Sexta-feira, 28 de novembro de 2003

O Globo

Governo consegue manter texto da Previdência

Adriana Vasconcelos e Lydia Medeiros

BRASÍLIA. O Senado concluiu ontem a votação em primeiro turno da reforma da Previdência. O segundo turno deve ocorrer até o dia 10. A promulgação será feita logo em seguida, quando as novas regras de aposentadoria entram em vigor. Ontem, o governo conseguiu derrubar os oito principais requerimentos da oposição que tentavam alterar pontos importantes. Entre eles, o fim da aplicação de um redutor das pensões e a ampliação da faixa de isenção para a taxação dos servidores inativos, além de iniciativas para flexibilizar a aplicação das novas regras para quem está perto de se aposentar.

PMDB impôs única derrota do dia ao governo

Mas a vitória não foi completa. Com a ajuda involuntária do petista Paulo Paim (RS), que se atrasou para a votação, o PMDB impôs a única derrota do dia ao governo. Metade de seus 22 senadores aliou-se à oposição para suprimir o artigo que devolveria à União o monopólio do pagamento de seguros de acidentes de trabalho nos setores público e privado.

— Todo mundo sabe que quem derrotou o governo foi o PMDB — disse Paim.

O líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), minimizou a derrota, afirmando que a mudança não terá qualquer efeito prático imediato, já que a privatização exigiria a aprovação de uma lei complementar.

— Não há qualquer possibilidade de o governo privatizar o seguro de acidentes de trabalho. Até 2010 isso não muda — disse ele, numa referência a uma possível reeleição de Lula.

Desde terça-feira, o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), vem medindo forças com o governo, irritado com a demora de Lula em anunciar o espaço que o partido terá na reforma ministerial. Somente após uma reunião ontem de manhã com o senadores do PMDB é que ele concordou em manter o texto da Câmara que estabelece três subtetos estaduais.

Renan exige que PMDB faça redação final da PEC

Mesmo assim, Renan exigiu que o PMDB faça a redação final do dispositivo da PEC paralela — que reúne as mudanças do Senado à reforma da Previdência — que possibilitará aos estados adotar um subteto único. Ele também cobrou do governo a garantia de aprovação da nova emenda até janeiro. Numa versão do texto, que circulou no plenário, o PMDB, na prática, acaba com o teto fixado para os salários do funcionalismo.

— Até o dia 10 teremos o segundo turno. Quando o presidente voltar do Oriente Médio, após o dia 11, poderá promulgar a matéria — previu o relator da reforma, Tião Viana (PT-AC).

A História se repete

Em outra votação de reforma da Previdência, em 98, no governo Fernando Henrique, também foi um aliado quem ajudou a derrotar o governo. O deputado tucano Antonio Kandir apertou o botão errado, tirando do governo o voto que faltava para garantir a inclusão de novas idades mínimas para a aposentadoria de servidores públicos: 60 anos para homens e 55 anos para mulheres, exatamente como estabelece agora a reforma feita pelo PT. Esta não foi a única coincidência. Ao perceber o erro estampado no painel de votação, que indicava sua abstenção, Kandir correu para pedir retificação, mas foi contido por um adversário da reforma da Previdência: o então deputado petista Paulo Paim.

 

Acordo prevê a votação da PEC paralela logo

Gerson Camarottie Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. Para acalmar o PMDB e a garantir o apoio do partido para a conclusão da reforma da Previdência no Senado, o líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), fechou ontem um acordo para votar ainda este ano a proposta de emenda constitucional 77, a chamada PEC paralela. Esta PEC reúne pontos polêmicos da reforma que ficaram de fora da emenda principal aprovada ontem e que serão discutidos separadamente para evitar uma nova votação do texto na Câmara dos Deputados.

Mas o acordo no Senado patrocinado por Mercadante pode ser derrubado ao chegar na Câmara. Ontem mesmo o vice-líder do governo, deputado Professor Luizinho (PT-SP), desautorizou Mercadante e avisou que não haverá redução de prazos para agilizar a PEC paralela na Câmara.

A posição do deputado petista explicitou o racha dos representantes do governo no Congresso e a falta de sintonia na articulação política do Palácio do Planalto para esvaziar a pauta de votações até o fim do ano.

— Aqui não dá para reduzir os prazos. O Senado cuida da tramitação de lá. Eles não podem mudar as regras da Câmara. É preciso deixar claro que esse ano não dá para votar a PEC paralela na Câmara. Como a tramitação é demorada, nem a convocação extraordinária resolve o problema — disse Professor Luizinho.

O deputado petista alertou que não interessa ao governo o funcionamento do Congresso no mês de janeiro. Ele lembrou que a PEC da Previdência demorou quase seis meses para ser votada na Câmara, mesmo sendo uma prioridade do governo. Por isso, avalia Luizinho, a PEC paralela deve ter uma tramitação demorada, mesmo que haja um acordo.

Ontem, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) apresentou um requerimento ao Senado eliminando os prazos para votação da PEC paralela para que o texto seja votado até o dia 10 de dezembro. A nova proposta do PMDB foi apresentada depois que o líder do partido, senador Renan Calheiros (AL), sugeriu no dia anterior a convocação extraordinária do Congresso para apreciar a PEC paralela.

Irritação no Planalto com a proposta do líder do PMDB

No Palácio do Planalto foi grande a irritação com o gesto de Renan, cuja proposta pode fazer com que o Congresso funcione em janeiro. Isso é tudo o que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não quer, até porque aumentaria a pressão política em torno da reforma ministerial. Depois de receber notícias de que o Planalto não recebeu bem sua proposta, Renan desistiu dela.

— A convocação extraordinária é uma decisão que cabe ao governo e não ao Congresso. Prefiro um acordo para diminuir prazos e com isso votarmos a PEC paralela ainda este ano — avisou Renan.


Entenda a PEC paralela


Após a promulgação da emenda constitucional da reforma da Previdência, o Congresso ainda tratará de mudanças no sistema de aposentadoria dos servidores públicos. As alterações propostas por senadores estão reunidas na PEC (proposta de emenda constitucional ) 77, a PEC paralela. Governo e Congresso decidiram apresentá-la porque, se fosse mudado o texto original aprovado na Câmara, ele teria que retornar àquela Casa.

SUBTETO: Permitirá aos estados adotar um subteto único para os servidores públicos dos três poderes, tendo como limite os vencimentos pagos atualmente aos desembargadores, que equivalem a 90,25% dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 17.170.

DEFICIENTES: Há o compromisso de adoção de requisitos e critérios especiais para a aposentadoria de portadores de deficiência.

CONTROLE SOCIAL: Haverá garantia de participação paritária de representantes dos três Poderes e do Ministério Público na gestão dos regimes de previdência dos servidores públicos, ampliando assim sua fiscalização e controle.

CONTRIBUIÇÃO DE INATIVOS: Possibilitará que os estados, os municípios e o Distrito Federal fixem alíquotas da contribuição previdenciária dos servidores inativos estaduais e municipais abaixo dos 11% fixados para os servidores públicos federais.

ISENÇÃO: Possibilitará a ampliação da faixa de isenção para a cobrança da contribuição previdenciária de inativos e pensionistas portadores de doenças que os incapacitem para o trabalho, que terão de ser definidas por lei específica. Isso garantiria a isenção da contribuição previdenciária e redutor zero para as aposentadorias ou pensões até o dobro do limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral da Previdência Social, equivalente a R$ 4.800.

POLICIAIS: Delegará aos estados a possibilidade de estabelecer regime especial de aposentadoria para os policiais.

INCLUSÃO PREVIDENCIÁRIA: Deverá ser criado um sistema especial de inclusão previdenciária, com alíquotas e carências inferiores às vigentes para os demais segurados do Regime Geral da Previdência Social, para os trabalhadores sem vínculo empregatício e mesmo para as donas de casa.

PARIDADE: Estenderá para as futuras aposentadorias dos servidores que já ingressaram na carreira pública, reajustes iguais aos pagos aos funcionários da ativa. Pelo texto já aprovado, só os atuais aposentados têm a paridade assegurada.

REGRAS DE TRANSIÇÃO: Garantirá a redução de um ano da idade exigida para a requisição da aposentadoria, para cada ano a mais de contribuição previdenciária paga pelos servidores acima dos 35 exigidos para a aposentadoria. Assim, um servidor público que contribuir por 36 anos, teria direito de se aposentar com 59 anos de idade, um a menos do que o exigido pela reforma da Previdência.