Quarta-feira, 01 de outubro de 2003

O Globo

Tributária atrapalha a reforma da Previdência
Adriana Vasconcelose Lydia Medeiros

BRASÍLIA. Aconteceu o que o governo temia: as negociações da reforma tributária com os governadores acabaram atropelando a reforma da Previdência no Senado. A votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) das 200 emendas ao parecer do senador Tião Viana (PT-AC), prevista para ontem, foi adiada mais uma vez. Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reunia com os governadores na Granja do Torto para tratar da reforma tributária, o líder do governo, senador Aloizio Mercadante (PT-SP), agia como pombo-correio, levando recados dos colegas aos governadores e vice-versa. No fim do dia, os líderes chegaram a um acordo, com a promessa do governo de negociar pontos reivindicados pela oposição: a votação das emendas começa hoje, às 10h, e continua na terça-feira.

Para que a oposição suspendesse o processo de obstrução, o governo se comprometeu a ceder pelo menos num ponto, ainda que sem a concordância dos governadores. Será dobrado o limite de isenção tanto para a contribuição previdenciária de aposentados e pensionistas, quanto para a aplicação do redutor das pensões quando o beneficiário for portador de doença que grave que o torne incapaz.

Nesse caso, ficaria isento da contribuição o servidor inativo que recebesse até R$ 2.880, na União, e, nos estados, até R$ 2.400. Além disso, não haveria redutor para pensões até R$ 4.800. As doenças seriam estabelecidas posteriormente, para atualizar a legislação atual. Casos de hanseníase e tuberculose, por exemplo, eram consideradas motivo de aposentadoria, mas hoje têm cura.

— Os governadores estão informados. São contra, mas chegamos a esse acordo e não haverá obstrução da oposição — anunciou o líder do governo.

Censo previdenciário a cada cinco anos

Apesar da resistência dos governadores a alterar a proposta da Câmara, Viana admite que as mudanças que o Senado fará no texto deverão extrapolar a questão do subteto, das isenções da contribuição previdenciária e do redutor das pensões. Também estaria em estudo a possibilidade de aumento da idade para a aposentadoria compulsória de 70 para 75 anos e de mecanismos de controle social da Previdência, que garantiriam, entre outras coisas, a realização de um censo previdenciário a cada cinco anos.

Para que não haja atraso na promulgação da reforma da Previdência, todas as mudanças seriam incluídas numa nova emenda constitucional que a CCJ apresentaria, mediante acordo de líderes, e seria votada em plenário de forma separada do restante da reforma. Assim, a reforma seria promulgada, e só essa nova emenda seguiria para a Câmara.

O líder José Agripino (RN) ainda protestava ao fim da reunião:

— O acordo não satisfaz. O PFL vai lutar por suas posições no voto.


Ex-líder de FH deverá ser o relator da reforma tributária
Adriana Vasconcelos e Lydia Medeiros

BRASÍLIA. Só amanhã será anunciado formalmente o nome do relator da reforma tributária no Senado. Apesar da certeza da indicação do senador Romero Jucá, do PMDB de Roraima, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Edison Lobão (PFL-MA), atendeu a um pedido do PFL e adiou a divulgação. A decisão foi tomada no fim da tarde de ontem, depois da reunião de líderes. Lobão ficou entre as pressões do seu partido, o PFL, e do PMDB, partido do presidente do Senado, José Sarney (AP), chefe do grupo político do senador.

A escolha fez com que circulasse no Senado a informação de que Lobão teria cedido ao governo graças a indicações de aliados seus para uma diretoria do fundo de pensão dos Correios, Postalis, e para a presidência do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB). Lobão confirma que conhece ambos e que as duas nomeações lhe agradam. José Teixeira, seu suplente na legislatura passada, foi indicado por ele para o Postalis no governo Fernando Henrique e lá permanece, segundo o senador, porque tem mandato. Já Carlos Murilo Goulart Barbosa Lima estaria sendo nomeado para o IRB sem seu aval direto.

Mesmo sem o anúncio oficial, Jucá já assumiu tarefas. Vai preparar uma agenda de audiências públicas para discutir a reforma tributária. O cronograma será submetido à comissão amanhã, após sua nomeação. A escolha de Jucá surpreende pelo fato de o senador, até maio, ter sido do PSDB e um dos principais opositores do governo Lula. Quando o Congresso tomou posse, em fevereiro, era um ardoroso defensor do governo Fernando Henrique e dizia-se disposto a ser um expoente da oposição no Senado. Alardeava que não perderia uma oportunidade de provocar os petistas.

— Passei muito tempo trabalhando, agora tenho o direito de me divertir — dizia Jucá.

Mas ele desistiu da temporada de diversão em maio, ao deixar o PSDB e filiar-se ao PMDB quando o partido consolidava a aliança com o governo. Jucá, de 48 anos, passou a ser um dos mais eficientes colaboradores do Planalto, esforço coroado com a indicação para relator.

— O PMDB no governo Fernando Henrique fazia parte da base. Não saí de uma visão de mundo para outra. Apenas mudei de partido, mas continuo defendendo tudo o que sempre defendi — justifica-se Jucá.

Contra o senador pesa uma ação popular que pede a devolução aos cofres públicos de R$ 17 milhões. Jucá teria, segundo o Ministério Público, se apropriado de uma rádio em Roraima quando foi governador. Ele nega e afirma que quer o assunto julgado o quanto antes.

— A rádio foi comprada da Radiobras e hoje pertence ao governo do estado — afirma.