Sexta-feira, 14 de novembro de 2003

O Globo


Governo tenta nova saída para reforma
Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. Sem conseguir fechar um acordo para ter parte dos votos da oposição, o governo parte para uma nova ofensiva e admite a possibilidade de fazer, por medida provisória, mudanças na reforma da Previdência, seguindo propostas no Senado. Uma medida provisória poderia garantir, por exemplo, o aumento da faixa de isenção da contribuição previdenciária para servidores e pensionistas portadores de doenças incapacitantes para o trabalho. O aumento, porém, somente valeria após alterado o texto da Constituição para introduzir a taxação dos servidores inativos.

Esse foi um dos assuntos discutidos ontem numa reunião entre os senadores Aloizio Mercadante (PT-SP), Renan Calheiros (PMDB-AL), Agripino Maia (PFL-RN), Arthur Virgílio (PSDB-AM), Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Efraim Moraes (PFL-PI). A hipótese, contudo, é polêmica e, segundo os líderes governistas, só avançaria se houvesse um acordo amplo entre todos os partidos.

— Se vier a medida provisória, facilita muito — disse Tasso, que admite a possibilidade de votar a favor de pontos da reforma da Previdência, mas só se não houver uma radicalização nas negociações entre governo e oposição.

O líder do PFL, senador Agripino Maia, deixou claro que seu partido não desistirá de tentar modificar o texto da reforma da Previdência que foi aprovado pela Câmara. E mesmo que o governo edite uma medida provisória incluindo parte do texto da PEC paralela — que reúne até agora todas as mudanças propostas pelo Senado à reforma previdenciária — o PFL deverá manter sua decisão de rejeitar a contribuição de inativos.

— O governo é que sugeriu a medida provisória. Eles conhecem nossas reivindicações e fora disso não há acordo — avisou Agripino.

Mercadante pretende consultar o governo

Mercadante informou que consultará o governo sobre a possibilidade de se antecipar à concretização de aspectos da PEC paralela:

— Vou levar essa questão ao governo. Mas não há qualquer compromisso fechado, nem vou adiantar que instrumento poderia ser usado.

Mercadante causou irritação no governo ao tomar a iniciativa, na semana passada, de negociar com os senadores da oposição a instalação de uma comissão mista para analisar a medida provisória que aumentou de 3% para 7,6% a alíquota da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). Segundo um assessor palaciano, Mercadante não teve respaldo do Planalto, que temia que a comissão mista virasse um palco para ataques ao governo. Por isso, a ordem foi esvaziar o quórum de deputados na Câmara e evitar a instalação da comissão.

— Da próxima vez que Mercadante propuser um acordo, não será feito. Ele demonstrou que não está respaldado — disse o vice-presidente do PFL, senador José Jorge (PE).

Na reunião de ontem, Agripino anunciou que o PFL iria criar uma comissão informal com o PSDB, com o objetivo de convidar especialistas para debater a medida provisória da Cofins.

Acordo permitirá início da votação de 336 emendas

Por enquanto, governo e oposição conseguiram fechar apenas um acordo que permitirá o início da votação das 336 emendas apresentadas em plenário à reforma da Previdência a partir de terça-feira na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A votação da proposta em primeiro turno foi confirmada para dia 25. Sem acordo de mérito, porém, os pontos mais polêmicos deverão ser disputados no voto.
COLABORARAM Lydia Medeiros e Gerson Camarotti

CCJ aprova fim do voto secreto no Congresso

BRASÍLIA. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou ontem por unanimidade projeto de emenda constitucional que acaba com o voto secreto no Congresso. A proposta é do deputado José Roberto Arruda (PFL-DF) e agora passará por uma comissão especial, antes de seguir para dois turnos de votação na Câmara. Em seguida, vai ao Senado. Se aprovada, tornará públicos os votos dos parlamentares para a cassação de mandato, escolha de embaixadores, dirigentes do Banco Central, procurador-geral da República e ministros do Tribunal de Contas da União.

Há três anos, quando era senador, Arruda foi acusado de violar o painel eletrônico do Senado, juntamente com Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), no processo de votação secreta da cassação do então senador Luiz Estevão (DF). Arruda e Antonio Carlos renunciaram aos mandatos em 2001 para escapar da cassação. Foram eleitos em 2002 e absolvidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O deputado disse ontem que, com o projeto, cumpre uma promessa da campanha eleitoral, a de acabar com o voto secreto.

— Não quero com esse projeto justificar meu erro, pelo qual paguei caro, mas transformá-lo numa contribuição à democracia. O voto secreto é um direito do eleitor e não do eleito. Muitos votam de um jeito e saem dizendo outra coisa. Eu vi isso — afirmou o deputado.

Arrecadação federal voltou a subir em outubro: R$ 25,5 bi

Vivian Oswald

BRASÍLIA. A arrecadação de impostos, contribuições federais e royalties voltou a crescer pelo segundo mês consecutivo, fechando outubro em R$ 25,56 bilhões. O resultado foi o segundo melhor para o mês na História, perdendo apenas para os R$ 27,27 bilhões de outubro de 2002, quando a alta do dólar inflou as receitas dos tributos que incidem, principalmente, sobre aplicações financeiras e importações. A queda em relação a outubro do ano passado foi de 6,24%, considerando os efeitos da inflação medida pelo IPCA.

Segundo o secretário-adjunto da Receita Federal, Ricardo Pinheiro, esse resultado se deve, sobretudo, à recuperação econômica e aos esforços de fiscalização da Receita.

Sem ganho extra, resultado na gestão Lula é maior que 2002

Em comparação a setembro, as receitas com tributos e royalties tiveram um aumento real de 17,15%, ou R$ 4,2 bilhões. Contribuíram para isso, além do crescimento econômico, o pagamento de R$ 904,2 milhões em impostos atrasados por um grande banco federal; o recolhimento da primeira cota ou parcela única do IR e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das empresas; e as cinco semanas do mês contra as quatro de setembro.

De janeiro a outubro, a arrecadação acumulada é de R$ 227,82 bilhões, ou R$ 7,59 bilhões a menos do que no mesmo período do ano passado. O principal motivo para essa diferença está nas receitas atípicas obtidas em 2002, de R$ 16 bilhões, contra R$ 4,8 bilhões este ano (cerca de 75% a menos). Descontada a arrecadação extraordinária dos dois anos, o resultado de 2003 supera o de 2002 em R$ 7,2 bilhões.

As receitas obtidas no ano apenas com tributos chegaram a R$ 215,18 bilhões e já estão 0,37% acima do previsto no orçamento.

— Não só vamos alcançar a meta de R$ 253 bilhões para o ano como queremos fechar com folga — disse Pinheiro.

Segundo o secretário, a alta da arrecadação da Cofins, que incide sobre o faturamento das empresas, é um dos indicadores da volta do crescimento econômico. Em outubro, o tributo cresceu pelo terceiro mês consecutivo — 9,18% frente a setembro.

Segundo a Receita, a alta do dólar no ano passado fez com que a arrecadação de outubro de 2002 do IR sobre Rendimentos de Capital, do Imposto de Importação, do IR sobre Remessas ao Exterior e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) superasse a desse ano em mais de R$ 1 bilhão.

IPI: acordo acaba este mês

BRASÍLIA. A recuperação da economia e a retomada das vendas do setor automotivo levaram o governo a desistir de renovar o acordo firmado com as montadoras, que prevê a redução de três pontos percentuais do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). O acordo termina em 15 dias. A partir de então, não valerá mais o desconto no tributo e as alíquotas voltarão ao normal.

— Não precisa mais, porque o mercado deu um sinal claro de que está se recuperando — disse o secretário-adjunto da Receita Federal, Ricardo Pinheiro.

O governo também decidiu isentar as famílias de portadores de deficiência (física, visual, mental ou autistas) do imposto. A partir de hoje, eles já podem comprar carro com isenção do IPI. Antes, o tributo somente não era cobrado sobre os veículos modificados para serem guiados pelos próprios deficientes, o que deixava de fora da lei milhares de pessoas que não podem dirigir.

Segundo as novas regras, a única exigência é que o carro seja de fabricação nacional. Pode ser veículo de passeio ou de utilização mista. Mas o beneficiado terá que comprovar renda e provar que está em dia com o INSS. A medida valerá até 31 de dezembro de 2006. (Viviam Oswald e Geralda Doca)

 

PFL entra com ação no STF contra nova Cofins

BRASÍLIA. Depois do PSDB, ontem foi a vez de o PFL contestar, no Supremo Tribunal Federal (STF), a medida provisória (MP) que acaba com a cobrança em cascata da Cofins e eleva a alíquota de 3% para 7,6%, a partir de fevereiro. Em ação protocolada, o partido considera que a MP é um confisco e quebra o princípio da isonomia, por prejudicar setores da economia como o de serviços.

— Vamos lutar contra um governo que tem fúria arrecadatória e trata o contribuinte como um súdito, ao punir a sociedade com um aumento de 153% da Cofins — afirmou o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC).

Ele reuniu representantes de entidades que afirmam sofrer prejuízo com a MP, editada pelo governo há duas semanas. O presidente da Associação Médica do Brasil (AMB), Eleuses Paiva, projeta aumento de carga tributária para o setor de 70% a 85% sobre o lucro real:

— A maioria das clínicas e hospitais vai se inviabilizar economicamente e, a curto prazo, podemos ter a retirada do setor privado da saúde.

Já o presidente da Associação Comercial de São Paulo, Afif Domingos, disse que escolas preparam aumentos de 15% a 200% nas mensalidades.