terça-feira, 19 de agosto de 2003

O Globo

Governo adia votação do 2° turno para dia 27
Para não pôr quórum em risco, sessão não será na quinta-feira

BRASÍLIA. Mesmo tendo conseguido garantir o quórum mínimo para a realização de uma sessão ordinária na Câmara dos Deputados ontem, o governo desistiu de votar esta semana o segundo turno da reforma da Previdência. Isso porque a votação só poderia ser realizada numa sessão extraordinária na quinta-feira à noite, uma vez que é exigido um intervalo mínimo de de cinco sessões ordinárias entre um turno e outro.

Como a maior parte dos parlamentares costuma retornar para seus estados na quinta-feira, o governo preferiu não correr nenhum risco com um possível quórum baixo e adiou a votação para o próximo dia 27, uma quarta-feira.

- Estamos dentro do calendário. Por isso, não vai haver problema se adiarmos a votação do segundo turno da reforma para a próxima semana - explicou o vice-líder do governo, Professor Luizinho (PT-SP).

O deputado negou que a falta de quórum na Câmara na última sexta-feira - quando o quórum mínimo de 51 deputados não foi atingido pela falta de um parlamentar - tenha comprometido o andamento da reforma da Previdência. Pelo contrário, o vice-líder do governo está tranqüilo em relação à aprovação da reforma da em segundo turno.

Na sua avaliação, nem mesmo a troca de farpas entre o PFL e o chefe da Casa Civil, José Dirceu, devem abalar o acordo firmado entre o governo, os partidos da base e a oposição na semana passada.

"Não há possibilidade de o acordo não ser cumprido"

- Não há possibilidade de um acordo desse porte não ser cumprido. Votaremos o texto sem alterações e há um compromisso para que nenhum partido apresente destaques para votação em separado - apostou Luizinho.

As atenções do governo nesta semana deverão estar voltadas para a votação do relatório da reforma tributária, apresentado ontem à noite pelo deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), para a lei de falência e para o projeto do primeiro emprego.

REFORMAS: 'O PT VOTOU UNANIMEMENTE CONTRA TODAS AS PROPOSTAS APRESENTADAS PELO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE'

PSDB reage a Lula: PT impediu sim a reforma de FH

Arthur Virgílio: 'O presidente é mal-agradecido. Temos de ajudá-lo a governar, porque a base dele não dá no couro'

BRASÍLIA. Líderes do PSDB e do PFL no Congresso reagiram ontem à afirmação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que, em entrevista ao "Fantástico", da Rede Globo, disse que o PT não impediu a aprovação da reforma da Previdência no governo Fernando Henrique e que, na verdade, seu antecessor não fez as mudanças no sistema previdenciário porque "não teve vontade". Lula fez a afirmação quando comemorava o fato de já ter conseguido aprovar a reforma em primeiro turno na Câmara.

O líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), lembrou que a oposição deu votos à reforma da Previdência de Lula na Câmara e criticou o comportamento da atual base governista:

- O presidente é mal-agradecido. Temos de ajudá-lo a governar, porque a base dele não dá no couro. O presidente não está vendo o dia-a-dia dos líderes dele no Congresso. Eles sabem o quanto é necessário agradar às oposições, ser cordial e sensato. O presidente não consegue falar de improviso. Falou sem ter nada para comemorar, fez uma espécie de micareta, um carnaval fora de época - disse o senador.

Virgílio admitiu que havia defecções na base parlamentar de Fernando Henrique e atribuiu-as também à estratégia do PT de satanizar parlamentares que defendiam as reformas com fotos em painéis públicos e recepções ruidosas nos aeroportos:

- Aquelas coisas fascistóides que faziam, de acuar com aqueles outdoors e aquelas encenações, pesaram para algumas pessoas. Diziam: "Vou perder a eleição". Isso fez com que alguns recuassem.

O vice-presidente do PSDB, deputado Alberto Goldman (SP), lembrou que o próprio presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), admitiu recentemente que seu partido votou contra a reforma porque queria o poder. Em abril, João Paulo afirmou que o PT se opôs às reformas apresentadas no governo passado não por razões ideológicas, mas pela disputa por poder. Na ocasião, chegou a afirmar que no Congresso havia a base do governo e a base das reformas, esta sim, majoritária. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), também já fizera um mea-culpa sobre a conduta do PT diante das reformas, especialmente a da Previdência, afirmando que poderia ter havido mais empenho.

- Aprovamos a duras penas o que foi possível e o PT votou unanimemente contra todas as propostas apresentadas pelo governo Fernando Henrique. Algumas votações, chegamos a perder por uma diferença de um voto, como por exemplo a taxação dos servidores aposentados e pensionistas - disse Goldman.

Para o deputado, se o PT tivesse tido outro comportamento, talvez hoje o governo tivesse menos problemas para administrar.

- Eles conseguiram aprovar agora a reforma porque nós da oposição tivemos uma postura diferente da deles, e porque, normalmente, nos primeiros meses de um governo, a torcida de toda a sociedade é para que as coisas dêem certo - acrescentou o deputado tucano.

Líder rejeita acusações de falta de ética do PFL

A entrevista do presidente somou-se às declarações do chefe da Casa Civil, José Dirceu, que, na sexta-feira, acusou o PFL de falta de ética ao encampar as reivindicações de prefeitos por uma fatia dos recursos federais. O líder do PFL, senador José Agripino (RN), rejeitou as acusações e afirmou que o partido poderá revidá-las com votos. Segundo ele, as palavras de Dirceu foram um gesto de inabilidade política e estimulam uma oposição radical e inconseqüente, que o PFL não quer ser.

- Não vamos cair na provocação de praticar a oposição radical e inconseqüente. Não seremos o que o PT foi. Temos consciência de que somos minoria, mas mesmo assim tivemos avanços no texto da reforma da Previdência - disse Agripino.