quarta-feira, 10 de setembro de 2003

O Globo

Acordo na tributária beneficia Rio e Minas
Valderez Caetano

BRASÍLIA. O PFL conseguiu impedir ontem que a base do governo desse prosseguimento à votação da reforma tributária. Um acordo de líderes, porém, garantiu uma concessão do governo ao PSDB, garantindo a São Paulo que o fundo das exportações vai cobrir as perdas que o estado tiver com a desoneração do ICMS na venda de bens de capitais. Minas e Rio também foram beneficiados pelo acordo: conseguiram participação no Fundo de Desenvolvimento Regional para as áreas mais pobres dos seus estados.

Os líderes concordaram em incluir a região Noroeste do Estado do Rio e o Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, entre as áreas que receberão recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional.

Durante todo o dia os governistas tentaram um acordo com o PFL numa verdadeira queda-de-braço, sem sucesso. Mas, no início da noite, o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), anunciou que não haveria votação porque o relator da reforma, deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), pediu um prazo maior para analisar com o Palácio do Planalto até onde poderia ceder nas exigências que os representantes do PSDB fazem para votar a favor. Nova sessão para votar as emendas foi convocada para hoje, às 11h.

No meio da tarde, otimista, o presidente da Câmara chegou a afirmar que haveria votação:

- Vamos votar hoje (ontem). Vamos votar os destaques amanhã (hoje). Emenda aglutinativa só será votada se houver acordo. Do contrário, a Mesa da Câmara considera que todas as 38 emendas aglutinativas ficarão prejudicadas pela rejeição dos destaques individuais - disse João Paulo.

Na véspera, o governo já havia recebido informação de que o PSDB aceitava fazer um acordo. Mas somente à noite o PFL concordou em conversar com os líderes governistas.

- Não tem acordo - repetia o líder do PFL na Câmara, José Carlos Aleluia (PFL-BA) nas dezenas de vezes que entrava e saía do gabinete do presidente da Câmara, ao longo do dia.

As negociações com o PSDB tiveram bons resultados no meio da tarde, quando a bancada do partido na Câmara conseguiu do governo praticamente tudo o que queria. Pelo acordo, o governo concordou que o Simples, que simplifica a cobrança de impostos federais para as microempresas, também será aplicado para impostos estaduais e municipais. Além disso, ficou acertado que a alíquota mínima do ICMS será de 4%.

A bancada paulista alegava que, da forma como estava no texto - alíquota de até 4% - os estados poderiam cobrar alíquotas inferiores, prejudicando São Paulo. Os tucanos conseguiram ainda que decisões do Conselho de Política Fazendária (Confaz) só valerão quando tomadas por unanimidade.

O que está em negociação

O QUE O PFL QUER: Definição na Constituição de que os recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional sejam repassados diretamente para os estados;Discriminação da forma de repasse do ICMS aos municípios. O governo sugere que o percentual de 25% da arrecadação seja detalhado por lei complementar.

O QUE FOI ACERTADO COM O PSDB: Ampliação do sistema simplificado de pagamento de impostos pelas microempresas, incluindo impostos estaduais e municipais;Garantia para São Paulo do ressarcimento das perdas pela isenção do ICMS para bens de capital;Inclusão da região Noroeste do Estado do Rio, da Zona da Mata e do Vale do Jequitinhonha, em Minas, entre as beneficiárias dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional;Alíquota mínima de 4% para o ICMS.


Atraso na votação da Previdência

BRASÍLIA. O governo quer votar a reforma da Previdência em primeiro turno no plenário do Senado até o 15 de outubro, uma semana depois da previsão inicial, que teve de ser revista pela exigência da realização de duas audiências públicas na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) para discutir o projeto. A oposição reivindicava número maior ainda de audiências. A primeira está marcada para hoje, provavelmente com o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini. A segunda será realizada dia 16. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), disse que o calendário está sujeito aos acordos entre partidos.

O líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), fez estimativa otimista da tramitação no Senado e considerou pouco provável que a Casa vote mudanças que desfigurem a reforma. Ele considerou a atitude do Senado, sinalizando a manutenção da essência da reforma, importante para consolidar a perspectiva de melhoria dos indicadores econômicos e a trajetória de queda da taxa de juros.

- A ampla maioria das emendas apresentadas repete os temas principais. Acho que a tramitação vai cumprir o prazo previsto - afirmou o líder.

Siafi: governo liberou R$ 75 milhões

BRASÍLIA. Pelo menos oito estados e 120 prefeituras foram beneficiados pela liberação de R$ 75,1 milhões relativos a emendas parlamentares que acabaram sendo autorizadas pelo governo em meio às votações das reformas da Previdência e tributária. O estado de Tocantins, hoje sob o comando do tucano Marcelo Miranda, foi o que mereceu a maior parcela: quase R$ 46 milhões, segundo os números do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siaf).

Na estratégia de tentar rachar a oposição durante as votações das reformas, o governo ainda destinou recursos para o Ceará e São Paulo, ambos governados pelo PSDB.

A bancada de Tocantins votou integralmente a favor da reforma tributária, mesmo tendo pelo menos cinco deputados de partidos de oposição. As liberações beneficiaram ainda os governo do Acre (quase R$1 milhão), do Ceará (R$ 600 mil), de Mato Grosso do Sul (R$ 218 mil), de Pernambuco (R$ 898,3 mil), de São Paulo (R$ 348 mil) e da Bahia (R$ 26 mil).

- Esta é a negociação no varejo. A base aliada negociou no atacado com o PMDB entregando dois ministérios e, no varejo, negociou com os deputados que trocam votos por liberação de emendas - disse o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA).

Segundo os dados do Siaf, no dia 7 de agosto o estado de Tocantins garantiu a primeira grande liberação de recursos: R$ 10,21 milhões repassados pelo Ministério do Transportes. A maior parcela, de quase R$ 20 milhões, foi liberada no dia seguinte. No dia 11 de agosto aconteceram outras duas liberações de cerca R$10 milhões. Na véspera e no dia da votação do relatório do deputado Virgílio Guimarães (PT-MG), na semana passada, foram liberado mais de R$ 7 milhões.

A bancada de Tocantins votou integralmente a favor da reforma tributária, mesmo tendo pelo menos cinco deputados de partidos que fazem oposição ao governo federal.

O governo da Bahia, nas mãos do PFL, ficou com apenas R$ 26 mil, mas vários municípios baianos foram contemplados com as liberações de recursos federais.

A prefeitura de Contagem, em Minas Gerais, foi a que mereceu uma das maiores dotações orçamentárias. O prefeito Ademir Lucas, do PSDB, pôde contar com nada menos do que R$ 1,12 milhão do Fundo Nacional de Saúde. Entre os municípios baianos que mais receberam recursos destacam-se as prefeituras de Caetite com R$ 864.500 e Itiriçu com R$ 451 mil. No Mato Grosso, a prefeitura de Barra do Garça foi brindada com R$ 778.500 da Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

Ministério da Fazenda: verbas não são carimbadas

O Ministério da Fazenda informou que o Tesouro Nacional não tem recursos carimbados. Isto é, quando o dinheiro sai do cofre do Tesouro não é destinado a emendas ou programas específicos. Segundo a assessoria de imprensa do Ministério da Fazenda, as verbas são liberadas segundo o que cada ministério tem direito no decorrer do mês, respeitando o decreto de programação financeira feito a cada dois meses pelo governo federal.

O deputado Paulo Delgado (PT-MG), na defesa do governo, ressaltou que as liberações de recursos orçamentários acontecem todos os dias. Além disso, afirmou ele, o governo Lula tem reafirmado que o critério das liberações não é político. A prova disso, disse Delgado, é a manutenção do superávit fiscal acima 4,25%.

- O governo arrecada e paga todos os dias, com ou sem reformas- disse o deputado petista.