Sexta-feira, 19 de dezembro de 2003

O Globo

Brecha no texto da reforma aumenta teto dos servidores

Rodrigo Rangel

BRASÍLIA. Uma brecha no texto da reforma da Previdência pode elevar para R$ 19.115 o teto do funcionalismo público no período de transição para as mudanças aprovadas pelo Congresso. O artigo 8 da proposta de emenda constitucional prevê que, na transição, o limite salarial do funcionalismo federal seja igual ao valor da maior remuneração atribuída a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

O detalhe, que passou despercebido pela Câmara e Senado, abre caminho para que seja somada ao teto uma gratificação de 20% a que tem direito o presidente do STF, o que significa mais R$ 1.771. O teto será determinado em um projeto de lei que será enviado ao Congresso pelo Supremo.

Previdência quer saber o maior salário do STF

Temeroso de que a brecha provoque um rombo inesperado nas contas, o secretário-executivo do Ministério da Previdência, Álvaro Sólon de França, enviou um ofício ao presidente do STF, Maurício Corrêa. Ele quer saber quanto é o maior salário recebido no Supremo.

A resposta que será enviada hoje à equipe do ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, muito provavelmente não agradará ao governo: Corrêa deverá responder que, para se calcular o rendimento máximo do Supremo, deve-se considerar uma gratificação de 20% recebida pelo presidente do STF.

O percentual extra, que incide sobre a representação mensal paga a todos os ministros, garante um acréscimo de R$ 1.771 ao salário do presidente do tribunal. Com isso, o maior salário pago a um ministro do STF não é R$ 17.343, e sim R$ 19.115, valor que deverá ser considerado pela Previdência Social para limitar os salários do funcionalismo na transição para o novo regime.

Ontem, Corrêa não quis antecipar a resposta que enviará ao ministério. Ele disse que prefere aguardar a promulgação da reforma para, só depois, revelar o valor que indicará o teto dos servidores federais durante o período de transição.

— Será apenas uma resposta administrativa — disse o presidente do Supremo Tribunal Federal.

Senadores ameaçam fazer ‘greve de votos’

BRASÍLIA. O Senado pode recorrer a uma “greve de votos” para forçar o governo a convocar o Congresso em janeiro. A resistência à idéia manifestada pelo chefe da Casa Civil, José Dirceu, e pelo presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), levou senadores a protestar ontem em plenário, anunciando que suas bancadas não votariam mais nenhum projeto até uma decisão. Senadores de vários partidos, com o apoio do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), argumentam que o trabalho extra em janeiro é necessário para que a Câmara aprove o projeto de emenda constitucional que altera a reforma da Previdência, a PEC paralela, já votada no Senado.

Relator da reforma e da PEC paralela, o senador Tião Viana (PT-AC) dizia estar decepcionado. Ele pensava em não comparecer ao jantar que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ofereceria ontem à bancada petista. O senador Paulo Paim (PT-RS), ameaçou fazer uma greve de fome pela convocação. No governo Collor, ele ficou três dias em jejum pedindo aumento para o salário-mínimo.

— Já fiz e faço de novo. Preciso mesmo emagrecer. Não posso é comemorar uma reforma que não aconteceu ainda.

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Governo faz concessões para aprovar a Cofins

Valderez Caetano e Isabel Braga

BRASÍLIA. O governo teve que ceder ontem em alguns pontos para conseguir aprovar na Câmara, por 254 votos a favor, 31 contra e três abstenções, a Medida Provisória 135, que acaba com a cumulatividade da Cofins e eleva de 3% para 7,6% a alíquota da contribuição. A MP será agora votada no Senado. A queda-de-braço com a oposição, porém, não foi suficiente para que todo o setor de serviços ficasse fora das mudanças, como exigiam alguns parlamentares e empresários. Com a flexibilização da MP, o ganho do governo com a nova Cofins deve cair de R$ 5,1 bilhões, previstos inicialmente, para R$ 4 bilhões.

— A base aliada está votando constrangida porque sabe que vai aumentar desde o preço do pãozinho até o da lanternagem dos carros — disse o líder do PFL na Câmara, deputado Luiz Carlos Aleluia.

Foi grande a pressão para que o governo cedesse e ampliasse a lista de setores que ficariam fora da nova regra. Ao lado de pedidos com forte apelo social, foram feitos outros muito específicos, como o pleito do PFL de deixar de fora compras feitas em free shops de aeroportos brasileiros. O martelo das negociações foi batido na noite de anteontem pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Ele foi chamado às pressas ao Congresso pelos líderes porque o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, havia confessado depender do aval do ministro para prosseguir com as negociações.

Para o líder do PMDB na Câmara, Eunício Oliveira, a nova fórmula da Cofins não alivia a carga para algumas empresas do setor terceirizado e poderá significar aumento de imposto.

— Não sei nem se não estaremos trocando meia dúzia por meia dúzia ou seis por sete — disse Eunício.

Pelo acordo fechado entre os partidos da base governista, que também estava muito dividida, vão continuar recolhendo 3% da Cofins o setor de transportes urbanos, hospitais e instituições de ensino. As operações de hedge (proteção) em bolsas de valores e em balcões também continuarão com a alíquota mínima. Já as mesmas operações feitas em bancos pagarão 7,6% da Cofins.

Prefeitos comemoram isenção para transportes

Para que não haja quebra de contratos, a MP permite que as administradoras de consórcio de bens móveis e imóveis e as empresas de prestação de serviços continuem pagando 3% de Cofins até o fim dos contratos, desde que tenham sido firmados até o dia 31 de outubro e que tenham duração acima de um ano. As micro e pequenas empresas que declaram pelo Simples, os serviços de telecomunicações e as empresas jornalísticas e de radiodifusão também foram poupados da nova alíquota.

Na última hora, o governo ainda baixou para zero a alíquota do PIS/Pasep e Cofins para a venda e comercialização do álcool etílico, hidratado e carburante.

Os prefeitos comemoravam a retirada dos transportes urbanos da lista dos que vão pagar alíquota de 7,6%. O coordenador da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), o prefeito de Aracaju, Marcelo Deda, atribuiu à Frente a vitória pela isenção dos transportes.

IR: comissão aprova alíquota de 27,5%

Lydia Medeiros

BRASÍLIA. A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou ontem o projeto de lei que prorroga até 2005 a alíquota máxima de 27,5% para o Imposto de Renda da Pessoa Física. Ou seja: fracassaram todas as tentativas da oposição de baixar a alíquota para 25% e de corrigir a tabela dos descontos permitidos por faixa de cobrança. A CAE manteve o texto que havia sido aprovado na Câmara, rejeitando as mudanças por 14 votos a favor e 11 contrários. O projeto deveria ser analisado ontem pelo plenário do Senado, mas a votação foi adiada para a sessão de hoje.

O relator do projeto, senador José Jorge (PFL-PE), apresentou substitutivo à proposta original prevendo a adoção da alíquota de 25% para as pessoas que ganham acima de R$ 2.600, a partir de 1 de janeiro de 2004. O senador também sugeriu a correção monetária anual da tabela de descontos a partir do próximo ano, mas seu parecer foi derrotado.

O senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) tentou aprovar um voto em separado, propondo a correção da tabela em 25% a partir de 2005, mas sem a obrigatoriedade do ajuste anual. A proposta foi rejeitada. O senador César Borges (PFL-BA) apresentou emenda que aumentava a faixa de isenção do imposto de R$ 1.058 para R$ 1.300, mas a CAE também rejeitou a proposta.

Tabela ficou sete anos sem reajuste, diz Mercadante

O líder do PFL, Agripino Maia (RN), protestou contra a nova lei:

— Estamos votando uma lei que representa uma queda no poder aquisitivo dos brasileiros.

De acordo com o líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), o governo Fernando Henrique Cardoso ficou sete anos sem reajustar a tabela e só aceitou fazer uma correção em 2002, quando o Orçamento registrou receitas extraordinárias de cerca de R$ 20 bilhões. Ele propôs a criação de uma comissão em 2004 para discutir mudanças no Imposto de Renda.

— Qualquer reajuste hoje causaria forte impacto nos cofres de estados e municípios prejudicando, principalmente, regiões mais pobres — argumentou Mercadante.