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Terça-feira, 18 de novembro
de 2003
O Globo
Lula recebe PMDB hoje para acelerar reforma
Adriana Vasconcelose Ilimar Franco
BRASÍLIA. Enquanto não consegue fechar um acordo com a
oposição para aprovar a reforma tributária, o governo
tenta consolidar os votos dentro da base governista, principalmente no
PMDB, que pressiona pela reforma ministerial. Na semana passada os líderes
governistas já admitiam até adotar a proposta tucana de
reforma em três etapas, sendo a primeira a que trata das medidas
que garantem o ajuste fiscal.
Comandando pessoalmente a articulação, o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva se reúne hoje com a cúpula do
PMDB, entre eles o presidente do Senado, José Sarney (AP), o líder
da bancada, Renan Calheiros (AL), e o relator da reforma tributária,
Romero Jucá (RR). Vai tentar fechar uma estratégia para
acelerar a aprovação da reforma ainda este ano.
Ninguém pode impor reforma, diz Sarney
Mesmo antes do encontro, Sarney disse ontem que a reforma tributária
deve ser de consenso, não imposta pelo governo, e anunciou apoio
à proposta de votação em três fases. O senador
defendeu a votação, até o fim deste ano, das questões
que envolvem a governabilidade, como a prorrogação da CPMF
e da Desvinculação das Receitas da União (DRU), deixando
a unificação do ICMS para o segundo momento.
Mesmo com maioria ninguém pode impor uma reforma. Quando
o presidente Lula convocou os governadores para discutir, ficou tácito
que as mudanças teriam de ser feitas por consenso disse
Sarney.
Ontem, depois de se reunir com Lula, Mercadante deveria se encontrar
com o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) e outros tucanos para bater o
martelo sobre a proposta de divisão da reforma, mas o encontro
com a oposição foi adiado para hoje.
Genoino: O PT não discute
reforma ministerial
Catia Seabra
BRASÍLIA. Participante do jantar que reuniu o chefe da Casa Civil,
José Dirceu, e 22 parlamentares do PT na quinta-feira, o presidente
do partido, José Genoino, negou ontem que o ministro tenha discutido,
no encontro, mudanças no primeiro escalão do governo. Segundo
Genoino, Dirceu não falou sobre ministros no jantar, realizado
na casa de seu assessor Marcelo Sereno. A exceção foi a
ministra da Ação Social, Benedita da Silva. Mas, de acordo
com Genoino, ela foi elogiada por Dirceu:
Dirceu só disse que ela viajou na hora errada. O PT não
se reúne para discutir reforma ministerial. Reforma ministerial
nem passou por lá!
O presidente do PT explicou ainda que foi o deputado Paulo Delgado (MG),
e não Dirceu, quem recomendou ao senador Paulo Paim (RS) que entregasse
o mandato e a vice-presidência do Senado, caso insista em votar
contra a reforma da Previdência. Segundo Genoino, essa foi, porém,
uma brincadeira. O petista admitiu, no entanto, que tanto ele como Dirceu
criticaram Paim.
Eu e José Dirceu dissemos, sim, que com Paim não
há mais acordo. Paim é vice-presidente do Senado graças
a um acordo assumido pelo PT. Apelamos para que ele vote com o partido.
Se não, deve procurar seu caminho disse.
Segundo participantes do jantar, Delgado sugeriu a perda de mandato de
Paim depois de Dirceu fazer duras críticas ao comportamento do
senador petista.
Paim rebate críticas em discurso no Senado
Sem ter sido convidado para o jantar, Paim aproveitou um discurso sobre
a semana da consciência negra para dizer que ninguém vai
tirar dele o direito da palavra e do voto.
Deus, só existe um. Devo meu mandato aos eleitores. E a
vice-presidência do Senado ao voto dos senadores. Tive 2,2 milhões
de votos e só quero um pouco de respeito disse Paim no plenário.
Em seguida, em entrevista, e sem citar o nome do ministro, o senador
comparou Dirceu ao general Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil
no governo Geisel, e a Duque de Caxias, que teria massacrado os lanceiros
negros na Revolução Farroupilha. Paim disse que o Império
fez um acordo com os lanceiros para anistiá-los e, ao fim da guerra,
voltou atrás e determinou o massacre dos negros que participaram
do movimento.
O todo-poderoso de hoje quer fazer a mesma coisa com a sociedade
brasileira que foi feita pelo todo-poderoso de ontem comparou Paim.
Em resposta, Genoino pediu respeito com José Dirceu.
Comparar o ministro Dirceu com forças repressoras é
de um desrespeito inaceitável. Dirceu está pagando por uma
brincadeira que um deputado (Paulo Delgado) fez... justificou Genoino.
Ainda segundo Genoino, Dirceu está se sentindo traído porque,
no jantar, pediu aos participantes que não tornassem público
o teor das conversas.
Estão usando de intriga para desestabilizar o ministro
acusou Genoino.
Opinião
MP 135, prós e contras
MARCÍLIO MARQUES MOREIRA
A recente Medida Provisória 135 merece aplauso, na medida que
elimina o efeito cascata da Cofins. Há que registrar, entretanto,
que, em compensação, embute efeitos perniciosos para a economia
como um todo e para muitos setores relevantes, ao mais do que dobrar a
alíquota, de 3% para 7,6%. Serão atingidos, sobremaneira,
os setores industriais que não estão inseridos em longas
cadeias produtivas, os setores econômicos que trabalham com estreitas
margens de remuneração sobre faturamento e todos aqueles
que, por sua própria natureza, não terão créditos
a compensar.
Dos principais objetivos da reforma tributária desoneração
das exportações, dos investimentos e da produção;
unificação da legislação do ICMS; fim da guerra
fiscal; alargamento da base contributiva; e simplificação
do sistema tributário muito ficou de fora na atual versão
da reforma. Ela parece, agora, privilegiar a prorrogação
da Contribuição Provisória sobre Movimentação
Financeira e a Desvinculação das Receitas da União.
E a MP 135, não obstante sua louvável motivação
original, acabou agravando a frustração que já vinha
se acumulado no empresariado.
Qualquer reforma tributária, para merecer este nome, terá
de simplificar o cipoal sufocante em que se transformou o nosso sistema
de tributação e ampliar-lhe a base de contribuintes, sem
agravar a carga total. Se isso não ocorrer, continuará eficiente
em arrecadar, o que inegavelmente é, mas ineficaz em termos econômicos,
continuando como freio que prejudica os efeitos positivos da bem-sucedida
política macroeconômica do governo Lula. O Brasil tem hoje
carga tributária de 36% do PIB, muito superior à de países
congêneres em estágio de desenvolvimento. Perversa e complicada,
abrange inúmeros impostos, contribuições e paratributos,
que por sua vez se desdobram em amplo leque de alíquotas.
É preciso, portanto, corrigir essas graves distorções,
desonerando a produção, o trabalho, o investimento e as
exportações. Ao mesmo tempo, urge promover justiça
social, em benefício dos desprovidos dos frutos do progresso, o
que se atingirá muito mais pelo redirecionamento da despesa do
que pela progressividade dos impostos. E, paradoxalmente, estudos criteriosos
mostram que, no Brasil, a despesa pública tem beneficiado muito
mais os quase-ricos ou os menos pobres do que os realmente desprivilegiados.
Ao procurar desonerar as cadeias produtivas, longas e complexas, típicas
de uma economia industrial moderna, não se pode fazê-lo onerando
mais ainda as empresas verticalizadas ou unifásicas, ou outros
setores essenciais à vitalidade econômica do país.
O setor de serviços, por exemplo, que será fortemente atingido,
gera mais da metade do produto nacional. Abriga, de um lado, muitas das
atividades de ponta da sociedade do conhecimento, e de outro, aquelas
empresas que mais empregam mão-de-obra, justamente um dos objetivos
que, em boa hora, o governo escolheu como prioritários.
O conhecimento é, por natureza, cumulativo. Seus atores mais criativos
têm, portanto, de inserir-se em redes de conhecimento verdadeiras
networks que se realimentam continuamente. Essa fértil cadeia
seria gravemente onerada pelo brutal incremento do ônus tributário
que sobre ela recairia, sem a possibilidade de qualquer compensação,
eis que se trata de cadeias produtivas intangíveis.
Há que ressaltar, ainda, as peculiaridades inerentes aos médios,
pequenos e microempresários, cuja circunstâncias especiais
não foram suficientemente atendidas na reforma. A continuar o peso,
a complexidade e a burocracia fiscalizatória e não
me refiro só à parte tributária que pesa sobre
essas empresas, serão elas ainda mais fortemente expelidas para
a informalidade, e já existem nove milhões de empresas informais
no Brasil! Os prejuízos para o fisco, a previdência, os trabalhadores
e os próprios empresários seriam pesados, enquanto os consumidores
seriam duplamente onerados, agora que a Cofins foi estendida, também,
a todos os produtos importados.
É da maior relevância, portanto, que o Congresso Nacional
venha a corrigir as distorções embutidas na MP 135, para
reverter essa situação inquietante, possibilitando ao empresariado
grande, médio e pequeno especialmente ao empresariado carioca
e fluminense, eis que nossa economia é, predominantemente, de serviços
continuar contribuindo para a incipiente recuperação
econômica do país e para o impostergável enfrentamento
de nossa pesada dívida social.
MARCÍLIO MARQUES MOREIRA é presidente
da Associação Comercial do Rio de Janeiro.

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