segunda-feira, 07 de julho de 2003
TRIBUNA
DA IMPRENSA
Governo aposta no fracasso da greve
do funcionalismo federal
BRASÍLIA - A
primeira greve geral de servidores públicos no governo Luiz Inácio
Lula da Silva começa amanhã, com o Palácio do Planalto
apostando no esvaziamento do movimento. Na avaliação governista,
apesar de ser por tempo indeterminado, a greve contra a reforma da Previdência
não terá fôlego para prosseguir por um longo período,
já que entidades de servidores públicos e a Central Única
dos Trabalhadores (CUT) estão participando das negociações
em torno da proposta.
Além disso, o governo já
vem negociando setorialmente com categorias reivindicações
antigas, tratando de questões salariais, planos de carreiras e
retomando acordos que o governo anterior não homologou. Na avaliação
do governo, essas mesas de discussão entre o Executivo e representantes
do funcionalismo, mesmo que não tratem diretamente da reforma da
Previdência, enfraquecem argumentos a favor da greve porque demonstram
a preocupação com os direitos dos servidores.
No Palácio do Planalto o entendimento
é que, com essa greve, os servidores podem estar desperdiçando
uma oportunidade de pressão que poderia ser usada em um momento
de impasse.
Nessa avaliação, o
movimento de paralisação dos servidores vai conseguir apenas
o que o governo já sinalizou que concorda, ou seja, com a negociação.
"Para alguns segmentos do funcionalismo é o tudo ou nada.
Quem tem essa opinião e quer forçar a greve vai dar com
os burros n'água", afirmou o vice-líder do governo
na Câmara, deputado Professor Luizinho (PT-SP).
O governo mantém a disposição
de não mexer nos pontos básicos da proposta de reforma previdenciária
enviada ao Congresso, não abrindo mão da taxação
dos inativos, da idade mínima de 55 anos (mulher) e 60 anos (homem)
para a aposentadoria e acabando com a integralidade fixando um teto para
o benefício.
O vice-líder evitou avaliar
o impacto da greve, que considera "precipitada", mas lembrou
que neste mês muitas universidades estão de recesso, o Poder
Judiciário está de recesso e, em muitos estados, os servidores
estão reagindo contra a reforma de maneira diferente. "O funcionalismo
está dividido quanto a greve. Há segmentos que querem dialogar
e têm consciência de que a radicalização não
ajuda", disse Luizinho. Ele completou que a greve não vai
alterar as negociações que estão em curso na Câmara
envolvendo sindicalistas do serviço público.
Na quarta-feira, representantes das
centrais sindicais serão ouvidos na comissão especial da
reforma e no dia 15 haverá nova reunião dos sindicalistas
com o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e os
líderes partidários. Na mesma linha de evitar confrontos
com o funcionalismo, tradicionalmente base eleitoral de Lula, o líder
do governo na Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), disse que o governo
respeita a greve.
"Evidentemente que o governo
não pode apoiar, estimular ou incentivar a greve. Mas o direito
à greve está assegurado na Constituição",
afirmou. Segundo ele, há uma pesquisa de opinião, cuja fonte
não revelou, mostrando que "a imensa maioria dos servidores
apóia a reforma da Previdência".
Ontem, o secretário-geral
da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público
Federal, Gilberto Jorge Gomes, afirmou que a expectativa é que
a greve atinja mais de 50% dos cerca de 600 mil servidores federais do
Executivo. "Vamos fazer a greve para parar o processo de tramitação
da reforma da Previdência, com o arquivamento da proposta, e negociar",
disse.
Ele afirmou que a greve atingirá
várias categorias, incluindo fiscais da Receita Federal e trabalhadores
que combatem endemias, como a dengue. Segundo ele, se os fiscais pararem
três dias já haverá um grande impacto para o governo
porque ficarão sem fiscalização os portos e o serviço
de alfândega dos aeroportos.
Servidores reclamam
que não foram ouvidos sobre reforma
BRASÍLIA - As entidades de
servidores públicos federais apostam na greve como forma de tentar
abrir um canal de negociação da reforma da Previdência
com o governo. Até agora, reclamam os líderes sindicais,
não houve espaço de "diálogo". "O
que está havendo no Congresso é enrolação,
não é negociação", disse o secretário-geral
da Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público
Federal (Condsef), Gilberto Cordeiro Gomes, referindo-se à mesa
de debates instalada na Câmara para a apresentação
de propostas dos sindicalistas.
"Lamentavelmente, este governo
tem vocação suicida", protestou o presidente do Sindicato
Nacional dos Docentes das lnstituições de Ensino Superior
(Andes), Luiz Carlos Lucas. "Lula disse que não será
um Lech Valesa (líder sindical Polonês que chegou à
Presidência da Polônia), porque tem partido e apoio dos movimentos
sociais, mas o governo não tem feito outra coisa senão dividir
o PT e os movimentos sociais", completou o sindicalista, lembrando
de um dos discursos do presidente.
O diretor da Federação
Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho e
Previdência (Fenasps), Jorge Moreira, afirmou que o governo está
descumprindo uma promesa de campanha, que era não quebrar contratos.
"Existe um contrato entre a União e os servidores. Essa reforma
quebra o contrato de forma unilateral", disse Moreira.
"O governo consultou governadores,
empresários, políticos, mas não consultou o funcionalismo,
principal alvo da reforma, e agora se recusa a negociar", completou
o sindicalista, citando os diversos pronunciamentos dos ministros José
Dirceu (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Previdência) nos quais eles
afirmam que não querem mudanças nos pontos centrais da proposta.
Racha
A reforma da Previdência do
governo dividiu os sindicalistas em dois grupos: os que querem negociar
emendas ao projeto - do qual faz parte da direção nacional
da Central Única dos Trabalhadores (CUT) - e os que querem a retirada
imediata da proposta do Congresso Nacional - representados pela maioria
dos sindicatos do funcionalismo, também ligados à CUT.
Apesar da divergência, os próprios
líderes que discordam da posição da direção
da CUT dizem não cogitar a criação de uma nova central
para abrigar os sindicatos dos servidores. "Há um clima de
insatisfação com a CUT, mas não existe nenhum indicador
de divisão, porque quem defende a criação de uma
central para os servidores não está dentro da CUT",
disse o presidente da Andes.
"Toda entidade filiada à
CUT vai se manter na CUT, pois ajudou a construir a central", afirmou
o secretário-geral da Condsef. "O tal racha da CUT é
bobagem. Na plenária de sábado, reafirmamos nosso compromisso
com a central. As entidades que falam em uma nova central são inespressivas",
argumentou o diretor da Fenasps.
Segundo Moreira, a paralisação
do funcionalismo poderá ajudar tanto os que defendem a retirada
do projeto do governo quanto os que querem apenas negociar as emendas.
"A greve auxilia todas as posições." Até
o presidente nacional do PSTU e membro da Executiva Nacional da CUT, José
Maria de Almeida, conhecido por seu radicalismo em relação
às posições da direção da central,
descarta qualquer divisão. "Não há nenhum espírito
de racha, o que há é discordância", disse José
Maria.
Emendas às reformas
alteram profundamente textos básicos
BRASÍLIA - Mais da metade
das 919 emendas apresentadas às reformas da Previdência e
tributária é de partidos aliados ao Palácio do Planalto
e mexe profundamente com os textos originais do governo. Das 466 emendas
à reforma tributária, 290 são de partidos da base
governista. A maioria das mudanças propostas permite a continuidade
da guerra fiscal entre os estados.
Na Previdência, do total de
453 emendas, 266 foram apresentadas pelos partidos aliados. E quase um
terço das mudanças prevê a manutenção
de aposentadorias e pensões com valor igual ao recebido pelos servidores
públicos na ativa. "É impossível imaginar que,
diante de tantas emendas, não vá haver mudanças nas
reformas. O governo nunca desejou impor um pacote. O governo está
aberto a negociar, mas desde que seja preservado o espírito e a
essência da proposta original", alertou ontem o líder
do governo na Câmara, deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP).
Apesar da grande quantidade de emendas,
ele descartou qualquer possibilidade das reformas não serem votadas
até o fim deste mês nas comissões especiais. "O
governo trabalha com a necessidade da votação das duas reformas
ocorrer no mês de julho", disse. Na avaliação
de Aldo Rebelo, a grande quantidade de emendas propostas pelos partidos
aliados acabarão protegendo a proposta original do Palácio
do Planalto.
"As emendas da base aliada propõem
alteração na proposta original do governo, mas preservam
a espinha dorsal das reformas", argumentou o líder. Ele se
reúne hoje com os líderes da base aliada para começar
a negociar as possíveis mudanças nas propostas de Previdência
e tributária. As alterações que tiverem sinal verde
do Palácio do Planalto serão incorporadas ao parecer do
relator da reforma, deputado José Pimentel (PT-CE).
A idéia é que apenas
os pontos que não tiverem consenso sejam levados a voto tanto na
comissão especial quanto no plenário da Câmara. Pelo
balanço feito pela liderança do governo na Câmara,
a maioria das propostas de alteração à reforma da
Previdência é sobre a manutenção da integralidade
das aposentadorias e pensões dos servidores públicos: foram
123 emendas.
Em seguida, está a cobrança
de contribuição previdenciária dos inativos do funcionalismo
público, com a apresentação de 67 emendas - existem
propostas para acabar com a taxação, como a do PC do B,
e outras que aumentam o piso de isenção para os servidores
da União para R$ 2,4 mil, como a do PT.
A criação de regras
de transição para os servidores públicos prestes
a requisitar aposentadoria recebeu 45 emendas. Em quarto lugar, com 34
emendas, estão as propostas para acabar com a redução
das pensões deixadas pelos servidores públicos a seus dependentes.
Em seguida, vêm 26 emendas sobre fundos de pensão e 24 que
propõem aumento do teto de R$ 2,4 mil para o regime geral e para
o serviço público.
Na reforma tributária, a maioria
das emendas propõe alteração nos artigos 150 e 155
da Constituição. As principais modificações
são sobre a isenção de contribuição
sociais para estados e municípios, o estabelecimento de regras
para dividir o produto da arrecadação da CPMF entre União,
estados e municípios e a possibilidade dos estados aumentarem as
alíquotas internas de ICMS, entre outros. Segundo o líder
Aldo Rebelo, também foram apresentadas muitas emendas sobre a criação
da DRE (Desvinculação de Recursos dos Estados).

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