de dez anos para que a cobrança passe da origem para o destino dos produtos.

Novos impostos só entrarão em vigor após 90 dias

Virgílio Guimarães incluirá uma garantia aos contribuintes: novos impostos terão necessariamente de aguardar um prazo de 90 dias, após a aprovação pelo Congresso e promulgação da lei, para entrarem em vigor. Hoje, apenas as contribuições estão expostas à chamada noventena.

O relator também deve estabelecer que o novo imposto que substituirá a CMPF não poderá ter alíquota superior a 0,38%. Para as contas do governo federal fica garantida a prorrogação da CMPF até ela se tornar permanente e a Desvinculação das Receitas da União (DRU), que permite maior flexibilidade no uso dos recursos financeiros.
COLABOROU Isabela Abdala

Os principais pontos

DESVINCULAÇÃO: Mantém a Desvinculação de Receitas da União (DRU)

CPMF: Transforma a CPMF em imposto permanente, a CMF. O relator deverá incluir o percentual de 0,38% como alíquota máxima.

UNIFICAÇÃO DO ICMS: Unificação das 44 alíquotas de ICMS cobrada nos 27 estados. O relator ainda estuda a possibilidade de incluir a mudança da cobrança do imposto, na origem para o destino, num prazo de 10 anos.

ISENÇÕES: Também deve ser incluído no texto um prazo de dez anos para as isenções de impostos (IPI, ICMS) na Zona Franca de Manaus.

NOVENTENA: Estabelece um prazo de 90 dias para impostos aprovados pelo Congresso entrarem em vigor. Hoje, apenas as contribuições devem cumprir a chamada noventena.

CESTA BÁSICA: Reduz e, em alguns casos, isenta tributos cobrados sobre bens de consumo popular, como alimentos incluídos na cesta básica e medicamentos.

DESONERAÇÃO: Estabelece a desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a aquisição de bens de capital para investimentos das empresas. Acaba com a cumulatividade na cobrança da Cofins. Garante a desoneração do ICMS nas exportações. Prevê a desoneração em 50% da contribuição previdenciária patronal.

FUNDO PARA OS ESTADOS: Criação do Fundo Constitucional para compensar perdas de estados com a desoneração das exportações.